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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Ni pour, ni contre (bien au contraire) ***

02.09.04, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Cédric Klapisch. Elenco: Marie Gillain, Vincent Elbaz, Simon Abkarian, Dimitri Storoge, Zinedine Soualem. Nacionalidade: França, 2003.





ALIGN=JUSTIFY>Depois da experiência de A Residência Espanhola, Cédric Klapisch debruça-se sobre um novo conjunto de personagens, e apesar de se tratar de um film noir, toca em alguns pontos já abordados anteriormente. O ponto de vista é o do personagem estranho ao grupo, que decide enfrentar uma experiência radicalmente diferente da vida que tem levado até ali, e que encontra finalmente, de uma forma algo insólita e invulgar, uma “família” com a qual desenvolve um sentimento de pertença. Klapisch aborda novamente o romper dos preconceitos, a descoberta dos limites individuais, o crescimento pessoal.

ALIGN=JUSTIFY>Desta feita, o filme centra-se em Caty (Gillain), uma jovem operadora de câmara free-lancer a quem é oferecida a oportunidade de ganhar bastante dinheiro filmando um assalto. Do improvável grupo de criminosos fazem parte Jean (Elbaz), o carismático chefe por quem Caty não consegue disfarçar uma certa atracção, Lecarpe (Abkarian), casado e dono de um restaurante de kebab, Mouss (Soualem), coreógrafo de bailarinas de cabaret, e Loulou (Storoge), o jovem inconsequente.

ALIGN=JUSTIFY>Depois de provar o luxo e a facilidade deste modus vivendi com o seu novo grupo de amigos, Caty tenta sobreviver por si própria com pequenos roubos, repetindo os gestos e as palavras que aprendeu. Mas, de uma forma calculista, Jean tem planeado para ela o papel da sua vida no golpe que lhes trará uma soma avultada de dinheiro. Convencidos a esquecer os receios que cada um deles tem face ao plano megalómano, dá-se início a uma lenta espiral de descida aos infernos, onde o humor negro da primeira parte é substituído por um sombrio ambiente de traição e morte.

ALIGN=JUSTIFY>A questão moral: Caty é a pessoa boa que descobre o seu lado mau. O seu negativo é Jean, a pessoa má que, como ele próprio diz, tem no fundo de si um pouco de branco. De que outro lado poderiam vir as suas lágrimas?
ALIGN=JUSTIFY>Klapisch é exímio na gestão que faz dos tempos, de humor, de violência. Marie Gillain é surpreendente num caleidoscópio de fragilidade e sedução, no caminho que faz das lágrimas pela inocência perdida no primeiro crime, passando pelo sorriso da ambição criminosa, à frieza do triunfo do seu último golpe. A sua expressividade é tanta, que Klapisch abdica de qualquer palavra na cena final, deixando o rosto de Gillain dizer tudo.

ALIGN=JUSTIFY>Sem as lições de moral do cinema convencional, mas também sem chegar a subverter (apesar de mais de uma vez ter dado por mim a torcer pelos maus), este é um filme a descobrir.
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CITAÇÕES:


COLOR=#AAAAAA>“La mauvaise route est souvent la meilleure...”













Fahrenheit 9/11 *****

01.09.04, Rita

Realização: Michael Moore. Argumento: Michael Moore. Género: Documentário. Nacionalidade: EUA, 2004.





É difícil avaliar este filme de forma distante. Saí da sala num misto de raiva, revolta, tristeza e incredulidade. Até as gargalhadas barulhentas eram ácidas. A realidade supera a ficção. Nenhum argumento poderia ser tão cruel, inconsequente, delirante e hipócrita e, ao mesmo tempo, tão consistente.


Michael Moore preferiu aparecer pouco desta vez, o material recolhido fala por si. Poderá ter havido alguma manipulação que potencie o impacto de “Fahrenheit 9/11”, já que não deixa de ser a defesa de um ponto de vista, mas negar o seu conteúdo geral seria enfiar a cabeça na areia.


Alguns relatos pessoais podem ser vistos como exploração do sofrimento, como o caso de Lila Lipscomb, que perdeu um filho no Iraque, mas são esses casos que nos fazem perceber que não é no abstracto que tudo se passa, e que as consequências de decisões político-económicas se fazem sentir em pessoas reais e não num “eles” impessoal com o qual nos é fácil conviver.


“Fahrenheit 9/11” mostra a incongruência do processo eleitoral que em 2000 colocou Bush na presidência dos EUA, o drama do ataque terrorista de 11 de Setembro e as acções levadas a cabo em consequência. Curiosamente, a única imagem que não temos é a do ataque. O ecrã escuro permite apenas ouvir e reviver as sensações que essa tragédia nos causou e às quais Moore vem adicionar informação.


Retemos a imagem de um presidente que cerca de 10 minutos após saber do ataque ao seu país se mantém impávido, numa sala de aula onde efectua mais um acto cosmético, sem saber o que fazer por não ter quem lhe diga. Um presidente que entre a sua eleição e o ataque terrorista passou 42% do seu tempo de férias, um presidente com laços económicos à família Bin Laden, à qual permitiu sair do país imediatamente após os ataques, quando todos os voos estavam cancelados, um presidente com interesses directos e indirectos no Iraque. Um país invadido e dizimado em nome da defesa de uma liberdade que é violada nessa mesma invasão. E o drama pessoal de quem é usado como peão num jogo de regras viciadas.


Ao contrário do que pode parecer, este é um filme patriótico que defende o americano médio, que ama e se sacrifica pelo seu país. E, por isso, merece a defesa dos seus interesses, que a sua opinião seja ouvida, que o seu voto conte. Sobretudo, que merece respeito. Tal como todos os seres humanos.


Um filme que é importante ver, não pela Palma de Ouro recebida em Cannes, mas porque esta realidade é também a nossa.




CITAÇÕES:


“It's not a matter of whether the war is not real, or if it is, Victory is not possible. The war is not meant to be won, it is meant to be continuous. Hierarchical society is only possible on the basis of poverty and ignorance. This new version is the past and no different past can ever have existed. In principle the war effort is always planned to keep society on the brink of starvation. The war is waged by the ruling group against its own subjects and its object is not the victory over either Eurasia or East Asia but to keep the very structure of society intact.”
NARRADOR (MICHAEL MOORE) citando GEORGE ORWELL


“I've always been amazed that the very people forced to live in the worst parts of town, go to the worst schools, and who have it the hardest are always the first to step up, to defend us. They serve so that we don't have to. They offer to give up their lives so that we can be free. It is remarkably their gift to us. And all they ask for in return is that we never send them into harm's way unless it is absolutely necessary. Will they ever trust us again?”
NARRADOR (MICHAEL MOORE)


 

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