Realização: Alejo Moguillansky. Elenco: Edgardo Castro, Julia Martínez Rubio, Alberto Suárez, Carla Crespo, Esteban Lamothe, Gerardo Naumann, Rita Carou. Nacionalidade: Argentina, 2009.
Tendo terminado nestes dias a leitura de “O Segredo de Joe Gould”, de Joseph Mitchell, eis que encontro nesta comédia de absurdo argentina mais uma personagem que se recusa a ser prisioneira de um trabalho, que lhe roubará o tempo para viver e amar, a sanidade e, em última instância, a sua identidade.
Como os diálogos, os corpos correm para não se perderem de si mesmos, para escaparem daquilo que o mundo parece ter decidido para cada deles, sem sequer os consultar.
Talvez aquele desespero e aquele cansaço fossem meus também, pois, à semelhança de Castro, também eu não quero ser definida por aquilo que faço das 9 às 5.
Realização: John Hindman. Elenco: Jeff Daniels, Lauren Graham, Lou Taylor Pucci, Olivia Thirlby, Kat Dennings, Nora Dunn, Tony Hale, Max Antisell. Nacionalidade: EUA, 2009.
Quando os outros são o nosso “inferno” e todas as fraquezas humanas são objecto de desprezo, que espaço existe para o amor?
Por vezes leva muito tempo (e dor) para descobrirmos que a verdade não reside numa resposta, mas numa pergunta.
Realização: Angela Schanelec. Elenco: Bruno Todeschini, Natacha Régnier, Maren Eggert, Mireille Perrier, Emile Berling, Josse De Pauw, Jirka Zett, Lina Falkner. Nacionalidade: Alemanha / França, 2009.
Como moscas, presenciamos conversas alheias, pessoas que se revelam em palavras banais num cenário quotidiano.
A fotografia de um momento onde sobrevém a noção de “lar” como um refúgio de afectos.
Entre "Love Will Tear Us Apart” dos Joy Division e “Remember Me” de Cat Power, percebemos a fragilidade de tudo o que é humano e a fugacidade de tudo o que é. No final, apenas um espaço vazio.
CAT POWER
Remember Me
remember me
don't ever forget me child
we all are only here
just for a little while
you remember that guy
that guy you were dating
he broke your heart
and then just walked away
yes, you did know
you remember when you were sick
you were cripple and you were lame
I stood by your bedside
'til you were on your feet again
yes, I did know you were tired
and you want to be free
I need someone
to stand just right by me
all day and all night
again and again and again
I can't stop now
with you my life
my life has been so wonderful
I need your love
I need you to walk
all day and all night remember me
don't ever forget me child
we are all only here
just for a little while
please, please… remember me
Realização: Pietro Marcello. Elenco: Vincenzo Motta, Mary Monaco. Nacionalidade: Itália, 2009.
A história de um homem é a história de uma cidade.
Génova viu os seus homens virarem costas ao mar e ofereceu-lhes, de consolo, as suas encostas.
Todas as vidas são histórias de amor – movidas pelas sua existência ou pela sua falta – num lugar sem espaço para o ridículo.
T.O.: Madeo. Realização: Joon-ho Bong. Elenco: Hye-ja Kim, Bin Won. Nacionalidade: Coreia do Sul, 2009.
Da força (também destruidora] do amor.
Uma viagem (estética e narrativamente irrepreensível) em busca daquele ponto de acupunctura onde, com uma agulha, todas as recordações de dor se podem apagar.
Realização: Margaret Corkery. Elenco: Robert Donnelly, Amy Kirwan, Darren Healy. Nacionalidade: Irlanda, 2009.
Do egoísmo, ou Èdipo educando os seus pais.
Ilustração de um álbum viciante [ou o custo dos excessos]:
Revelada ontem a programação da próxima edição do Festival de Cannes, a ter lugar de 12 a 23 de Maio.
O júri será liderado por Tim Burton, e as hostilidades serão iniciadas com a mais recente obra de Ridley Scott, “Robin Hood”.
O cartaz desta 63ªe edição ficou a cargo da fotógrafa francesa Brigitte Lacombe.
Realização: Oliver Parker. Elenco: Colin Firth, Ben Barnes, Rebecca Hall, Rachel Hurd-Wood, Emilia Fox, Caroline Goodall, Ben Chaplin. Nacionalidade: Reino Unido, 2009.
Nos contos góticos o terror era criado pela imaginação. Na obra de Oscar Wilde a sociedade era objecto de uma crítica subtil e inteligente. No argumento de Toby Finlay, que adapta livremente o clássico “The Picture of Dorian Gray”, todos estes elementos falham.
Em vez disso, temos situações amorosas que nos distraem do dilema central, explicações simplistas que reduzem a perda da inocência e o abraçar de uma vida de perfeito hedonismo a uma infância de abusos. Como se o mal, por si só (e em especial com um bom “vendedor” como Colin Firth) não fosse suficientemente sedutor.
A fotografia consegue conferir um ambiente soturno e decadente, mas, também visualmente, “Dorian Gray” é demasiado evidente, explicando tudo, mostrando ainda mais. Cada cena parece vir com um carimbo moral que atesta a incapacidade do espectador de interpretar a obra. De perceber que o bem e o mal existem e se defrontam interiormente, da deterioração de uma alma sem humanidade, da angústia que é carregar os nossos vícios no corpo aos olhos de todos.
Realização: Alain Resnais. Elenco: André Dussollier, Sabine Azéma, Emmanuelle Devos, Mathieu Amalric, Michel Vuillermoz, Edouard Baer (voz). Nacionalidade: França / Itália, 2009.
Como as ervas daninhas que vão crescendo nos espaços deixados por outras plantas, roubando esse espaço para si mesmas, também o amor tem dessas coisas: impulsos sem razão ou ordem.
Alain Resnais (responsável pelo díptico “Smoking/No Smoking”, um dos meus filmes preferidos) regressa com a história de um amor que começa sem se saber como ou porquê e que termina mais ou menos assim também.
Há algo de refrescante (ou desculpabilizador) em ver adultos inteligentes comportando-se como crianças tontas. O risco desmedido, as expectativas irreais, a raiva descontrolada, o comportamento amoroso parece não poder ser intenso e saudável simultaneamente.
A câmara de Eric Gautier serve a narrativa de Alex Reval e Laurent Herbiet (argumento adaptado do livro "L'Incident” de Christian Gailly) em planos poéticos, sobrepondo a imagem (como a voz) de quem ensaia a realidade na própria cabeça antes de a experimentar.
Mas é fácil acreditar no inexplicável, no disparatado, no surreal dos sentimentos, mais que no dos factos (como o passado da personagem de André Dussolier que nunca se desvenda ou a insatisfatória finalização do triângulo amoroso). Como um amante largado sem qualquer explicação, assim nos deixa Resnais: à deriva.
Recordarei a arte.
Realização: Sam Mendes. Elenco: John Krasinski, Maya Rudolph, Carmen Ejogo, Catherine O'Hara, Jeff Daniels, Allison Janney, Maggie Gyllenhaal, Josh Hamilton. Nacionalidade: Reino Unido / EUA, 2009.
Um casal prestes a ter um filho, vai em busca do apoio familiar, ou pelo menos dos exemplos, que lhes possam assegurar alguma certeza nos seus próximos passos.
Sam Mendes filma o argumento do casal Dave Eggers e Vendela Vida com uma doçura que se lhe desconhecia, embrulhando-o na música delicada, mas por vezes intrusiva, de Alexi Murdoch.
Há viagens que não se podem fazer de carro, de comboio ou de avião. E “Away We Go” mostra-nos como é possível fazer as coisas funcionarem segundo as próprias regras, como é possível encontrar [em conjunto] harmonia e paz no desconhecido.
Realização: Terry Gilliam. Elenco: Heath Ledger, Christopher Plummer, Tom Waits, Johnny Depp, Jude Law, Colin Farrell, Lily Cole, Andrew Garfield, Verne Troyer, Peter Stormare. Nacionalidade: Reino Unido / Canadá / França, 2009.
A imaginação fértil e prodigiosa de Terry Gilliam num tributo a todas as imaginações.
O humor nonsense (patente também numa subtil, mas inequívoca, homenagem aos Monty Python), o olhar surrealista, o sentido de aventura e a sensação de refrescante descoberta são servidos por um elenco perfeito (o diabo de Tom Waits é, talvez, insuperável).
Um conto agri-doce, bizarro e belíssimo sobre o poder dos sonhos.