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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

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CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Perfume: The Story of a Murderer *****

15.11.06, Rita

Realização: Tom Tykwer. Elenco: Ben Wisham, Dustin Hoffman, Alan Rickman, Rachel Hurd-Wood, Karoline Herfurth, Sian Thomas, Sara Forestier, John Hurt (voz). Nacionalidade: EUA, 2006.





Era com imensa expectativa que aguardava a estreia deste filme. Optei por reler o livro homónimo de Patrick Sükind só depois de ver o filme. Achei que isso me permitiria ter uma experiência mas isenta, avaliando a obra de Tom Tykwer (“Lola, Rennt” - 1998, “Heaven” - 2002) apenas como uma peça de cinema e evitar uma comparação demasiado estanque. Mas ou a minha memória me atraiçoou demasiado, ou esta adaptação é, de facto, a melhor possível. E o melhor possível é bastante bom. Stanley Kubrick disse que não podia ser feito. Por muito que eu adore Kubrick, adoro também o facto de ele se ter enganado. E tenho pena de que não tenha vivido o suficiente para ver o quão cativante é este épico.


A Paris de 1738 está cheia de peixe putrefacto, ratazanas e esgotos abertos, um fedor nauseante. Jean-Baptiste Grenouille nasce debaixo de uma banca de peixe. Desde cedo ele percebe que o seu apuradíssimo olfacto está fora na normalidade (‘grenouille’ significa ‘rã’ em francês e Tykwer coloca uma cena onde o jovem Grenouille cheira um destes animais). Grenouille cresce num orfanato antes de ser vendido a um curtidor de peles, e vai absorvendo todos os cheiros que vai descobrindo, catalogando-os mentalmente apesar de não saber os seus nomes. Quando Grenouille (Ben Wisham) conhece o mestre perfumista Baldini (Dustin Hoffman) um novo mundo se abre diante dos seus olhos, ou melhor, do seu nariz. Acidentalmente, Grenouille é incontrolavelmente seduzido pelo cheiro de uma rapariga ruiva que vende ameixas (Karoline Herfurth). Depois de a matar acidentalmente, Grenouille fica obcecado por destilar aquele aroma e recuperar aquela beleza e criar o seu próprio perfume de 13 notas (o argumento introduz alguns elementos que se diferenciam do livro, mas que mantêm o seu espírito, este é um deles).


Alan Rickman é fortíssimo, Dustin Hoffman espirituoso e Ben Wisham impecável. Tendo participado em papéis secundários em “Enduring Love“ (2004) e “Layer Cake” (2004), o ano passado pudemos ver Wisham no papel de Keith Richards em “Stoned” de Stephen Woolley. Não sei porquê, quando li o livro lembro-me de ter imaginado Jean-Baptiste Grenouille mais velho do que Wisham. Mas, com efeito, na maior parte da acção, Jean-Baptiste está perto dos 30 anos. Apesar da sua beleza, Whisham consegue, através da sua interpretação cheia de maneirismos, ser “feio” de uma forma totalmente credível. Para a sua notável prestação, com reduzidos diálogos, o seu olhar, intenso, puro e sem regras, foi imprescindível. Na narração, a deliciosa voz de John Hurt incute um elemento algo místico a esta história.


O design de produção genial de Uli Hanisch enche cada cena de inúmeros detalhes, dando a impressão de uma quantidade enorme de odores que cercam Grenouille. A fotografia, nas mãos de Frank Griebe, colaborador de Tykwer em todos os seus filmes, é perfeita. Dadas as inevitáveis limitações do meio cinematográfico, os odores não poderiam ser mais bem transmitidos. Desde o recurso a inserções ou tornando o cheiro “visível” através de uma representação esfumada, até aos close-ups na extremidade nasal (serei a única pessoa a achar o imperfeito nariz de Ben Whisham delicioso?). Também a banda sonora, escrita por Tykwer, Reinhold Heil e Johnny Klimek, contribui para transmitir as sensações olfactivas, do mesmo modo que na edição de som (a cargo de Stefan Busch e Frank Kruse) se eliminou o ruído de fundo sempre que Grenouille perseguia um odor.


Tykwer tem uma noção ideal do ritmo e, com a montagem irrepreensível de Alexander Berner, “Perfume” não tem um único instante supérfluo. Tykwer preteriu a computorização a favor de soluções mais tradicionais, o uso de CGI limitou-se à reprodução da rua parisiense Pont au Chance onde se localiza a perfumaria de Baldini, e um momento em que o mesmo Baldini é levado, através de um aroma, a um jardim paradisíaco. Com todo o cuidado de pormenor e de fidelidade a uma obra de referência, apenas tenho um reparo à cena final, da qual esperava um pouco mais de, digamos, arrojo.


Foi, sobretudo, uma delícia regressar a este “mundo”. Grenouille é a personagem que seria muito fácil detestar. Mas Tykwer, que partilha a autoria do argumento com Andrew Birkin (“The Name of the Rose”) e Bernd Eichinger (“Der Untergang - A Queda”), consegue o mesmo que Süskind, isto é, que sintamos compaixão pelo perfeito anti-herói que é Grenouille, um homem com uma mente muito particulare, sem moral e sem alma, mas cujo sonho e sentido de missão não podemos deixar de admirar.


“Perfume” é totalmente abjecto, revoltante e nojento. Ou seja, perfeito.







P.S. 1 – Sim, já estou a reler o livro.


P.S. 2 – Ok, a inveja é feia, mas eu quero ser ruiva como a Rachel Hurd-Wood!




P.S. 3 – A equipa franco-alemã de perfumistas da International Flavors & Fragrances, Christophe Laudamiel e Christoph Hornetz, fizeram uma intepretação olfactiva da obra de Süskind, criando 15 essências com nomes tão sugestivos como Baby, Ermite, Human Existence e Orgie. O Perfume Coffret, de edição limitada, tem design de Thierry Mugler, e pode ser adquirido no seu site pela módica quantia de 550 euros.


























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