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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Crash ****

30.06.05, Rita

ALIGN=JUSTIFY> Realização: Paul Haggis. Elenco: Sandra Bullock, Don Cheadle, Matt Dillon, Jennifer Esposito, William Fichtner, Brendan Fraser, Terrence Howard, Chris 'Ludacris' Bridges, Thandie Newton, Ryan Phillippe, Larenz Tate, Tony Danza, Keith David, Shaun Toub, Loretta Devine, Michael Pena, Bahar Soomekh. Nacionalidade: EUA / Alemanha, 2004.


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ALIGN=JUSTIFY>É natural a comparação de “Colisão” com “Magnolia” (1999), de Paul Thomas Anderson, com as suas trágicas narrativas paralelas e entrelaçadas. Mas ainda que fique atrás deste em termos artísticos, partilha também de um sólido elenco e um tema necessariamente actual – o racismo.

ALIGN=JUSTIFY>O detective Graham (Cheadle) chega ao cenário de um acidente com a sua colega Ria (Esposito). Mais tarde percebemos que eles também são amantes e, depois de se livrar de um telefonema da mãe com o comentário de mau gosto “Estou a fazer sexo com uma branca”, Graham consegue ainda ofender Ria quanto à sua etnia hispânica.

ALIGN=JUSTIFY>O polícia Ryan (Dillon), cujo pai se encontra doente e é impedido de marcar uma consulta, despeja as suas frustrações mandando parar e humilhando um casal negro: Cameron (Howard), um realizador de televisão que tem de lidar com o racismo no seu local de trabalho e a sua mulher Christine (Newton), a quem Ryan revista de uma forma sexualmente invasiva, sob o olhar reprovador do seu colega Hanson (Phillippe).

ALIGN=JUSTIFY>Anthony (Ludacris) e Peter (Tate), dois amigos negros, discutem sobre o estereótipo dos negros como criminosos e a reacção defensiva do casal com que se cruzam: Jean (Bullock) agarra-se automaticamente ao braço do marido Rick (Fraser), procurador público. No minuto seguinte Anthony e Peter assaltam o casal, roubando-lhes o carro, e dando-lhes razão. Jean insiste em mudar todas as fechaduras de casa. Ao reparar que o trabalhador que o faz, Daniel (Pena), é de origem latina exige uma nova substituição.

ALIGN=JUSTIFY>Daniel é também contratado por Farhad (Toub), iraniano, para consertar a fechadura da porta da sua loja. Daniel avisa-o que o problema é com a porta, mas Farhad ignora-o. Quando a sua loja é roubada, Farhad sabe quem deve culpar.

ALIGN=JUSTIFY>As interpretações são todas elas bastante fortes, nomeadamente a de Cheadle e a de Dillon. Mas a linha de história mais poderosa é a partilhada por Pena e Toub. O silêncio na sala no momento de clímax é sintomático das reacções emocionais, e por isso físicas, que nos provoca.

ALIGN=JUSTIFY>Os diálogos, duros e crus, escritos por Haggis e Bobby Moresco dão o ritmo certo a este filme. E a credibilidade, que falta por vezes nas coincidências retratadas, é recuperada nas palavras trocadas.

ALIGN=JUSTIFY>Haggis é imparcial quanto ao bem e ao mal dentro da cada pessoa e à ambiguidade moral das personagens. Os preconceitos raciais existentes funcionam em todos os sentidos e estão quase todos presentes (fica-se, no entanto, sem perceber exactamente qual o papel dos asiáticos aqui no meio).

ALIGN=JUSTIFY>Apesar dos acidentes de automóvel que aparecem no filme, a ‘colisão’ do título dá-se entre as pessoas, entre estereótipos, entre os “dois lados da mesma história”. “Colisão” não resolve as questões que ele próprio levanta, mas também não nos dá sermões. Deixa a cada um a tarefa de olhar para dentro, para as suas próprias intolerâncias e pré-conceitos.


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ALIGN=JUSTIFY>TAGLINE:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “Moving at the speed of life, we are bound to colide with each other.”


ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “It's the sense of touch any real city you walk you brush past people, people bump into you, you know, in L.A. nobody touches you. We're always behind this metal and glass. It's the sense of touch. I think we miss that touch so much, that we crash into each other just so we can feel something.”
DON CHEADLE (Graham)


ALIGN=JUSTIFY> “Anthony – Look around! You couldn't find a whiter, safer or better lit part of this city. But this white woman sees two black guys, who look like UCLA students, strolling down the sidewalk and her reaction is blind fear. I mean, look at us! Are we dressed like gangbangers? Do we look threatening? No. Fact, if anybody should be scared, it's us: the only two black faces surrounded by a sea of over-caffeinated white people, patrolled by the triggerhappy LAPD. So, why aren't we scared?
Peter – Because we have guns?
Anthony – You could be right.”
CHRIS ‘LUDACRIS’ BRIDGES (Anthony) e LARENZ TATE (Peter)











Batman Begins ****

29.06.05, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Christopher Nolan. Elenco: Christian Bale, Michael Caine, Liam Neeson, Katie Holmes, Gary Oldman, Cillian Murphy, Tom Wilkinson, Rutger Hauer, Ken Watanabe, Linus Roache, Morgan Freeman. Nacionalidade: EUA, 2005.


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ALIGN=JUSTIFY>O único super-herói em “Batman Begins” (e porque sabemos que Batman não dispõe de nenhuns poderes sobre-humanos) é Christopher Nolan, o realizador (“Memento” – 2000 e “Insomnia” – 2002). O mito de Batman renasce, e não porque tenha falecido durante os anteriores filmes (“Batman” (1989) e “Batman Returns” (1992), de Tim Burton e a progressiva queda com “Batman Forever” (1995) e “Batman & Robin” (1997), de Joel Schumacher), mas porque nunca, nenhum deles, fez jus à essência da personagem criada por Bob Kane.

ALIGN=JUSTIFY> Baseado com alguma liberdade no livro “Batman: Year One”, de Frank Miller (este é o seu ano, ver ”Sin City”), “Batman Begins” conta a história do herdeiro industrial Bruce Wayne (Christian Bale), que, na sua infância, assiste à morte dos seus pais durante um assalto. Nesse momento jura uma luta contra o crime que o levará, mais tarde, a assumir a identidade de Batman, um vingador mascarado de morcego. Mas essa luta vai-lhe exigir conhecer o desespero e a violência que estão associados ao crime, e é o seu mentor Henri Ducard (Neeson) que o guiará nesse caminho. A dado momento, Wayne terá de decidir entre seguir a Liga das Sombras, liderada por Ra's Al Ghul (Watanabe) ou defender a cidade de Gotham. Ele escolhe a segunda.

ALIGN=JUSTIFY>A história pessoal de Wayne é, pela primeira vez, tratada com a importância e a relevância que merece. A sua evolução depende desse ponto de partida, uma vez que é a resposta emocional aos seus traumas de infância. A consistência com que é tratada esta parte, no entanto, não prejudica de nenhuma forma a acção. E Bale transforma-se, sem falhas, da pessoa que tem medo para a pessoa que o causa, num misto de frustração e a esperança pela condenada, mas ainda salvável, Gotham.

ALIGN=JUSTIFY>É louvável a preocupação do argumento de Nolan e David S. Goyer em tornar plausível a forma como Wayne adquiriu o seu fato e o seu carro, por exemplo, e o mesmo acontece com a movimentação física e acrobática de Batman. O próprio background social e político da cidade de Gotham faz com que Batman se torne necessário e não acessório.

ALIGN=JUSTIFY>Christian Bale faz-nos esquecer por completo Michael Keaton, Val Kilmer e George Clooney (quem?). A sua dupla face entre a leveza do playboy e a gravidade de Batman nunca foi tão perturbada, tão emocionalmente negra e cheia de raiva, e, ao mesmo tempo, tão sensível e tão profundamente solitária.

ALIGN=JUSTIFY> Mas Bale tem o apoio de um elenco de excepção. Além de Neeson, Gary Oldman tem um trabalho admirável como Jim Gordon, o único polícia aliado de Batman. Morgan Freeman é Lucius Fox, trabalhador da Wayne Industries relegado para uma posição inferior pela actual administração e que facilita a Wayne o acesso ao arsenal de maquinaria. Tom Wilkinson está sadicamente mafioso como Carmine Falcone, ainda que o seu look tenha muito pouco de italiano. Michael Caine, como o mordomo Alfred, está irrepreensível, como arma de motivação (e de humor) para Wayne. Liam Neeson tem aqui uma poderosa interpretação. E, finalmente, a poderosa interpretação de Cillian Murphy (“28 Days Later” - 2002) como o arrepiante psiquiatra Dr.Jonathan Crane, caminhando entre a sanidade e a obsessão.

ALIGN=JUSTIFY>Katie Holmes como a amiga de infância e delegada do procurador Rachel Dawes, que nem começa mal, acaba por descambar no doce enjoativo de “Dawson’s Creek”, ficando milhas atrás de qualquer das ‘Batman Girls’ anteriores (Kim Basinger, Michelle Pfeiffer, Nicole Kidman e Uma Thurman).

ALIGN=JUSTIFY>O cheirinho a “The Birds” (1963), de Hitchcock, é a pedra de toque nas cenas com morcegos, sonora e visualmente assustadoras. Em suma: entretenimento e arte juntam-se aqui para nosso bel-pazer. Divirtam-se, enquanto se espera pela sequela.


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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “Why do we fall, sir? So that we might better learn to pick ourselves up.”
MICHAEL CAINE (Alfred Pennyworth)


ALIGN=JUSTIFY> “No gun? I'm insulted! You could have just sent a thank-you note.”
TOM WILKINSON (Carmine Falcone)

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “We have nothing to fear... but fear itself!”
CILLIAN MURPHY (Dr. Jonathan Crane)


ALIGN=JUSTIFY> “It’s not who I am underneath but what I do that defines me.”
CHRISTIAN BALE (Bruce Wayne/Batman)











The Ballad of Jack and Rose ***

23.06.05, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Rebecca Miller. Elenco: Daniel Day-Lewis, Camilla Belle, Catherine Keener, Paul Dano, Ryan McDonald, Jena Malone, Beau Bridges, Jason Lee, Susanna Thompson. Nacionalidade: EUA, 2005.


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ALIGN=JUSTIFY>1986. Jack (Day-Lewis) é engenheiro e vive com a filha de 16 anos, Rose (Belle), numa ilha deserta ao largo da costa Leste dos Estados Unidos. Eles são os que restam de uma antiga comuna hippie que defendia um maior respeito pelo meio envolvente, pela natureza e pelas pessoas, em detrimento dos bens materiais. Mas Jack está a morrer e sabe que Rose não tem mais ninguém no mundo. Decide por isso convidar Kathleen (Keener) uma sua namorada do continente e os seus dois filhos, Thaddius (Dano) e Rodney (McDonald), para irem viver com eles. Rose, para quem a vida sempre foi aquele paraíso privado partilhado com o seu pai, não aceita bem esta invasão e rebela-se ferozmente.

ALIGN=JUSTIFY>O idílio é ameaçado também pela construção de um condomínio pré-fabricado em terrenos pantanosos da ilha. Símbolo do progresso, da mudança indefectível. O conflito entre Jack e o empreiteiro Marty Rance (Bridges) – ou entre o idealismo dos 60s e a ganância dos 80s –, acabará, no entanto, por mostrar a Jack a sua própria face, dando-se conta da prisão que ele construiu para Rose. Afinal, também o paraíso é artificial.

ALIGN=JUSTIFY>Jack é idealista, intransigente e possessivo. Rose é inocência (simbolizada na casa na árvore), curiosidade e descoberta sexual (simbolizada na cobra). O seu isolamento social retardou o seu amadurecimento. Jack virou as costas ao mundo e, ao fazê-lo, privou Rose desse mesmo mundo, sem lhe dar liberdade de escolha. Agora é o medo que a impede de considerar sequer continuar viva após a morte do pai.

ALIGN=JUSTIFY>A relação de Jack e Rose é entre o paternal/filial e o erótico. O convite para Kathleen ir viver com eles parece não ser mais do que a forma que Jack encontra de combater a involuntária atracção que sente por Rose, e pela qual se recrimina. Mas também Rose procura essa forma de afecto, e a sua raiva para com os recém-chegados está relacionada com a posse/ciúme que sente pelo pai.

ALIGN=JUSTIFY>Daniel Day-Lewis é casado com a realizadora/argumentista Rebecca Miller (filha do falecido dramaturgo Arthur Miller), mas não estava inicialmente escalonado para o papel. “The Ballad of Jack and Rose” não seria o mesmo sem ele, pouco surpreendentemente, perfeito. Ele é Jack – nos seus valores, nos seus demónios, e na sua morte iminente. Camilla Belle como Rose não lhe fica atrás, com uma candura revoltada e prestes a ser maculada. De referir também McDonald, convincente como o receoso e ambivalente Rodney.

ALIGN=JUSTIFY>Mas eles não são suficientes para nos envolver emocionalmente nesta história, que fica a parecer demasiado distante. As ideias e personagens que o compõem despertam a nossa atenção, mas fica a faltar algo mais profundo para onde olhar. Os conflitos de personalidade aparecem de uma forma, apesar de tudo, estranhamente educada e pouco plausível. Apesar disso, este é um filme interessante, abrilhantado pela bela fotografia de Ellen Kuras, que também trabalhou com Miller em “Personal Velocity”.

ALIGN=JUSTIFY>Como diz a tagline, para nos definirmos precisamos de nos afastar, e é na libertação que se prova o amor. Por isso, os Creedence Clearwater Revival cantam “I put a spell on you, because you're mine”.


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ALIGN=JUSTIFY>TAGLINE:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA>“Selfhood begins with a walking away. And love is prooved in the letting go.”


ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA>“Rose (CAMILLA BELLE): Have you ever considered suicide?
Rodney (RYAN McDONALD): Yes, but I’d rather do it himself…”


ALIGN=JUSTIFY>“Innocent people are just as dangerous.”
RYAN McDONALD (Rodney)









Carandiru - O Filme do Solstício

22.06.05, Rita




A noite mais curta do ano passei-a no presídio de Carandiru, em São Paulo, na companhia de Zico (Wagner Moura) e Deusdete (Caio Blat), amigos de infância que se reencontram na prisão; Antonio Carlos (Floriano Peixoto) e Claudiomiro (Ricardo Blat), parceiros no crime separados por uma mulher; Peixeira (Milhem Cortaz), assassino convertido a evangélico; Ezequiel (Lázaro Ramos), ex-surfista viciado em crack; o malandro Majestade (Ailton Graça), que divide o seu tempo entre mulheres e assaltos; seu Pires (Antonio Grassi), director da prisão; o sábio seu Chico (Milton Gonçalves); Nego Preto (Ivan de Almeida), líder dos presos; o violador Gilson (Enrique Diaz); Sem Chance (Gero Camilo), ajudante do médico; e Lady Di (Rodrigo Santoro), a sua “companheira”.


Em 1989, um médico (Luiz Carlos Vasconcelos) vai realizar um trabalho de prevenção de SIDA à maior casa de detenção da América Latina, com lotação para 4.000 reclusos e com cerca de 7.500 na altura dos acontecimentos relatados. A sua medicina, reduzida a pouco mais que um estetoscópio, vai alargar-se à partilha das histórias dos prisioneiros, encarcerados pelas mais diversas razões. E é através desta aproximação ao seu quotidiano e à sua tragédia pessoal que estes diversos demónios vão perdendo os seus cornos e rabos.


As instalações são precárias e as condições sanitárias gravíssimas, o ambiente é de uma iminência explosiva no meio de alianças feitas para assegurarem a sobrevivência. Foi uma noite cheia de droga, doenças, tensão e mortes, fora e dentro da prisão. O amor, muito pouco, andava por lá também. A esperança, nem por isso.


Durante o seu cancro, Hector Babenco, o realizador, sugeriu ao seu médico, Drauzio Varella, registar as fantásticas histórias que ele lhe trazia da cadeia. Drauzio Varella escreveu o livro “Estação Carandiru” e, daí ao filme “Carandiru” (2003), foi um passo.


Filmado em parte nas próprias instalações da prisão, já após a transferência dos últimos presos para outras unidades, e antes da sua implosão em 2002, “Carandiru” relata, na primeira pessoa, os acontecimentos do período que antecedeu o terrível massacre ocorrido nessa instituição, a 02 de Outubro de 1992, onde uma altercação entre presos motivou a intervenção da polícia de choque, que provocou 111 mortos entre os detidos.


Desta noite, fica a percepção de que o ser humano perdeu de tal maneira o respeito pelo seu semelhante, que a única forma de o controlar é através de regras rígidas, códigos de honra e poderes definidos. E que a sociedade, na prisão a uma escala mais reduzida, perdeu de tal forma a esperança no seu próprio futuro, que a única forma que encontra de tratar as suas “doenças” é através da eliminação dos seus sintomas. As causas, essas, continuam lá. Aqui.






“Aquele que abre a porta de uma escola fecha a porta de uma prisão.”
VICTOR HUGO



Saw ***

20.06.05, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: James Wan. Elenco: Leigh Whannell, Cary Elwes, Danny Glover, Ken Leung, Dina Meyer, Mike Butters, Paul Gutrecht, Michael Emerson, Benito Martinez, Shawnee Smith, Makenzie Vega, Monica Potter, Ned Bellamy. Nacionalidade: EUA, 2004.


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ALIGN=JUSTIFY>O início de “Saw” fez-me lembrar o “Cube” (1997) de Vincenzo Natali, mal comparado, claro. O espectador começa exactamente no mesmo sítio que os personagens e com mais ou menos a mesma informação: nenhuma. Num crescendo, vai-se acumulando a tensão, o sangue e o histerismo.

ALIGN=JUSTIFY>Adam (Leigh Whannell, também argumentista), um fotógrafo, e o Dr. Lawrence Gordon (Cary Elwes), cirurgião, acordam numa casa de banho, que há pelo menos trinta anos não vê uma esfregona ou uma gota de detergente. Estão acorrentados pelos tornozelos em lados opostos e, entre eles, jaz um corpo no meio de um lago de sangue, segurando uma pistola numa mão e um gravador na outra.

ALIGN=JUSTIFY>Duas gravações colocam-nos a par das regras do jogo. Lawrence tem 8 horas para matar Adam, ou a sua mulher (Monica Potter) e a sua filha (Makenzie Vega, a pequena Nancy em “Sin City”) têm os minutos contados. Sem mobilidade suficiente ou memória de como chegaram até ali, tentam descobrir a razão de um terror psicológico, à base de pistas e ferramentas estudadas, que começa a mexer com a sua sanidade mental. Ao pé de cada um deles existe uma serra, incapaz de cortar as correntes, mas facilmente utilizável em qualquer tornozelo.

ALIGN=JUSTIFY>Adam e Lawrence são as novas marionetas de um assassino em série que dá pelo nome de “The Jigsaw Killer”, um inteligente psicopata (será redundante?) que apenas quer que as suas vítimas valorizem o facto de estarem vivas, colocando-as, para isso, no meio de enigmas verdadeiramente mortais. Danny Glover é o polícia que o persegue na tentativa de vingar a morte do seu parceiro.

ALIGN=JUSTIFY>Como um puzzle, James Wan vai mostrando as peças, quase tão aleatoriamente como se as retirássemos de uma mesa, revelando os segredos pessoais de ambos os protagonistas e levando-nos a outras vítimas e às suas sórdidas provações.

ALIGN=JUSTIFY>Visualmente explicativo, “Saw” não deixa muito à imaginação, no que se refere às cenas mais macabras. Isso, aliado a um bom ritmo, e negligenciado o facto das interpretações não serem acima da média, faz com que se passe uma boa tarde de Domingo. Bem, digamos antes noite, que agora está tempo de praia.


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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA>“When there’s that much poison in your blood, the only thing left to do is die.”


ALIGN=JUSTIFY>“Sometimes you see more with your eyes closed.”

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “Congratulations. You are still alive. Most people are so ungrateful to be alive. But not you. Not anymore.”
MICHAEL EMERSON (Zap Hindle)


ALIGN=JUSTIFY>“He doesn't want us to cut through our chains! He wants us to cut through our feet!”
CARY ELWES (Dr. Lawrence Gordon)









Sin City *****

17.06.05, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Robert Rodriguez e Frank Miller (realizador convidado: Quentin Tarantino). Elenco: Bruce Willis, Mickey Rourke, Clive Owen, Jessica Alba, Nick Stahl, Powers Boothe, Rutger Hauer, Elijah Wood, Rosario Dawson, Benicio Del Toro, Jaime King, Devon Aoki, Brittany Murphy, Michael Clarke Duncan, Carla Gugino, Alexis Bledel, Josh Hartnett, Marley Shelton, Michael Madsen, Frank Miller, Makenzie Veja, Rick Gomez, Nick Offerman. Nacionalidade: EUA, 2004.


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ALIGN=JUSTIFY> “Cover your eyes, Nancy! I don't want you to see this.” Feito no início do filme “Sin City”, este aviso adverte também os espectadores mais sensíveis, e com risco de náuseas, para o que estão prestes a ver.

ALIGN=JUSTIFY>Este filme é brutal, violento, macabro, sádico, chocante, machista, cheio de clichés melodramáticos, de discursivos pensamentos em voice over, de vilões que merecem morrer (várias vezes), de heróis destemidos e de mulheres más que exalam sexo por todos os poros... Em suma: FABULOSO!

ALIGN=JUSTIFY>Mas, para quem conheça a obra de Frank Miller, autor da banda desenhada original e também co-realizador, isso não surpreende. Antes de ver “Sin City” (uma semana antes, mais concretamente) li dois dos livros da colecção: “The Hard Goodbye” e “A Dame To Kill For”. Este primeiro filme (que já promete ser uma trilogia de devoção para 2006 e 2008) baseia-se em três dos livros de Miller: “The Hard Goodbye”, “That Yellow Bastard” (que li ontem numa Fnac, apenas disponível em versão original) e “The Big Fat Kill”, aproveitando uma pequena fala de “A Dame To Kill For”. Cada um deles centra-se numa personagem: Marv (Mickey Rourke); John Hartigan (Bruce Willis) e Dwight McCarthy (Clive Owen), respectivamente.

ALIGN=JUSTIFY>As três histórias são contadas separadamente, com diversos apontamentos a interligá-las. Poderá haver alguma confusão cronológica, especialmente para quem nunca tenha entrado em contacto com a obra de Miller. Mas um pouco de atenção revela a solidez e consistência deste universo noir que é Basin City (numa da imagens do filme, Rodriguez aproveita para borrar as duas primeiras letras no letreiro à entrada da cidade).

ALIGN=JUSTIFY>O preto e branco foi mantido, com as ocasionais pinceladas de cor (vermelho, amarelo e os olhos azuis da mais nova das “Gilmore Girls” – Alexis Bledel como Becky). Tendo sido totalmente filmado em fundo verde, “Sin City” mantém-se impressionantemente fiel à BD, ao seu grafismo e ao seu ambiente. Talvez um pouco mais discreto na nudez.

ALIGN=JUSTIFY>O manancial de violência neste filme enche as minhas medidas, ainda que os jorros de sangue sejam brancos. E não posso deixar de referir a delícia que são os movimentos precisos da “deadly little Miho” (interpretada por Devon Aoki), com as mesmas espadas herdadas de “Kill Bill: Vol.1”. Aliás, Tarantino foi convidado para realizar um segmento do filme – a cena entre Dwight (Clive Owen) e Johhny Boy (Benicio del Toro) antes do primeiro ser mandado parar pela polícia – pelo que recebeu 1 dólar de pagamento, o mesmo que Rodriguez tinha recebido por compor um trecho musical para “Kill Bill: Vol.2”.

ALIGN=JUSTIFY>As representações são poderosas, sem excepção. Rourke é Marv, um homem quase monstro que, sem olhar a meios e pondo a sua liberdade condicional em perigo, vai procurar vingar a morte da única mulher que lhe deu afecto, Goldie (Jaime King). Owen é Dwight, que, tendo matado acidentalmente um polícia, se esconde junto das suas amigas prostitutas em Old Town, a quem protege. A sua relação de “sempre... nunca” com a dominadora chefe do grupo Gail (Rosario Dawson) traz-nos os momentos mais, digamos, carnais. Willis é Hartigan, um bom polícia (e por isso raro em Basin City, onde a corrupção é a moeda de troca) no seu último dia de trabalho antes da reforma, com a última missão de salvar uma rapariga de 11 anos das garras de um pervertido, que acontece ser filho do poderoso Senador Roark.

ALIGN=JUSTIFY>As interpretações são soberbas, sobretudo Rourke (imagine-se!!! talvez “Sin City” faça por ele o que “Pulp Fiction” fez por Travolta) e até os vilões foram genialmente escolhidos: Benicio del Toro, Rutger Hauer, Nick Stahl, Powers Boothe e Elijah Wood - quem diria que um Hobbit que tem medo de um anel seria tão assustador como o silencioso e mortal Kevin? Arrepiante!

ALIGN=JUSTIFY>Pela selecção de actrizes, lindas e para todos os gostos, pensei que o filme mostrasse mais delas. Mas não, esta é uma história machista (e isto não é uma crítica), e nessa medida é quase como se fosse um conto de fadas. As mulheres são meros pretextos para ódios, amores, vinganças, salvamentos e basicamente não passam de pedaços de carne, dos bem apetecíveis e suculentos. Curiosamente a única mulher que não é prostituta, stripper ou empregada de mesa, a primeira vez que aparece fá-lo em topless – abençoada Carla Gugino!

ALIGN=JUSTIFY>Os diálogos (passando pelas as eloquentes discussões entre Mr.Klump e Mr.Schlubb), a direcção artística, a caracterização, a intensa acção, são todos eles irrepreensíveis. De juntar a música composta maioritariamente pelo mesmo Robert Rodriguez (obrigada por não teres colocado o Banderas neste filme!).

ALIGN=JUSTIFY>“Sin City” é feito de personagens cínicos, com rasgos de esperança e sentimento. Uma apelativa viagem estética pela depravação e perversidade humanas. Uma cidade de refúgio para a moralidade, de excessos e sem alma. Os públicos não deverão ser maioritariamente femininos, mas elas é que ficam a perder.

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ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA>CAMEOS
:

ALIGN=JUSTIFY>SIZE=1 COLOR=#E90909>ROBERT RODRIGUEZ
COLOR=#AAAAAA> - usando o seu chapéu de cowboy quando Hartigan entra no Kadie’s Bar à procura de Nancy.


SIZE=1 COLOR=#E90909>QUENTIN TARANTINO
COLOR=#AAAAAA> - na parte final do segmento “That Yellow Bastard”, sentando ao lado de Marv vendo Nancy dançar no palco.


SIZE=1 COLOR=#E90909>FRANK MILLER
COLOR=#AAAAAA> - no papel de padre, contracenando com Marv.



ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>“Walk down the right back alley in Sin City, and you can find anything...”
MICKEY ROURKE (Marv)

ALIGN=JUSTIFY> “I love hitmen. No matter what you do to them, you don't feel bad.”
MICKEY ROURKE (Marv)

ALIGN=JUSTIFY>“Modern cars - they all look like electric shavers.”
MICKEY ROURKE (Marv)

ALIGN=JUSTIFY> “She smells like angels ought to smell.”
MICKEY ROURKE (Marv)

ALIGN=JUSTIFY> “That's the thing with dames, sometimes all they gotta do is let it out and a few buckets later there's no way you'd know.”
MICKEY ROURKE (Marv)

ALIGN=JUSTIFY> “I can only express puzzlement, which borders on alarm.”
RICK GOMEZ (Klump)

ALIGN=JUSTIFY> “She doesn't quite chop his head off. She makes a Pez dispenser out of him.”
CLIVE OWEN (Dwight)



















Seres Queridos **

16.06.05, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Dominic Harari e Teresa Pelegri. Elenco: Norma Aleandro, Guillermo Toledo, María Botto, Marián Aguilera, Fernando Ramallo, Alba Molinero, Max Berliner, Mario Martín. Nacionalidade: Espanha / Argentina / Portugal / Reino Unido, 2004.


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ALIGN=JUSTIFY>Leni (Marián Aguilera) prepara-se para a apresentar o seu novo namorado, Rafi (Guillermo Toledo), à família. Esta é uma situação já de si com potencial de tensão e de cómico. Se acrescentar-mos o facto de Leni ser judia e Rafi palestiniano, e Leni insistir para que Rafi se passe por judeu, pode-se imaginar uma série de situações caricatas com base nos contrastes de culturas e de políticas.

ALIGN=JUSTIFY>Pois não. Nada disso. A nacionalidade de Rafi é revelada às restantes personagens logo no início do filme. Por isso, tudo o que poderia advir desse segredo se desvanece. E a condição palestiniana face à judia torna-se tão pouco relevante que nos questionamos para que foi sequer levantada.

ALIGN=JUSTIFY>O filme limita-se, assim, e como já tantos outros antes, a relatar o incómodo exame dos sogros, que todos, mais cedo ou mais tarde, têm de “sofrer”. Para isso, usam-se personagens caricaturais com as quais não nos identificamos. Tal é o caso do irmão de Leni, David (Fernando Ramallo), cuja devoção aos rituais judaicos é mostrada com um arrogante paternalismo.

ALIGN=JUSTIFY>Algumas situações conseguem arrancar alguns sorrisos, e a ocasional gargalhada, sobretudo pelo ridículo. Se fosse um ridículo inteligente “a la Monty Python” (ou mesmo do judeu Woody Allen) eu não me queixaria, mas aqui é tudo demasiado forçado.

ALIGN=JUSTIFY>As duas estrelas são por Guillermo Toledo, um talentoso actor cómico, que deverá estrear ainda este mês, o bem mais divertido “Crimen Ferpecto”.

ALIGN=JUSTIFY>Dominic Harari e Teresa Pelegri, os realizadores, são casados e judeus não praticantes. Será que existe a possibilidade de se ser “realizador não praticante”?


ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> P.S. - O que mais me assustou no meio disto tudo foi o meu corrector ortográfico não identificar as palavras “palestiniano” e “palestiniana”. Acrescentei-as de imediato, claro!







Habana Blues ***

15.06.05, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Benito Zambrano. Elenco: Alberto Joel García Osorio, Roberto Sanmartín, Yailene Sierra, Tomás Cao Uriza, Zenia Marabal, Marta Calvó, Roger Pera, Julie Ladagnous. Nacionalidade: Espanha, 2005.


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ALIGN=JUSTIFY>Tito (Roberto Sanmartín) e Ruy (Alberto Joel García Osorio) são amigos e sonham poder viver da música que fazem na sua cidade, Havana. Tito vive com a sua avó, uma grande dama da música, e deseja sair de Cuba para conseguir os seus objectivos musicais (ou talvez acredite que será a música a permitir-lhe atingir o seu objectivo de sair de Cuba). Ruy vive com os seus dois filhos e a mulher, Caridad (Yailene Sierra), numa relação tempestuosa que deriva da sua infidelidade crónica.

ALIGN=JUSTIFY>A chegada de dois produtores musicais espanhóis vai aproximá-los do que tanto desejam, mais vai também pôr em causa a amizade que os une, o seu amor por Cuba, e a sua dedicação à música.

ALIGN=JUSTIFY>Em “Habana Blues” testa-se a amizade e o amor, num ambiente de cores fortes que contrasta com o desencanto e o desalento (os ‘blues’) dos indivíduos.

ALIGN=JUSTIFY>Depois do magnífico “Solas” (1999), Benito Zambrano traz-nos uma espécie de “Buena Vista Social Club” (Wim Wenders, 1999) ao som de rock, rap, heavy-metal, reggae e hip-hop. E é apenas no estilo musical que este filme mostra alguma originalidade, evidenciando uma Cuba menos típica, mais jovem. Mas nem por isso mais livre.

ALIGN=JUSTIFY>O caminho ‘underground’ é feito de música contestatária, por uma juventude inquieta, que é obrigada a partilhar o mesmo telefone, a regatear um pedaço de carne, a vender a independência da sua arte.

ALIGN=JUSTIFY>Mas Zambrano sacrifica as suas personagens, em discursos de discutível sentido, para defender pontos de vista que prejudicam a autenticidade e fluidez de uma história que roça o documental. A própria relação de Ruy e Caridade é confusa: ficamos sem perceber a paciência dela ou o desapego dele perante a perspectiva de ela levar os filhos de ambos para Miami.

ALIGN=JUSTIFY>O mérito reside na tentativa de equilíbrio no dilema vivido pelos cubanos, de ficar ou partir (legalmente, através de contratos musicais; ou ilegalmente, através de barcaças). Apesar a opção de ficar acabar por ser a menos/pior justificada. As interpretações, maioritariamente actores cubanos desconhecidos, são aceitáveis, mas sem brilhantismos, sendo de destacar Yailene Sierra como Caridad. De resto, o motivo de “vamos fazer um concerto” de que se alimenta “Habana Blues” acaba por ser limitado e de uma reduzida densidade emocional.

ALIGN=JUSTIFY>A música, limpa de salsas e boleros, torna também mais amena a viagem. De agradecer a Equis Alfonso (a voz de Ruy), José Luis Garrido, Kelvis Ochoa, Descemer Bueno, Kiki Ferrer e Dayan Abad. Os dois últimos, juntamente com Alberto Joel García Osorio, fazem parte da Habana Blues Band, actualmente em digressão por Espanha (a 21 de Junho, em Barcelona, na Sala Apolo).

ALIGN=JUSTIFY>Ao contrário das personagens, os lugares são detalhados e vividos intimamente, como é o caso do poético buraco no tecto do velho teatro, deixando passar o sol e o luar, símbolo de uma Cuba moribunda. Zambrano faz aqui um tributo à cidade onde estudou em 1992, e é esse entusiasmo e esse afecto que salvam este filme.

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BANDA SONORA

SIZE=1 COLOR=#AAAAAA>01. Cansado – HABANA BLUES
02. Habaneando – HABANA BLUES
03. Sedúceme – HABANA BLUES
04. Habana blues – HABANA BLUES
05. Arenas de soledad – HABANA BLUES
06. En todas partes – HABANA BLUES
07. Echate p'allá, echate p'acá – HABANA BLUES
08. Amanecer – HABANA BLUES
09. Lágrimas tatuadas – HABANA BLUES
10. Superfinos negros – FREE HOLE NEGROS
11. No se vuelve atrás – CUBA LIBRE
12. Aprende to walk – TRIBAL
13. Felación – PORNO PARA RICARDO
14. Rebelión – ESCAPE
15. Vivimos juntos – TIERRA VERDE
16. Sé feliz – ANAÍS ABREU



























A SEGUNDA GRANDE GUERRA EM FILMES

14.06.05, Rita

A história é escrita pelos vencedores, dizem os mais cépticos. Mas nos dias que correm, em que a divulgação dessa história passa por outros meios que os simples manuais académicos, o que se pode dizer é que há uns vencedores que são mais vencedores que outros.


Um dos acontecimentos históricos mais revisitados pelo cinema, que é disso que estamos a falar, foi a segunda guerra mundial (e nunca nenhuma guerra foi tão retratada no cinema como esta). Muitos desses filmes foram (e vão) chegando até nós, e foi em muito através deles que a nossa visão da história deste conflito foi sendo formada.


Devido à realidade em que nos inserimos, foi principalmente o cinema americano que nos forneceu essa visão. E como tal foi através da visão americana da guerra que fomos sendo “educados” quanto a ela. Isso leva, obrigatoriamente, a uma visão parcial do que foi essa realidade. Uma visão que tende a privilegiar as frentes onde as suas tropas combateram (a frente ocidental no teatro de guerra europeu, o pacífico) menorizando as frentes onde não estiveram directamente envolvidos (especialmente a frente leste na Europa, onde o exército soviético combateu o exército alemão), a destacar os “heróis” americanos e a ignorar ou a diminuir a importância dos feitos dos seus aliados (como exemplo basta ver a forma como Montegomery, comandante máximo das tropas britânicas no conflito e que é visto por estes quase como o maior génio da história militar, é retratado nos filmes americanos, quase sempre como um incapaz ou no máximo como uma boa hipótese para um momento de comic relief, vide “Patton” ou “O Resgate do Soldado Ryan”). Isto para não falar da visão como nos são apresentados os derrotados, alemães (esses tipos que falavam inglês com sotaque) e japoneses.


Não querendo daqui passar a ideia de uma conspiração americana para reescrever a história (mas que las hay...), o objectivo último de Hollywood é o lucro e o caminho mais rápido para o conseguir é apresentar ao público um herói americano, a verdade é que o que daí resultou foi sermos confrontados, quase sem contraditório, com essa visão parcial do conflito (mas há que dizer em sua defesa que os americanos não têm culpa que os outros países não consigam acompanhar o seu ritmo de produção cinematográfica). Mas com a celebração dos 60 anos do fim da guerra, surgiu o mais variado leque de produtos a comemorá-lo. E com ele a possibilidade de alargarmos a nossa visão do conflito.


A mais óbvia foi a estreia de dois filmes alemães (“A Queda” de Oliver Hirschbiegel e “Sophie Scholl – Os Últimos Dias” de Marc Rothemund), que nos permitiram a visão da guerra do lado de lá, dos derrotados. E trata-se de uma visão efectivamente renovadora (que não obrigatoriamente mais “isenta” que a que nos foi mostrada até hoje, mas, porque diferente, permitindo uma visão global mais “verdadeira” do conflito), quer na forma humana (em oposição a abstracta) como é retratado o Mal absoluto, quer na forma como mostra a relação do povo alemão com esse Mal, dando-nos a conhecer uma resistência (atrevo-me a dizer nunca antes mostrada) que existiu em alguns quadrantes da sociedade alemã em relação ao regime nazi.


Para essa visão renovada do conflito contribuiu também a programação dos diferentes canais portugueses para celebrar a efeméride, “visão nova” essa vinda inclusive do lado vencedor, contribuindo em muito para isso a verdadeira barragem de documentários de origem britânica produzidos este ano (quase se poderia dizer que o Reino Unido decidiu utilizar a sua melhor arma, a BBC, para combater Hollywood no tal processo de revisão histórica inexistente).


Mas ainda assim, a visão continua a ser bastante parcial, sendo de destacar, porque como escrevi no princípio a história é escrita pelos vencedores, a falta da apresentação da perspectiva do outro grande vencedor, a União Soviética. As razões para tal serão muitas, certamente a produção não atingiu níveis comparáveis com os americanos (e mesmo com os britânicos), sem dúvida alguma a capacidade de distribuição da cinematografia soviética no nosso pais foi mínima. A verdade é que poucas terão sido as exibições de filmes soviéticos sobre a segunda guerra mundial, no nosso país.


De forma a permitir minorar um pouco esse défice, aconselha-se o acompanhamento do ciclo de cinema soviético (infelizmente começado há já 2 semanas) intitulado “A Segunda Grande Guerra em Filmes”. Um ciclo que permite uma visão abrangente da forma como a guerra foi retratada pelo cinema soviético (e tendo em conta o período temporal, e diferentes realidades políticas, que este ciclo abrange, com fitas que vão desde 1959 até 1985 contando ainda com uma produção de 2002, permite também descortinar a forma como evoluiu a sua visão do conflito ao longo dos tempos) e que possibilita também aprofundar o conhecimento de uma cinematografia tão importante mas não tão divulgada entre nós (e embora não tenha visto nenhum dos filmes, um ciclo que inclui um filme de Tarkovski é sempre de valor).


A decorrer na Fundação Mário Soares. Rua de São Bento, nº 160, à frente da Assembleia da República. As sessões são às terças-feiras, sempre às 18h00, com entrada gratuita e todos os filmes legendados em português. Aqui segue o programa.



14 de Junho -
Balada de um soldado de Grigori Tchukhray, 1959

21 de Junho -
Infância de Ivan de Andrey Tarkovskiy, 1962

28 de Junho -
Alvoradas tranquilas de S. Rostotskiy, 1972

5 de Julho -
Destino de um homem de S. Bondartchuk, 1975

12 de Julho -
Torpedeiros de Simeon Aranovitch, 1983

19 de Julho -
Quando passam as cegonhas de M. Kalatozov, 1985

26 de Julho -
A estrela de Nikolai Lebedev, 2002 (legendado em inglês)


por Sérgio


 

Héctor ****

13.06.05, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Gracia Querejeta. Elenco: Adriana Ozores, Nilo Mur, Damián Alcázar, Joaquín Climent, Unax Ugalde, Núria Gago, Pepo Oliva. José Luis Gª Pérez, Mariano Peña, Elia Galera. Nacionalidade: Espanha, 2004.


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ALIGN=JUSTIFY>Héctor (Nilo Mur) tem 16 anos e acaba de perder a sua mãe. Apesar de não os ver há já muitos anos, Héctor muda-se para casa dos seus tios, Tere (Adriana Ozores) e Juan (Joaquín Climent) num bairro de Madrid. Para combater a insónia, Héctor lê e cozinha a meio da noite. No seu silêncio guarda rancor à mãe que pouco se ocupou dele e ao pai que não conhece. Um pai que ao saber da morte da mãe de Héctor, regressa do México na tentativa de conhecer o filho e recuperar o tempo perdido.

ALIGN=JUSTIFY>Apesar do título, este filme é bastante mais do que uma personagem. O argumento de Gracia Querejeta e David Planell traduz personagens consistentes e tri-dimensionais, unindo-as nas suas diversas relações com credibilidade, para o que contribui a muito boa direcção de actores.

ALIGN=JUSTIFY>Todos eles procuram um caminho, corrigir erros do passado, querendo definir-se a eles próprios. Em suma, procuram construir a sua vida através de decisões, nem sempre fáceis.

ALIGN=JUSTIFY>Juan debate-se com o dilema de entrar como sócio da empresa de transportes onde trabalha e o empréstimo que isso iria implicar ou continuar ao volante do seu camião. Tere enfrenta um casamento pleno de incompreensão, e o receio de perder o sobrinho recuperado. A prima de Héctor, Fany (Núria Gago) mantém, por inércia, uma relação amorosa com o seu chefe.

ALIGN=JUSTIFY>Esta família vai revelando, aos poucos, os segredos de uma mulher desequilibrada cuja existência afectou o filho, a irmã e o pai do seu filho, desenhando o seu retrato póstumo. Como símbolo dessa progressão, está a cozinha e seus temperos, também eles metáfora para a vida, onde é preciso ir construindo as receitas à medida que se vai provando.

ALIGN=JUSTIFY> “Héctor” é um filme sobre o medo: do futuro, da solidão, do amor, do compromisso. A belíssima canção ‘Miedo’ nas vozes de Pedro Guerra e Lenine faz o resto.


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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA>“Solo se vuelve atrás cuando uno es tan libre que volver atrás no significa rendirse.”



ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#E90909>MIEDO
SIZE=1> (Letra: Pedro Guerra, Lenine, Rodney D´Assis. Música: Pedro Guerra)



Tienen miedo del amor y no saber amar
Tienen miedo de la sombra y miedo de la luz
Tienen miedo de pedir y miedo de callar
Miedo que da miedo del miedo que da.

Tienen miedo de subir y miedo de bajar
Tienen miedo de la noche y miedo del azul
Tienen miedo de escupir y miedo de aguantar
Miedo que da miedo del miedo que da.

El miedo es una sombra que el temor no esquiva
El miedo es una trampa que atrapó al amor
El miedo es la palanca que apagó la vida
El miedo es una grieta que agrandó el dolor.

Tienen miedo de reír y miedo de llorar
Tienen miedo de encontrarse y miedo de no ser
Tienen miedo de decir y miedo de escuchar
Miedo que da miedo del miedo que da

El miedo es una raya que separa el mundo
El miedo es una casa donde nadie va
El miedo es como un lazo que se aprieta en nudo
El miedo es una fuerza que me impide andar.

Tienen miedo de la gente y de la soledad
Tienen miedo de la vida y miedo de morir
Tienen miedo de quedarse y miedo de escapar
Miedo que da miedo del miedo que da

Tienen miedo de encender y miedo de apagar
Tienen miedo de aguardar y miedo de partir
Tienen miedo de correr y miedo de parar
Miedo que da miedo del miedo que da.

Tienen miedo de caer y miedo de avanzar
Tienen miedo de amarrar y miedo de romper
Tienen miedo de exigir y miedo de pasar
Miedo que da miedo del miedo que da

Miedo de mirar el fondo


















































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