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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Être et Avoir ****

26.11.04, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Nicolas Philibert. Elenco: Georges Lopez, Alizé, Axel, Guillaume, Jessie, Johann, JoJo, Jonathan, Julien, Laura, Létitia, Marie, Nathalie, Olivier. Nacionalidade: França, 2002.


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ALIGN=JUSTIFY>Philibert leva-nos a Auvergne, França, numa viagem desde o agreste Inverno, passando pela suave Primavera, até ao sol de Verão, quando termina o ano escolar (em Junho de 2001). O padrão da mudança é acompanhado pelo crescimento e pela aprendizagem de um grupo de jovens entre os 4 e os 12 anos. O professor, Georges Lopez, 55 anos e 30 de ensino, está a um ano e meio da reforma.

ALIGN=JUSTIFY>Este documentário retrata a relação entre professor e alunos, a sua tentativa de chegar até eles, muitas vezes impenetráveis na sua timidez, na sua desconcentração. Na sua ilimitada paciência, Lopez responde às perguntas dos alunos com outras questões, conduzindo-os às respostas através do caminho da compreensão. Ele é amigo, família, educador, mentor. Apesar de ser evidente a distância (de segurança?) que mantém dos seus alunos, a relação que temos o privilégio de observar é uma relação de amor, de compromisso. Lopez lida com as várias vertentes dos seus alunos com uma extrema sensibilidade e atenção. Respeitando a sua inocência e ingenuidade, mas abrindo-lhes as portas de um mundo complexo.

ALIGN=JUSTIFY>A proximidade de uns e outros é evidente. Quando o professor fala sobre a sua reforma, o choque e a preocupação dos alunos quase se podem tocar. O mesmo acontece com o respeito que os une, claramente mútuo e sem condescendências.

ALIGN=JUSTIFY>Philibert escolheu esta escola cuidadosamente de entre 300 e visitou mais de 100 no período de um ano. Um reduzido grupo de alunos permitiria que ficássemos a conhecê-los a todos, e Philibert acertou em cheio, com eles e com Lopez. A sua equipa de filmagens adquiriu uma invisibilidade impressionante, e só muito raramente as crianças se dão conta dela. A sua naturalidade é totalmente desarmante, especialmente tendo em conta o nível de intimidade que temos oportunidade de observar.

ALIGN=JUSTIFY>Existe algo de básico, de essencial, neste momento esquecido da infância. É com sentida emoção e um fascínio sorridente, quase reverente, que o vemos. Há algo de divino nesta aquisição das ferramentas básicas da aprendizagem e dos dolorosos processos que lhe estão inerentes, seja aprender a desenhar as letras, seja saber qual o número que vem depois do “seis”.

ALIGN=JUSTIFY>O tom de documentário aparece apenas uma vez, num momento em que Lopez fala da sua vida, do seu compromisso com o ensino, e dos sacrifícios dos seus pais para que ele tivesse uma boa educação. Compromisso esse que ele renova com cada um dos seus alunos.

ALIGN=JUSTIFY>Na despedida fica a angústia. O vazio dos olhares de descoberta que antes enchiam a sala. O silêncio doloroso que as crianças deixam atrás de si. Tal como Georges, também nós ficamos sem palavras.

ALIGN=JUSTIFY>No final deste filme, dois nomes vêm-me à memória: Manuela, a minha professora primária e Albertina, a minha professora de inglês do 10º ao 12º. À primeira perdi-lhe o rasto, a segunda é sempre um dos meus postais de Natal. Talvez eu ainda não me tenha dado conta da sua contribuição para a pessoa que sou hoje, mas fica aqui um obrigada. Pelas doces recordações... Por aquilo que sou, por aquilo que tenho.

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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>color=#aaaaaa> “- É de manhã ou de tarde? JOJO
- Já almoçámos? GEORGES LOPEZ
- Não. JOJO
- Então é de manhã. GEORGES LOPEZ”


ALIGN=JUSTIFY> “- Podemos contar para sempre? GEORGES LOPEZ
- Não. JOJO”












Land of Plenty ****

25.11.04, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Wim Wenders. Elenco: John Diehl, Michelle Williams, Shaun Toub, Wendell Pierce, Richard Edson. Nacionalidade: EUA, 2004.


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ALIGN=JUSTIFY>Depois da desilusão dos resultados das eleições presidenciais norte-americanas, a última coisa que me apetecia era ver um filme sobre os Estados Unidos. Especialmente quando me parecia que versava sobre um obcecado patriota no pós-11 Setembro. Deixei-me convencer por um amigo que argumentou que quase de certeza este filme não chegaria a passar na sua cidade, e, claro, pelo nome Wim Wenders. Não me arrependi.

ALIGN=JUSTIFY> John Diehl é Paul, um veterano do Vietname, atormentado pelos pesadelos da guerra, entupido em comprimidos que atenuam os efeitos dos químicos a que esteve sujeito. O amor que tem ao seu país faz com que, após os ataques do 11 de Setembro, monte um sistema de vigilância áudio e vídeo na sua carrinha a percorra as ruas de Los Angeles (numa visão bem menos glamourosa que o habitual) em busca de todas as pistas que possam servir de ligação aos crimes, concentrando-se obviamente em todos os árabes que encontra.

ALIGN=JUSTIFY> Michelle Williams é Lana, a sua sobrinha, que cresceu entre África e o Médio Oriente e está de regresso de Tel Aviv, na esperança de poder contribuir para a cura das muitas feridas do seu país natal através do seu trabalho social numa missão cristã. A sua profunda fé em Deus é equiparada à fé de Paul em tudo aquilo que o seu país representa.

ALIGN=JUSTIFY> Wim Wenders é um alemão que vive nos Estados Unidos e a sua visão apresenta duas vertentes: a distância e a proximidade. A primeira talvez choque os americanos, a segunda os europeus. É inegável que os Estados Unidos conseguem, neste momento, angariar talvez a maior oposição que já tiveram deste lado do Atlântico, mas é preciso entender que quando falamos de um país, falamos de pessoas, de indivíduos que não podemos (devemos) generalizar numa massa compacta e disforme.

ALIGN=JUSTIFY> Poderia falar dos dois fantásticos protagonistas, da beleza das imagens, da inquestionável qualidade da banda sonora, mas este filme consegue, de facto se muito mais do que a soma das partes. Fala-nos da perda de inocência (e também de algum senso comum), de duas almas que tentam encontrar o seu caminho num mundo que perdeu toda a lógica. Por isso também eles são irracionais. Porque a emoção é tudo o que lhes resta.

ALIGN=JUSTIFY> O grande poder do terror é fazer com que passemos a olhar por cima do ombro a todo o momento, a julgar os outros preconceituosamente segundo a medida do mal, a viver no medo de sermos vítimas, e na impotência para evitar qualquer tragédia que possa ocorrer.

ALIGN=JUSTIFY> Mas há que encontrar em nós a réstia de amor pelo ser humano, que nos permita viver a nossa vida com respeito pelo outro, e, consequentemente, por nós próprios. Porque o amor não se mede pela força com que conseguimos defender aquilo que achamos que nos pertence, mas sim pela capacidade de partilhar o que somos.

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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “My home is not a place, it is people.”
SHAUN TOUB (Hassan)


ALIGN=JUSTIFY> “I would like to hear their voices. Because I don’t think they would like that others were killed in their name.”
MICHELLE WILLIAMS (Lana)

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “May the lights in The Land of Plenty shine on the thruth some day.”
LEONARD COHEN











A luta suja dos Óscares

24.11.04, Rita

Hollywood sempre gostou de uma boa guerra - e das lutas sujas também. Os Óscares são o melhor campo de batalha para uma lista infindável de maledicência, roupa suja e ataques venenosos. Afinal, a estatueta pode dourar a carreira de um filme ou de um actor. Ou matá-la, até uma próxima "première".


Após os atentados de 11 de Setembro, a imprensa americana anunciou o advento de uma nova indústria na meca do cinema: pipocas sem violência, sobriedade nas festas e unanimidade a rodos. Nem uma coisa, nem outra. Logo depois, em Março de 2002, o actor Russell Crowe digladiava-se na arena, apesar do seu combate ser no campo da inteligência, sem ponta do «Gladiador» que lhe tinha dado o Óscar de Melhor Actor em 2001. O filme «Uma Mente Brilhante», biografia filmada do matemático esquizofrénico e prémio Nobel John Nash, foi à época acusado de "apagar" sinais de anti-semitismo e homossexualidade (que existiriam na biografia real de Nash) - para se portar bem nos Óscares e não afastar os votos de judeus e "gays".


Nesse mesmo ano, os apoiantes dos três actores negros nomeados - o maior número de sempre numa só edição de Óscares - sopravam aos quatro ventos que Hollywood provaria que era racista se nenhum deles ganhasse. Ganharam dois dos nomeados (Denzel Washington e Halle Berry, a primeira mulher). É verdade que, à época, e em 74 edições, apenas um actor negro tinha recebido o principal prémio de interpretação - Sidney Poitier.


«As campanhas foram sempre extremamente competitivas, mas não me lembro de uma que tenha sido tão baixa e tão suja como a deste ano [de 2002]», comentava Robert Osborne, colunista do Hollywood Reporter e autor de um livro sobre a história dos Óscares («70 Years of the Oscar: The Official History of the Academy Awards»). Depois disso, os ataques continuaram sujos. E as campanhas mais violentas.


Afinal, nada é deixado ao acaso. Como políticos, os nomeados visitam potenciais votantes. As feiras e os mercados são substituídos por lares de antigos trabalhadores da indústria e os tempos de antena são "banners" e anúncios de páginas inteiras em "sites" e revistas da especialidade (basta ir às páginas "online" da Variety ou do Hollywood Repórter e descobrir a quantidade de filmes anunciados «for your consideration» - e o "for your" não é dirigido ao espectador, mas sim ao membro da Academia). Peritos de "marketing" são contratados para vender o seu produto - ou, pior, para dizer mal, muito mal, das coisas dos outros.


Mas a prática de conquistar os votos dos membros da Academia por métodos menos ortodoxos (que não sejam apenas as qualidades dos próprios filmes) não é de agora. Em 1930, a fundadora da Academia Mary Pickford ganhou o Óscar para melhor actriz depois de sumptuosas festas dadas a membros da instituição. E na década de 30, os grandes estúdios diziam aos seus artistas contratados em quem votar.


No entanto, a guerra aberta que agora antecede o "dia D" começou de facto há coisa de cinco anos: a Miramax produziu o vencedor da noite, «A Paixão de Shakespeare», com uma agressiva campanha publicitária - e «O Resgate do Soldado Ryan», de Steven Spielberg, não foi salvo do desastre. O mais forte na publicidade nem sempre é o melhor na qualidade cinematográfica.


A verdade é que o negócio do cinema não se compadece com insucessos na noite dos Óscares. Todos sorriem, todos batem palmadinhas nas costas uns dos outros, mas a cerimónia pode revitalizar a carreira industrial de um filme (como fez por exemplo com «O Silêncio dos Inocentes»). E se uma maldadezinha ajudar, por que não? «The show must go on».



por Miguel

 

The Forgotten **

23.11.04, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Joseph Ruben. Elenco: Julianne Moore, Anthony Edwards, Gary Sinise, Dominic West, Linus Roache. Nacionalidade: EUA, 2004.


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ALIGN=JUSTIFY>“The truth won't fit inside your brain.” É sob esta premissa que este filme assenta, subestimando assim o público que, com o trailer, se viu seduzido para uma história em que se sugeria o perigoso jogo da memória, e dos mecanismos psicológicos do indivíduo para construir a sua felicidade, muitas vezes apesar da realidade.

ALIGN=JUSTIFY>“The Forgotten” apresenta-nos Telly (Moore), uma mulher que está a tentar superar a morte do seu filho num acidente de avião. Mas o seu choque é ainda maior quando o seu psiquiatra (Sinise), corroborado pelo seu marido (Edwards, o Dr.Mark Greene de “ER”), a informa de que ela nunca teve um filho e que inventou todas as memórias que tem dos seus oito anos de vida. Mas será que isso é verdade? Ou não? Mais tarde, ela consegue convencer Ash (West), ou acordar a sua memória, a respeito de uma filha que ele havia esquecido, arranjando assim um aliado.

ALIGN=JUSTIFY>A verdade virá ao de cima? E isso interessa? Provavelmente não. Não querendo entrar em muitos detalhes, para quem, ao chegar ao fim desta crítica, ainda queira insistir em perder o seu tempo, resta-me dizer que me senti absolutamente ludibriada.

ALIGN=JUSTIFY>A MEMÓRIA é um assunto que me interessa e tive alguma esperança de poder acrescentar este a filmes como “Memento”, “Mulholland Drive”, “Abre los Ojos”, ou “Eternal Sunshine of the Spotless Mind”. Esperança que, obviamente, não se concretizou.

ALIGN=JUSTIFY>Porque é bastante mais simples o susto fácil que a tentativa de olhar para assuntos como a paramnesia (segundo a qual um indivíduo pode inventar aspectos da realidade e, no limite, toda a sua vida), foi escolhido um caminho convencional. “The Forgotten” oferece-nos pouco mais que um motivo para nos rirmos do seu ridículo. Na esperança de que um twist final ponha tudo nos eixos vamo-nos deixando ficar, já que mais não seja para ver a beleza serena de Moore, claramente subestimada num registo que o seu talento poderia facilmente cumprir.

ALIGN=JUSTIFY>A música de James Horner serve a função de nos fazer saltar no momento certo. Talvez sejam as duas ou três injecções de adrenalina o que nos mantêm acordados. Teria preferido que fosse o argumento.

ALIGN=JUSTIFY>Apesar do bom casting (já não via Linus Roache desde “O Padre”, 1996), o colapso perante o peso do disparate é inevitável. É de prever que “The Forgotten” seja esquecido muito rapidamente pelo público. E Moore provavelmente espera que o seu psiquiatra lhe diga que ela nunca fez este filme.

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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>color=#aaaaaa> “There are worse things than forgetting.”
LINUS ROACHE (A Friendly Man)










We Don’t Live Here Anymore ***

22.11.04, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Jonh Curran. Elenco: Mark Ruffalo, Laura Dern, Peter Krause, Naomi Watts. Nacionalidade: EUA, 2004.


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ALIGN=JUSTIFY>Vencedor do prémio Waldo Salt Screenwriting Award no festival de cinema de Sundance 2004 pelo argumento de Larry Gross, Desencontros descreve acutilantemente, mas num detalhe quase obsceno, a destruição de dois casamentos.

ALIGN=JUSTIFY>Jack e Terry Linden (Ruffalo e Dern), e Hank e Edith Evans (Krause-Sete Palmos de Terra e Watts), são opostos na forma como lidam com a sua família e o seu lar. Os primeiros são descontraídos e desleixados, os segundos são limpos e organizados. Partilham o facto comum dos seus casamentos estarem a ruir sem que qualquer um deles possa fazer algo para o evitar. Jack é colega e amigo de Hank, mas a atracção mútua que sente por Edith, e a sua consumação, traça o tom de tragédia que persiste até ao final.

ALIGN=JUSTIFY>Baseado em dois contos de Andre Dubus, este é um drama psicológico cheio de feridas profundas e ressentimentos recalcados. Curran e Gross distanciam-se dos personagens apenas o suficiente para não os julgar, dando-lhes várias, mas consistentes, dimensões. E com o mérito de não deixar que o melodrama fácil enrede a sua história.

ALIGN=JUSTIFY>Jack busca algo novo, ressentindo-se contra Terry pelos seus impulsos para a bebida e para o desleixo. Mas, ao mesmo tempo, não está preparado para deixar os seus filhos e a vida confortável que construiu. Por sua vez, Edith sabe que o seu marido já a traiu no passado, mas a sua amizade por Terry coloca uma pesada nuvem no seu arrebatamento por Jack. As suas acções são motivadas não só pelo desejo e pela infelicidade, mas também como uma forma inconsciente de vingança pelos erros dos seus parceiros.

ALIGN=JUSTIFY>Este filme é um thriller angustiante. Não porque exista a ameaça da verdade, que parece ter estado sempre ali. A tensão existe no confronto entre o que se sabe e o que se faz. E as acções carregam sempre consigo o elemento definitivo de resolução. Em vários momentos deste filme, dei por mim a solucionar os problemas dos personagens através das formas mais drásticas. Inquietei-me. Pelo facto de não saber se li essas intenções neles, ou em mim no seu lugar.

ALIGN=JUSTIFY>Desencontros presta atenção aos grandes e pequenos detalhes que fazem as relações, sem o receio de mostrar o lado escuro dos seus personagens, nem a sua fragilidade. Os desempenhos são, na generalidade, muito bons (confesso alguma decepção com Naomi Watts), causando-nos empatia apesar de (ou talvez, devido a) todas as suas imperfeições. Cada um tem um carácter particular, e as suas próprias inseguranças, com a quais se vê confrontado e tem de aprender a lidar. Como sempre, esse confronto directo apenas pode torná-los mais fortes.

ALIGN=JUSTIFY>Independentemente do amor que pode existir entre duas pessoas, existirá um momento em que, depois do mal feito, se torna impossível salvar tudo o que resta?

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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “- And your husband making passes at my wife, how do you feel about that?
- Well, everybody deserves to be happy.”
MARK RUFFALO (Jack) e NAOMI WATTS (Edith)











DocLisboa 2004: Documentários de sala cheia

12.11.04, Rita

Um casal palestiniano que necessita de ir a um hospital, uma ambulância do outro lado à sua espera. Entre eles um jipe israelita totalmente blindado que não lhes permite a passagem. Os palestinianos perguntam porquê. Do interior do jipe uma voz metálica responde-lhe apenas que não podem passar. E há uma câmara que filma tudo isto. E Isto é a curta metragem de documentário “Detail” de Avi Mograbi. E num simples momento muito do que é a questão palestiniana hoje, está ali.


Este foi um dos vários documentários apresentados na edição de 2004 do DOCLisboa que tentaram mostrar os acontecimentos na Palestina que não são noticia de primeira página nos meios de comunicação mundiais, e mais concretamente, o dia-a-dia da ocupação israelita da Palestina. Documentários como “Checkpoint” de Yoah Shamir, documento que acompanha os rituais (de humilhação) a que os palestinianos são obrigados nos postos de controlo israelitas espalhados pelo território palestiniano. Ou “Le Mur” de Simon Bitton, sobre a construção do Muro israelita que separa Israel da Cisjordania (e que pelo caminho vai retalhando ainda mais este território) e “Newstime” de Azza Al-Hassan, sobre o dia-a-dia de jovens palestinianos atiradores de pedras (este acompanhado pela curta-metragem (de ficção) de Elia Suleiman “Cyber Palestine” e que contou com a presença do realizador, que respondeu a algumas questões do público após a sua exibição). Provenientes dos dois territórios em conflito (“Checkpoint”, “Detail” e “Le Mur” são produções israelitas, “Newstime” e “Cyber Palestine” palestinianas) e de qualidade variada, os dois primeiros muito bons, os restantes nem por isso, são coincidentes no entanto a mostrar como o lado mais forte humilha o lado mais fraco, e ao fazê-lo estão a demonstrar como a ocupação israelita só piora tudo, porque fomenta o ódio dos palestinianos em relação a Israel, porque desumaniza os israelitas na sua relação com os palestinianos, porque torna impossível o entendimento entre as duas partes.


Mas o DOCLisboa não se ficou pela Palestina. Passou também por Espanha, através da secção “Foco em Espanha”, dos quais pude ver “La Pelota Vascã” do Julio Medem (realizador alvo de culto pessoal por parte do autor destas linhas) excelente documentário sobre a questão basca, que ouve e expõem as várias faces do conflito basco (ouvindo todos ou quase todos, do lado independentista e espanholista, familiares de etarras presos e familiares de vitimas de terrorismo, políticos, académicos, representantes da sociedade civil, etc...). Assente quase exclusivamente nas declarações dos diferentes entrevistados; num perfeito exercício de montagem e de utilização dramática da banda sonora, consegue mostrar toda a complexidade da questão basca e de como ela não pode ser reduzida a uma situação de bons contra maus (e talvez por isso tenha sido tão atacado pelo governo espanhol da altura, liderado por Aznar e pelo seu PP, aquando da sua estreia); “Asaltar los Cielos” de Lopez-Linares e Royo, biografia do homem que assassinou Trotsky, mas também dos ambientes sociais e políticos por onde passou (desde o movimento operário catalão anterior e durante a guerra civil espanhola, à União Soviética de Estaline e posteriormente de Brejnev, os círculos trotskystas no México, etc...) e “Cravan vs Cravan” de Isaki Lacuesta documentário sobre Arthur Cravan, poeta dadaista, pugilista, personagem “bigger than life” das esferas intelectuais europeias do início do século XX, objecto extremamente interessante que cruza o documental com a ficção, através de um narrador/investigador que se vai assumindo, com o desenrolar do documentário como um alter ego do próprio Cravan.


Também uma verdadeira personagem é Abel Ferrara, realizador nova iorquino que é o foco do documentário “Abel Ferrara: Not Guilty”. Produzido para a série “Cinema de Notre Temps” do canal arte-tv (o tal que a TVCabo decidiu retirar do pacote básico, mas que pelo que parece ninguém, com excepção do Prado Coelho, parece sentir grande falta, mas se se pode ver bons documentários em festivais tão na moda quem é que sente falta de os ver na televisão) este documentário limita-se a acompanhar um Ferrara absolutamente eléctrico (e se ele é assim no seu estado normal, como seria nos seus tempos de junkie) nas suas deambulações pela cidade de Nova Iorque. Simplesmente genial.


O DocLisboa também passou pela América do Sul, através de documentários como o português “Buenos Aires Hora Zero” ou o brasileiro “O Prisioneiro da Grade de Ferro”. O primeiro dá-nos, sob o pretexto macguffiano da procura do último descendente dos primeiros colonos portugueses na América do Sul espanhola, um retrato da cidade de Buenos Aires e das personagens que a compõem. Objecto interessante, especialmente quando se afasta da narração off do realizador e se deixa perder na cidade e nos seus habitantes, e com um ‘final twist’ (embora não propriamente surpreendente) quase à Shyamalan. Quanto ao documentário brasileiro, segue o dia-a-dia da prisão brasileira de Carandiru, que era, até a sua demolição, a maior prisão da América Latina. Feita com base em registos vídeo captados pelos próprios prisioneiros, o melhor que se lhe dizer é que consegue transportar-nos de facto, durante duas horas, para o interior da própria prisão.


E pronto, junta-se-lhes uma dose q.b. de gente e de tempo gasto nas filas para comprar bilhetes e temos o que foi o meu DOCLisboa 2004.



por Sérgio

 

 

HEDWIG - A ORIGEM DO AMOR ****

10.11.04, Rita

ALIGN=JUSTIFY>T.O.: Hedwig and The Angry inch. Realização: John Cameron Mitchell. Elenco: John Cameron Mitchell, Michael Pitt, Miriam Shor, Stephen Trask. Nacionalidade: EUA, 2001.


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ALIGN=JUSTIFY> “An anatomically incorrect rock odyssey”, assim diz o tagline deste filme.

ALIGN=JUSTIFY>Hedwig foi um projecto que começou em 1994, quando John Cameron Mitchell e Stephen Trask decidiram criar um concerto à volta da história. O formato concerto não vingou e decidiram assim lançar a obra como um espectáculo teatral. Decidiram assim comprar o Hotel Riverview, transformando-o no Jane Street Theatre. Aí se representou a peça durante alguns anos, conseguindo ser um enorme sucesso off-Broadway. A passagem para filme foi o passo seguinte.


ALIGN=JUSTIFY>Ladies and gentlemen…
Whether you like it or not…
HEDWIG!

ALIGN=JUSTIFY>É a história de Hansel ‘Hedwig’ Schmidt, uma deusa nascida na Alemanha de Leste, ignorada no mundo do rock, e vítima de uma operação de mudança de sexo que lhe deixou apenas uma “angry inch”.

ALIGN=JUSTIFY>Num formato de musical cruzado com comédia e algumas cenas de animação, Hedwig faz desfilar a sua odisseia desde o início, quando conhece um soldado americano que lhe promete a saída da sua terra natal para os Estados Unidos, e o/a convence a mudar de sexo. Após a problemática operação, que não retirou por completo o membro e deixou Hedwig a sangrar (“My first day as a woman and already it’s that time of the month…”), o soldado americano abandona-a num parque de roulottes no Kansas.

ALIGN=JUSTIFY>Aí, ela dedica-se à música e começa a trabalhar como ama numa casa onde conhece Tommy Speck, um jovem de 18 anos, por quem se apaixona. Mais uma vez, Hedwig é abandonada, mas agora o seu companheiro leva consigo um espólio de canções compostas pelos dois, e que o transformam na estrela rock Tommy Gnosis.

ALIGN=JUSTIFY>Ferida no orgulho e no amor, Hedwig persegue a tournée do seu ex-companheiro, actuando em restaurantes de fast-food nas proximidades dos grandes pavilhões esgotados para ouvir Tommy Gnosis.

ALIGN=JUSTIFY>A beleza visual, as canções lindíssimas e um argumento repleto de bons momentos de humor são só por si excelentes razões para ver este filme. Mas os desempenhos de John Cameron Mitchell e de Miriam Shor são de facto dignos de nota especial, pela especialmente bem escolhida ambiguidade sexual no que respeita à atribuição dos papéis.

ALIGN=JUSTIFY>A história de Hedwig é uma luta pela coragem para vencer um amor que o persegue (ou será o inverso?), e no fundo a tentativa de encontrar alguma felicidade. O final em aberto permite as mais diversas interpretações, mas não deixa de ser uma história inspiradora para todos aqueles a quem a vida deu apenas uma polegada quando mereciam realmente uma milha.

ALIGN=JUSTIFY>O prazer quase masoquista de Hedwig ao tocar junto aos palcos de Tommy Gnosis retrata não só a dor, mas a incapacidade para deixar fugir alguém que ama. Será esta incapacidade uma coisa má? Não me parece; a coragem de Hedwig contrasta claramente com a fraqueza e infantilidade de Tommy Gnosis, e é assim que, na minha opinião, mais forte se torna quem ama e é de facto capaz de exercer esse amor.

ALIGN=JUSTIFY>Além disso, a beleza do amor perde a sexualidade e adquire uma dimensão quase metafísica. Tudo isto num cenário de glamour e cheio de maquilhagem e rock.

ALIGN=JUSTIFY>Algumas notas sobre a banda sonora:

ALIGN=JUSTIFY>Inspirado pelo glam e punk rock, Stephen Trask compôs belíssimas canções, que contam a história de Hedwig de forma brilhante. Para além de “Tear me down”, “Angry Inch” e “Wig in a box” (o momento mais vaudeville), destaco dois momentos no filme:

ALIGN=JUSTIFY>- Origin of Love, em que se recupera o mito d’O Banquete de Platão sobre a génese do amor, e em que a sequência de animação é brilhante. A letra está muito bem conseguida e a nível de composição, o tema talvez seja o que mais se aproxima da linguagem de Bowie no período 1972-75;

ALIGN=JUSTIFY>- Midnight Radio, em que Miriam Shor se revela como mulher, surpreendendo todos que não o sabiam. Ups… Espero não vos estragar a surpresa :)



ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA>por Luís



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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA>Hansel's Mom : “To be free, one must give up a part of oneself.”


ALIGN=JUSTIFY>Hedwig: “The road is my home. In reflecting upon the people whom I have come upon in my travels, I cannot help but think of the people who have come upon me. Tommy, can you hear me? From this milkless tit you have sucked the very business we call show!”

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA>Hedwig: “Remember kids, don't buy drugs....become a pop star and they give them to you for free.”



SRC=http://us.movies1.yimg.com/movies.yahoo.com/images/hv/photo/movie_pix/fine_line_features/hedwig_and_the_angry_inch/john_cameron_mitchell/hedwig.jpg>


SRC=http://us.movies1.yimg.com/movies.yahoo.com/images/hv/photo/movie_pix/fine_line_features/hedwig_and_the_angry_inch/_group_photos/john_cameron_mitchell3.jpg>













Sky Captain and the World of Tomorrow ***

09.11.04, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Kerry Conran. Elenco: Jude Law, Gwyneth Paltrow, Angelina Jolie, Giovanni Ribisi, Michael Gambon. Bai Ling, Omid Djalili, Sir Laurence Olivier. Nacionalidade: EUA / Reino Unido / Itália, 2004.




ALIGN=JUSTIFY>Houve duas razões que me levaram a ver este filme: primeiro, a paixão descontrolada que nutro por Jude Law desde “Wilde” (1997), de Brian Gilbert; segundo, a paixão descontrolada que nutro por Angelina Jolie desde “Playing by Heart” (1998), de Willard Carrol.

ALIGN=JUSTIFY>Não esperava um filme que mudasse a minha vida e me fizesse pensar sobre todas as questões metafísicas que movem o ser humano. Queria apenas divertir-me. E, enquanto não chega a próxima comédia de Law, Alfie, de Charles Sayer, esta pareceu-me uma opção refrescante.

ALIGN=JUSTIFY>Confesso que tenho uma fraqueza por tudo o que é belo. Chamem-me superficial, mas o trabalho de imagem digital deste filme encheu-me as medidas. Tal como o “Immortel (ad vitam)”, de Enki Bilal, todos os cenários de “Sky Captain” são gerados por computador. Além dos actores, apenas os objectos nos quais eles tocam de facto existem.

ALIGN=JUSTIFY>“Sky Captain” começou a tomar vida há cerca de uma década atrás, no computador de Conran. O resultado foi uma abordagem imaginativa de uma era inexistente: uma mistura de futuro de ficção com o visual retro dos anos 30. Uma homenagem ao cinema, patente desde logo na sequência da projecção do “Feiticeiro de Oz” num Radio City Music Hall virtual, varre todo o filme, com alusões nostálgicas a uma época em que as comédias românticas e os filmes de aventura viviam de um leve humor e ingenuidade.

ALIGN=JUSTIFY>“Sky Captain” tem um trabalho de argumento bastante fraco e inconsistente. Um ataque surpresa a Nova Iorque perpetrado por máquinas gigantes. Sky Captain (Law) é chamado como último recurso sempre que existem ameaças à segurança. A sua ex-namorada Polly Perkins (Paltrow) descobre o furo do século ao seguir a história do desaparecimento de diversos cientistas. O dissentido casal descobre um plano de domínio mundial desenhado por um louco (representado por Sir Laurence Olivier, “ressuscitado” pela mágica incorporação de imagens de arquivo) e decidem salvar o mundo. Nada de mais.

ALIGN=JUSTIFY>Somos confrontados com um universo que não nos é explicado, através de personagens muito pouco trabalhados, e levados por uma história básica, cujo desenvolvimento é quase irrelevante, porque estamos demasiado atentos a absorver todos os detalhes visuais de luz e sombras, cores pastel esbatidas como fotografias velhas, e, claro, Law e Jolie.

ALIGN=JUSTIFY>Paltrow parece uma Veronica Lake, Law oscila entre Errol Flynn e Douglas Fairbanks. Mas Jolie (no papel de Franky Cook) tem uma força que quase ofusca a personagem de Law, ao mesmo tempo que a sua mística feminina obnubila Paltrow. Se lhe tivessem dado mais um pouco de tempo este filme poder-se-ia chamar Franky Cook and the World of Tomorrow.

ALIGN=JUSTIFY>Tudo bem, não é um grande filme, mas é uma experiência visual no mínimo: (1) assustadora, se pensarmos nas consequências que podem advir para a indústria cinematográfica se este tipo de produção virar moda (esqueçam os figurantes e os astronómicos custos de produção); (2) e bela, se nos deixarmos levar pelos estímulos visuais e admitirmos a grande ilusão que é o cinema.

WIDTH=70% COLOR=#E90909 SIZE=1>

ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “It’s only a movie Mr.Paley. I’ll bring you some popcorn.”
GWYNETH PALTROW (Polly Perkins)


ALIGN=JUSTIFY> “- Polly... you...
- It's all right. You don't need to say anything.
- Lenscap.”
JUDE LAY (Joe “Sky Captain” Sullivan) e GWYNETH PALTROW (Polly Perkins)












Personal Velocity **

08.11.04, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Rebecca Miller. Elenco: Kyra Sedgwick, Parker Posey, Fairuza Balk. Nacionalidade: EUA, 2002.




ALIGN=JUSTIFY>“Personal Velocity”, o vencedor do grande prémio do júri de melhor filme na edição de 2002 do Festival de Cinema de Sundance, não é tanto um filme, mas mais um conjunto de três curtas que mergulha no drama da vida de três mulheres: Delia (Sedgwick), Greta (Posey) e Paula (Balk).

ALIGN=JUSTIFY>Três mulheres em encruzilhadas nas suas relações com os homens optam pela fuga. Após tentarem por demasiado tempo esconder a sua verdadeira essência, de se acomodarem a uma segurança que as protegia de ser quem eram verdadeiramente, acabam por, de uma forma algo tortuosa e sobretudo dura, encontrar o seu caminho. O relato de um acidente de viação une levemente os três capítulos. Mas o elemento verdadeiramente comum é o de revelação, de epifania, três pontos de viragem de três vidas completamente distintas.

ALIGN=JUSTIFY>Delia usa o sexo como arma, até ao dia em que se apaixona e acaba por perder o controlo da sua própria vida. Ao decidir fugir do marido que a agride dá-se conta de que não tem para onde ir.

ALIGN=JUSTIFY>Greta debate-se entre a sua ambição recalcada pela influência de um pai bem sucedido e o amor ao marido e à sua simplicidade. Um sentimento que se vai perdendo, à medida que o seu sucesso profissional cresce e que a faz detestar-se a si própria.

ALIGN=JUSTIFY>Por sua vez, Paula vê a fé na sua relação abalada ao descobrir que está grávida. A sua ligação directa ao acidente acaba por impulsioná-la a uma viagem de descoberta.

ALIGN=JUSTIFY>Todos os momentos de mudança radical são momentos de dor. Seja por nos darmos conta dos erros, seja por compreendermos que temos um caminho a fazer. Escolher implica sempre abdicar. E muitas vezes, ver à nossa frente a estrada que nos espera pode ser quase tão assustador como caminhar de olhos vendados. Porque ainda que saibamos qual é direcção que devemos seguir, nada nos é assegurado, nem a felicidade nem a ausência de novas dores.

ALIGN=JUSTIFY>Miller faz uma abordagem muito pessoal e intimista das suas personagens, sem cair numa alegoria, e é evidente que as conhece muito bem. O livro que serve de base ao filme é também da autoria de Miller. Felizmente, para nós, ver um filme não é ler (o que beneficia ambas as actividades). Infelizmente, para Miller, isso também é verdade. O excesso de narração deixa muito pouco à representação de três actrizes com inquestionáveis capacidades, mesmo com o pouco que lhes é dado fazer. Já para não falar no uso abusivo da “theme song” da primeira sequência, que insiste em reforçar ad nauseum o carácter da personagem anteriormente “dissecado” pelo narrador.

ALIGN=JUSTIFY>“Personal Velocity” é um livro visual em três capítulos, lido por John Ventimiglia. Acho que preferia ter ficado no meu sofá a lê-lo.

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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>color=#aaaaaa> “Everyone has their own personal velocity.”
GRETA’S FATHER


ALIGN=JUSTIFY> “I used to write. Then I used to paint. I think I'm going to be one of those people with a lot of potential who never really takes off.”
FAIRUZA BALK (Paula)










My First Movie: Twenty Celebrated Directors Talk About Their First Film

05.11.04, Rita


de Stephen Lowenstein, Penguin Books (2002)




Este é um dos livros que, desde há já algum tempo, é um habitante assíduo da minha mesa de cabeceira, malas de viagens e mesas de café.


Descobri-o numa pequena referência de uma publicação da especialidade e não descansei até colocar as mãos naquela textura levemente rugosa e o meu nariz no meio daquele odor quente do papel novo.


Depois de calcorrear todos os antros de literados (leia-se livrarias) de Lisboa, cheguei à conclusão que Portugal iria manter-se incógnito a esta edição durante mais algum tempo. Um tempo demasiado longo para que a minha característica impaciência por tudo o que emana boas vibrações me deixasse repousar em paz. Resolvi, pois, enveredar pelo muito adiado caminho da compra cibernética. No entanto, as minhas reticências quanto a largar no ciberespaço um pequeno pedaço da minha identidade (financeira) mantinham-se enraizadas na mentalidade genética do “dinheiro debaixo do colchão”. Felizmente, tenho amigos bem mais inovadores que eu e aproveitei-me da boleia de um deles, ficando a portagem (leia-se portes de envio) a meu cargo.


Porque comprar na Amazon dos Estados Unidos saía mais barato, esta peça de escrita atravessou o imenso Oceano Atlântico e veio parar às minhas mãos, como eu sabia que estava destinado, ainda com o cheiro de casco de navio e uma humidade salgada a pingar das folhas. Eu compararia este livro a uma deliciosa barra de chocolate que se vai saboreando com tempo e dedicação, mas isso seria se, nas minhas mãos, o chocolate conseguisse sobreviver mais de 1 minuto, o que não é o caso. Mas a ideia é mais ou menos essa.

O título do livro é pouco enigmático e não deixa margens para dúvida. Stephen Lowenstein, um jovem realizador, é quem faz as perguntas, e, um pouco à semelhança da sua curta-metragem “The Man Who Held is Breath” (1996), também nós sustemos a respiração, suspensos no ar que é trocado nas diversas entrevistas realizadas a uma mão cheia (e bem) de realizadores.


O elemento comum que une as diversas experiências é o relato detalhado, vivo, revelador e puro da realização do seu primeiro filme. Este é o bastidor dos bastidores: da escrita do guião à recolha de financiamento, do casting dos actores à composição da equipa técnica, da filmagem à edição, da venda do filme ao seu visionamento. Todos os aspectos da indústria cinematográfica são aqui explorados na primeira pessoa, reflectindo a luta por um espaço de criatividade individual, na sua grande maioria feita à custa de consideráveis sacrifícios, sobretudo pessoais.


Um conjunto de realizadores tão diverso como Oliver Stone e Anthony Minghella (o mainstream de Hollywood), os irmãos Coen e Kevin Smith (os independentes americanos), Ken Loach e Stephen Frears, Mike Leigh e Neil Jordan (os ingleses), Ang Lee, Bertrand Tavernier e Pedro Almodóvar (os “estrangeiros”) falam sobre a sua “estreia”. São diferentes personalidades e abordagens cinematográficas, mas o seu entusiasmo é comum. Lowenstein sugere que tal se deve à rara oportunidade de poderem falar sobre um filme que não estão a tentar vender.


Cada capítulo traz a história do nascimento de um filme, que, como um filho, leva o seu progenitor a recuar na memória através de uma viagem emocional, muitas vezes tragicómica. O que se descobre, mais do que a personalidade dos realizadores ou as técnicas subjacentes à concepção de uma primeira obra cinematográfica, é um profundo amor pelo cinema, pela arte de transmitir ideias com imagens, de contar histórias através da combinação de sons e silêncios, de cores e luzes, de planos, película e lentes.


São histórias de triunfo e desastre, de noites em branco e dias de tensão, histórias de homens e mulheres que se empenharam num sonho, que construíram o seu caminho profissional através de descobertas, umas emocionantes outras desoladoras, a par de fugazes momentos de sorte. A inocência, a credulidade, a utopia, a liberdade, chocam aqui com a realidade e as suas contingências, com a usurpação, o cinismo e a arrogância. Erros, inseguranças, ignorância técnica, transformam-se na aprendizagem e esta só é possível através de uma grande dose de humildade e respeito pela experiência de outros.


Apesar do pedaço estanque que é cada capítulo, este livro consegue ser dotado de uma unidade apenas possível pela coerência do entrevistador, pelo seu profundo conhecimento dos entrevistados e das suas obras, pela enorme inteligência das perguntas e pela imensa entrega de quem deixa descobrir as suas memórias mais íntimas.


Rebeldia, inconformidade, atrevimento, originalidade, humor, dedicação, responsabilidade, amor.


Preciso dizer mais?



[ACTUALIZAÇÃO 22 Dezembro 2005]

Já à venda numa FNAC perto de si.







CONTÉUDO:


JOEL and ETHAN COEN: Blood Simple (1984)
TOM DICILLO: Johnny Suede (1991)
ALLISON ANDERS: Gas Food Lodging (1992)
KEVIN SMITH: Clerks (1994)
STEPHEN FREARS: Gumshoe (1971)
KEN LOACH: Poor Cow (1967)
MIKE LEIGH: Bleak Moments (1971)
BERTRAND TAVERNIER: The Watchmaker of Saint-Paul (1974)
BARRY LEVINSON: Diner (1982)
OLIVER STONE: Salvador (1986)
NEIL JORDAN: Angel (1982)
ANTHONY MINGHELLA: Truly, Madly, Deeply (1991)
MIRA NAIR: Salaam Bombay! (1988)
MIKE FIGGIS: Stormy Monday (1988)
PEDRO ALMODÓVAR: Pepi, Luci, Bom (1980)
STEVE BUSCEMI: Trees Lounge (1996)
GARY OLDMAN: Nil by Mouth (1997)
ANG LEE: Pushing Hands (1992)
P. J. HOGAN: Muriel’s Wedding (1994)
JAMES MANGOLD: Heavy (1995)



SUGESTÃO:


Ver o filme respectivo após a leitura de cada entrevista poderá aumentar o prazer de ambas as actividades.


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