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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

The Wind That Shakes The Barley ***1/2

02.08.06, Rita

Realização: Ken Loach. Elenco: Cillian Murphy, Padraic Delaney, Liam Cunningham, Gerard Kearney, William Ruane, Damien Kearney, Orla Fitzgerald, Frank Bourke, John Crean, Máirtín de Cógáin, Myles Horgan, Roger Allam. Nacionalidade: Alemanha / Itália / Espanha / França / Irlanda / Reino Unido, 2006.





A mais recente colaboração entre o argumentista Paul Laverty e o realizador inglês Ken Loach (“Ae Fond Kiss...”), “The Wind That Shakes The Barley”, chega às salas de cinema com o peso de ter recebido da Palma de Ouro na edição deste ano do Festival de Cannes.


Irlanda 1920. Um amigável jogo de hurling insere-se na paisagem verdejante da Irlanda, mais concretamente no condado de Cork.


Em Dezembro de 1918 o Sinn Féin tinha ganho 73 de 105 assentos irlandeses. O mandado do Sinn Féin visava o estabelecimento e manutenção de uma República Irlandesa independente, que foi proclamada em Janeiro de 1919, dando início a uma violenta guerra, que escalou, em muitas partes do país a um esquema de guerrilha. Em 1920, a forças especiais britânicas (os ‘Black and Tans’, na sua maioria veteranos da Primeira Guerra Mundial) ocupavam o território irlandês proibindo qualquer tipo de assembleia, onde se incluíam igualmente os jogos de hurling.


Intimados pelos militares ingleses, o grupo de homens é obrigado a identificar-se. Quando Micheáil recusa dizer o seu nome em inglês, é espancado até à morte. Este incidente faz a politização da personagem principal, Damien (Cilliam Murphy), que decide abdicar do seu plano de exercer medicina em Londres para se juntar ao seu irmão Teddy (Padraic Delaney) lutar pela independência da Irlanda, juntando-se a uma unidade de guerrilha do Exército Republicano Irlandês (IRA).


A narrativa acompanha as acções desta unidade móvel nas suas investidas contra os militares ingleses até ao momento (Dezembro de 1921) em que o governo britânico apresenta um ultimatum aos negociadores irlandeses: assinarem o tratado que estabelece o Estado Livre Irlandês para 26 dos 32 condados ou então enfrentarem uma “guerra imediata e terrível”. Este tratado é visto por muitos, incluindo Damien, como uma traição, uma vez que exige que a Irlanda do Norte permaneça parte do Reino Unido e que a Irlanda faça um juramento perante a Coroa. Para a maioria dos republicanos, manter o monarca britânico como rei da Irlanda era intolerável. A cisão dentro do Sinn Féin (para a qual a Igreja Católica também contribuiu) entre os apoiantes do Estado Livre e os Republicanos é agravada por um novo ultimatum do governo britânico que exige ao Governo do Estado Livre o desarmamento dos Republicanos sob pena do Tratado ser considerado nulo. Dá-se assim início a uma guerra civil sem finais felizes.


O filme de Loach não é imparcial, e quem procura um relato histórico isento pode abster-se de o ver. “The Wind That Shakes The Barley” está, também emocionalmente, do lado do Dail Eireann que lutou contra a ocupação inglesa, e do lado dos Republicanos contra os defensores do Estado Livre. Mas mais do que escolher lados, este filme trata da luta contra o imperialismo, não só político, mas também económico, de governos opressivos.


Loach foge das figuras históricas, personalizando este conflito em homens e mulheres vulgares, pertencentes a uma pequena comunidade rural, mais concretamente nos irmãos Damien e Teddy, que, entre os ideais socialistas de um e o pragmatismo do outro, se verão em lados opostos do conflito civil. Loach transforma o político em pessoal, a tragédia nacional numa dor local. E é por aí que seduz os espectadores. E porque quer Cillian Murphy quer Padraic Delaney têm aqui duas grandes interpretações.


Loach peca, no entanto, pelo romantismo mítico de que os Republicanos lutavam por uma nação de trabalhadores e camponeses, em contraponto com o governo do Estado Livre, disposto a vender a alma aos homens de negócios para poder financiar as armas contra os ingleses. Esta abordagem é algo redutora e duvido (apesar do meu desconhecimento assumido neste campo político) de que os Republicanos fossem assim tão coerentes na sua missão e na sua política. Curiosamente, é no momento em que é marcada esta posição que o filme perde ritmo.


“The Wind That Shakes The Barley” é o título de uma canção tradicional irlandesa que marca um dos primeiros momentos dramáticos do filme. A tristeza que o marca não abandona nunca o filme. Porque todo o tenso debate político, a luta de classes, as duras decisões que são tomadas e executadas, são sem triunfo. O extremismo é destrutivo, mas o compromisso nem sempre equivale a paz. O amor tem muito pouco a dizer, ele aqui é elemento de divisão e questiona-se o seu poder para tudo conquistar. Olhando para a Irlanda de hoje, essa questão continua sem resposta.






CITAÇÕES:


“I hope this Ireland we’re fighting is worth it.”
CILLIAN MURPHY (Damien)

“I want more time with you, Damien.”
ORLA FITZGERALD (Sinead)

“I tried not to get into this war and did, not I try to get out and can’t.”
CILLIAN MURPHY (Damien)


THE WIND THAT SHAKES THE BARLEY
Robert Dwyer Joyce (1830-1883)


I sat within a valley green
Sat there with my true love
And my fond heart strove to choose between
The old love and the new love
The old for her, the new that made
Me think on Ireland dearly
While soft the wind blew down the glade
And shook the golden barley

Twas hard the mournful words to frame
To break the ties that bound us
Ah, but harder still to bear the shame
Of foreign chains around us
And so I said, "The mountain glen
I'll seek at morning early
And join the brave united men"
While soft wind shook the barley

Twas sad I kissed away her tears
Her arms around me clinging
When to my ears that fateful shot
Come out the wildwood ringing
The bullet pierced my true love's breast
In life's young spring so early
And there upon my breast she died
While soft wind shook the barley

I bore her to some mountain stream
And many's the summer blossom
I placed with branches soft and green
About her gore-stained bosom
I wept and kissed her clay-cold corpse
Then rushed o'er vale and valley
My vengeance on the foe to wreak
While soft wind shook the barley

Twas blood for blood without remorse
I took at Oulart Hollow
I placed my true love's clay-cold corpse
Where mine full soon may follow
Around her grave I wondered drear
Noon, night and morning early
With aching heart when e'er I hear
The wind that shakes the barley