Romance & Cigarettes ***
Realização: John Turturro. Elenco: James Gandolfini, Susan Sarandon, Kate Winslet, Steve Buscemi, Kumar Pallana, Christopher Walken, Mandy Moore, Aida Turturro, Mary-Louise Parker, Bobby Cannavale, Eddie Izzard, Elaine Stritch. Nacionalidade: EUA, 2005.
A terceira incursão de John Turturro pela realização, depois de “Mac” (1992) e “Illuminata” (1998), é uma mistura de comédia negra com musical da Broadway. Além disso, tem o dedo dos irmãos Coen na produção. Isto para dizer que é um filme quase inclassificável, fazendo lembrar, de longe, a mestria de “On Connaît la Chanson” (1997), de Alain Renais.
Ainda assim não deixa de ser refrescante ver James Gandolfini e Christopher Walken em números musicais. “Romance & Cigarettes” passa-se num subúrbio de classe média de Nova Iorque e conta a história de Nick Murder (Gandolfini), um trabalhador da construção civil e fumador inveterado. Kitty (Susan Sarandon), a sua mulher, faz vestidos de noiva, as três filhas adultas (Mandy Moore, Aida Turturro, Mary-Louise Parker) entretêm-se a tocar música punk no quintal, a ruiva mulher fatal Tula (Kate Winslet) é a amante que vem destabilizar a “harmonia” familiar, e o primo Bo (Walken) empenha-se para ajudar Kitty na sua vingança.
“Romance & Cigarettes” debruça-se sobre os altos e baixos da vida de casado, em que as personagens, à falta das próprias palavras, expressam os seus sentimentos mais profundos através de músicas, com a ajuda de James Brown, Ute Lemper, Nick Cave, Cindy Lauper, Bruce Springsteen, Janis Joplin, Tom Jones, e Dusty Springfield.
O argumento de Turturro está pejado de deliciosos diálogos, mas os números musicais, que deveriam ajudar à fluidez da narrativa, acabam por travar o seu ritmo. O desafio artístico foi superado por todo o elenco, apesar de nenhum deles ter grandes qualidade vocais. As excepções são Winslet, cujo esforço visível sai recompensado, e Mandy Moore, com vários discos editados. No entanto, tendo em conta o naipe de actores ao seu serviço, Turturro parece não ter tirado o devido partido de Steve Buscemi, Eddie Izzard e Mary Louise Parker, que bem mereciam, cada um deles, o seu respectivo número.
Voltando à história, para Kitty a fidelidade é uma tendência eminentemente masculina, como se viesse com o carregamento de testosterona, mas Bo faz questão de equilibrar as coisas com a sua dramática história, ao som de “Delilah”. Inclusivamente “a outra”, magistralmente interpretada por uma Kate Winslet ferozmente sexy, mistura uma tremenda obscenidade verbal (adocicada pelo cerrado sotaque do Yorkshire) com a candura da sua entrega à paixão.
Para Nick a infidelidade acaba por ser como um termómetro da sua relação com Kitty. Através dela, ele percebe que o que procura não é mais do que aquilo que ele já tem. A conquista é, para ele, um alimento para a auto-estima. A prova da sua capacidade de sedução, um vício alimentado pelo desconhecido. Porque o que se toma como certo acaba por nunca ser suficiente. Mas ter tudo não é ter todas, e Nick interrompe o previsível caminho de infidelidade com um surpreendente caminho para o perdão.
O amor é frágil. Quando se deixa cair, parte-se. Mas o amor é também forte. E regenera-se.
CITAÇÕES:
“When a woman bends over, a man sees a jelly doughnut.”
KATE WINSLET (Tula)
“When the characters can no longer express themselves in words they break into song lip-synching tunes that are lodged in their sub-conscious. It is their way to escape the reality of their world; to dream, to remember, to connect to another human being.”
JOHN TURTURRO