DOCLISBOA 2005 - 3ª Parte: O PERÍODO PAULO BENTO
A noticia era oficial. Já havia treinador.
Parti assim para a minha última sessão documental. O filme em questão era "Diário da Bósnia" de Joaquim Sapinho, obra que documenta as viagens do realizador à Bósnia no período posterior ao da guerra naquela ex-república jugoslava, e que se apresenta como uma longa reflexão do autor sobre esse conflito, sobre as suas consequências, as suas memórias.
O maior problema deste filme é precisamente esse carácter reflexivo que a obra assume. É que para se aventurar numa obra deste tipo convém ter algo de interessante para dizer. E Sapinho claramente não tem.
Nesta sua estreia no documentário, Sapinho opta por ignorar quase completamente o que as pessoas que filma lhe/nos poderiam transmitir, optando por tentar transmitir-nos, em vez, as impressões que ele retirou daquilo que viu, ou, deduz-se, daquilo que sentiu. Mas o problema é que nunca consegue fugir da pura banalidade (e não deixa de ser sintomático que as poucas frases interessantes que aparecem no documentário estão entre as poucas que não lhe pertencem).
Tem que se lhe dar o mérito de, no entanto, ter arriscado uma empresa deste género, de não ter tomado a opção mais fácil limitando-se a um simples filme-reportagem sobre a situação extrema com que se deparou. E reconhecer que não é fácil levar um empreendimento deste a bom porto.
E é preciso também dizer que, no que à apreciação da obra diz respeito, Sapinho teve algum azar com o timing da sua estreia. É que ainda está muito presente na memória o magistral "A Nossa Música" de Jean Luc Godard, e é impossível ver este documentário sem nos lembrarmos do que Godard conseguiu fazer a partir de premissas semelhantes. (E isso poderá levar a uma ainda maior injustiça na apreciação da obra de Sapinho, porque Godard é demasiado grande, e estabelecer uma comparação entre os dois, assente no simples facto de ambos serem realizadores de profissão é um pouco, sei lá, como comparar o meu futebol com o do Zidane só porque também jogo futebol uma vez por semana, com os meus colegas de trabalho).
Mas isto tudo para dizer que não se trata de um filme mau. Está de facto repleto de bons planos, tem algumas boas sequências, em momentos em que Sapinho (e desculpem a maldade) está calado e nos poupa das suas reflexões, mostrando, por exemplo, um bom domínio na montagem. No entanto, e é também preciso dizê-lo, não consegue que o filme seja mais do que um conjunto de quadros, não conseguindo nunca dar ao filme uma sensação de sequência, de unidade, não nos transportando nunca para aquela realidade que nos mostra.
Acima de tudo, deste documentário fica a sensação de que este foi um projecto demasiado ambicioso para a arte de Sapinho. Pergunto-me o que poderia ser este filme se em vez de a Sapinho, o ICAM tivesse decidido pagar as viagens à Bósnia a Pedro Costa. Mas Costa é um caso único e, de qualquer maneira, por esta altura devia andar pelo bairro da Fontainhas a fazer algumas das obras mais importantes do cinema contemporâneo português.
O Festival para mim acabou assim. Não acabou em grande, de facto, mas também não acabou em miséria. Foi um pouco como a estreia do novo treinador, no Domingo seguinte. É isso. O festival para mim acabou num empate.
por Sérgio