Spanglish ***
Realização: James L. Brooks. Elenco: Adam Sandler, Téa Leoni, Paz Veja, Cloris Leachman, Shelbie Bruce, Sarah Steele, Ian Hyland. Nacionalidade: EUA, 2004.
“Spanglish” começa com uma carta de candidatura de Cristina (voz de Aimee Garcia) a Princeton, onde apresenta as razões pelas quais a deverão aceitar. E termina com a conclusão dessa grande viagem que é a busca de si própria. Num tom de comédia “Spanglish” trata de um assunto tão importante como é a identidade de um emigrante e da luta entre manter a sua cultura natal ou embrenhar-se o mais possível na cultura adoptiva.
Em flashback, passa-se para a história da sua chegada aos Estados Unidos. Depois de ter sido abandonada pelo seu marido no México, Flor (Vega) decide começar uma nova vida na Califórnia com a sua filha Cristina (Bruce). Vivendo no seio da comunidade hispânica, só passados 5 anos é que Flor sente o choque cultural, ao ir trabalhar para casa dos Clasky.
Apesar das dificuldades de comunicação, Flor não se consegue manter à margem dos problemas desta família disfuncional: John (Sandler), um reputado chef meio perdido e que foge ao sucesso; Deborah (Leoni), de uma bipolaridade assustadora e com quem John não consegue comunicar; Bernice (Steel), a filha adolescente cujo amor-próprio é constantemente ameaçado pelas preocupações maternas pelo seu excesso de peso; Georgie (Hyland), o filho mais novo; e Evelyn (Leachman), a avó alcoólica.
No meio de uma espiral de acontecimentos, Flor assiste à ameaça que começa a pairar sobre a identidade da sua própria filha, ao mesmo tempo que o seu coração é agitado pela imensa sensibilidade de John.
Parece muito? Pois, é mesmo. Este filme conjuga uma série de pequenos dramas pessoais, cada um deles quase digno de uma história individual. James L.Brooks peca aqui por alguma falta de focagem, que teria sido benéfica para uma maior consistência nas transições, por vezes abruptas, de que a narrativa é alvo.
Em compensação, as interpretações estão geniais. Desde Leoni, que num papel difícil e pouco simpático, consegue os extremismos mais hilariantes e doentios; a um Sandler, que continua a dar mostras da suas capacidades dramáticas (não esquecer a sua belíssima interpretação em “Punch Drunk Love” (2002), de Paul Thomas Anderson); passando por uma Leachman em grande forma e pelas jovens Bruce e Steel, realisticamente vulneráveis.
A melhor cena do filme é, inquestionavelmente, a discussão entre John e Flor, em que Cristina (Bruce) faz de tradutora, adoptando todas as expressões e gestos que reforçam os argumentos em defesa dos seus próprios interesses.
Mas a grande estrela deste filme é, sem dúvida, a lindíssima sevilhana Paz Vega, conhecida entre nós por filmes como “Fala Com Ela” (2001), de Pedro Almodóvar; “Lúcia e o Sexo” (2001), de Julio Medem; “O Outro Lado da Cama” (2002), de Emilio Martínez Lázaro; e “Carmen” (2003), de Vicente Aranda. Brooks optou, inteligentemente, pela ausência de legendas, com o intuito de reforçar as complicadas relações inter-culturais. Mas, para Vega, isso exigiu-lhe um esforço interpretativo na expressão da sua confusão, raiva e carinho. Um esforço que compensou e que lhe permitiu, assim, descolar-se (se é que é de todo possível) dos trabalhos sexualmente carregados que tem vindo a fazer.
Uma das deusas do panteão.
Infelizmente, a simpatia que Brooks nos faz criar pela maioria das personagens, contrasta gravemente com o julgamento, a bem de umas gargalhadas fáceis, de um personagem cheio de material dramático como é o de Deborah. “Spanglish” é um filme com um enorme potencial de beleza e riqueza, ao qual parece faltar a afinação necessária. Talvez Brooks se tenha perdido, algures, na tradução.
</p>CITAÇÕES:
“Lately, dear, your low self-esteem is just good common sense.”
CLORIS LEACHMAN (Evelyn)
“TÉA LEONI (Deborah) - Mother, are you buzzed?
CLORIS LEACHMAN (Evelyn) - No. I quit drinking weeks ago! No one noticed, but I guess that's a pretty good indicator that I conducted myself quite well when I was drunk.” </font>