4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias ***
T.O.: 4 Luni, 3 Saptamani si 2 Zile. Realização: Cristian Mungiu. Elenco: Anamaria Marinca, Laura Vasiliu, Vlad Ivanov, Alexandru Potocean. Nacionalidade: Roménia, 2007.
1987, a Roménia está ainda sob o totalitarismo do ditador comunista Nicolae Ceausescu. Otilia (Anamaria Marinca) e Gabita (Laura Vasiliu) são duas estudantes universitárias que partilham um quarto num dormitório de uma cidade romena não identificada. O dormitório assemelha-se a uma prisão, e o dia-a-dia é um mercado negro incentivado pelo rígido regime comunista. Otilia e Gabita estão agitadas, a primeira de uma forma assertiva e agressiva, a segunda insegura e hesitante, enquanto se preparam para passar os próximos dois dias num hotel.
Cristian Mungiu que, com este filme arrebatou a Palma de Ouro em Cannes o ano passado, gere a informação que nos quer dar com extrema cautela, mantendo um tom misterioso e provocando um estranho desconforto acerca dos planos das duas amigas. Num exercício profundamente realista, a acção é condensada num único dia. Um dia marcado pela impotência e vulnerabilidade, pelo dilema moral, e pela suspeição (sobre actos, palavras e sentimentos). Mungiu foge a esse julgamento das suas personagens ou das suas motivações.
Em vez dos ‘4 meses, 3 semanas e 2 dias’ Gabita mente e diz a Bebe (Vlad Ivanov num registo aterrorizador) que está grávida de dois meses, para que ele aceda a fazer-lhe um aborto (prática ilegalizada desde 1966). Bebe é um homem calmo e ameaçador e tem com as duas amigas uma agonizante negociação sobre o dinheiro e a pena de prisão a que poderia está sujeito. Aliás, em “4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias” tudo é negociado: os cigarros, um bilhete de autocarro, o preço de um quarto de hotel. É essa relação que define de que lado está o poder. Fazendo-as sentirem-se simultaneamente agradecidas e culpadas pela sua ajuda, Bebe usa aquele segredo como alavanca.
Em vez de facilmente seguir a personagem de Gabita, Mungiu privilegia Olivia. Segue-a até casa do namorado, Adi (Alexandru Potocean), onde tem lugar um jantar de família. No meio dos comentários divertidos, Otilia dissolve-se em silêncio com um olhar fixo do qual não nos conseguimos afastar. Nela lemos culpa, vergonha, humilhação e raiva.
Enquanto Gabita se reduz ao egoísmo do seu problema pessoal, para Otilia aquele momento modificou a sua forma de olhar para os outros: a sua amiga torna-se uma pessoa fraca, tonta e caprichosa, o seu namorado um ser superficial no qual não pode confiar. A interpretação de Anamaria Marinca é destemida e ser reservas, credível tanto na sua força como vulnerabilidade.
A fotografia de Oleg Mutu centrada em cinzentos cria um ambiente frio e cru. A câmara digital inquieta reforça a angústia das personagens, o espaço restrito reforça a claustrofobia de um sistema político castrador, os apontamentos de humor apenas aliviam a tensão e intensidade dramática. A explosão de violência pode ocorrer. A qualquer momento.