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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Stop Making Sense

21.08.06, Rita



Psycho Killer (4:24)
Heaven (3:41) *
Thank You for Sending Me an Angel (2:09) *
Found a Job (3:15) *
Slippery People (4:00)
Burning Down the House (4:06)
Life During Wartime (5:51)
Making Flippy Floppy (4:40) *
Swamp (4:30)
What a Day That Was (6:00)
This Must be the Place (Naive Melody) (4:57) *
Once in a Lifetime (5:25)
Genius of Love (Tom Tom Club) (4:30) *
Girlfriend is Better (5:06)
Take me to the River (5:32)
Crosseyed and Painless (6:11) *

* Previously unreleased




Provavelmente o melhor filme-concerto alguma vez filmado. A simplicidade do conceito inicial – o palco começa vazio, e constrói-se aos poucos à medida que vai entrando mais um elemento da banda – é genial, assim como os temas expostos. Além de inclassificável em géneros musicais, esta banda tem um carácter intemporal, e os seus temas que aparentam ser tão simples, são ao mesmo tempo brilhantes, e cada nova audição parece trazer-nos mais pormenores que nos escaparam anteriormente.


"Psycho Killer" abre o DVD, com David Byrne a sós num palco despido de quaisquer elementos cénicos, com uma guitarra acústica e um gravador de k7 a dar uma simples base rítmica. Esta é talvez a minha música favorita dos Talking Heads (e quanto a mim um dos melhores legados musicais dos anos 70), e esta interpretação, por ser tão simples e directa, parece que permite melhor ainda ver a genialidade da composição. É evidente que encaixa-se bem em Byrne o epíteto de outsider deslocado ("I can't seem to face up to the facts / I'm tense and nervous and I can't relax / I can't sleep 'cause my bed's on fire / Don't touch me I'm a real live wire."), principalmente considerando que esta música foi lançada em 1977, na altura (ou numa das alturas) dos excessos do rock. A esquizofrenia ("You start a conversation you can't even finish it / You're talking a lot but you're not saying anything / If I have nothing to say, my lips are sealed / Say something once, why say it again?") é também um elemento que não lhe fica mal. O final, quando Byrne começa como que a ser baleado ao ritmo de samplers, prepara-nos para o show de coreografia e cenografia que se vai seguir ao longo do DVD.


Para a entrada de Tina Weymouth (baixo), com a beleza simples de "Heaven", a frieza quase mecânica de David Byrne contrasta com o tom meloso do tema. Entretanto, começa a montar-se o estrado da bateria por detrás.


É com "Thank You for Sending Me an Angel" que surge Chris Frantz na bateria. Interessante o pormenor dele ter por hábito escutar um metrónomo por um auscultador, antes de começar a tocar os temas. É extraordinária a energia deste tema!


"Found a Job" traz ao palco Jerry Harrison (guitarra e teclados). Tão despido como o palco, este tema serve de base para que os assistentes de palco tragam os teclados e preparem a chegada dos músicos convidados nos coros, guitarra, percussões e teclados.


É então já a banda completa que, com "Slippery People", dá por encerrada a montagem do palco, já com uma tela negra em fundo. O ritmo é contagiante, o som é cru, são os Talking Heads!


"Burning Down the House" é (mais) um tema intemporal, que muitos músicos se sentiriam orgulhosos de ter escrito. Quem ouvir este tema e não bater o pé (no mínimo; eu normalmente acompanho-o com uns vigorosos acenos de cabeça), ou está morto, ou está surdo.


"Life During Wartime" continua a fazer com que o nosso corpo se mexa freneticamente (sim, ainda que estejamos refastelados no sofá a ver o DVD). Como diz David Byrne, "This ain't no party / This ain't no disco / This ain't no foolin' around / No time for dancing / or lovey dovey / I ain't got time for that now". Além das excêntricas danças, ainda nos presenteia com uma sessão de jogging no final, à volta do palco. E como bom professor, no final pergunta se alguém tem questões a colocar (!).


Onions / Video games / Air conditioned / Drugs / Deli / Public Library / Dog / Digital / Babies / Dustball ... Palavras que surgem em três painéis no fundo do palco, ilustrando as sonoridades de "Making Flippy Floppy". Funky, soul, pop, disco... tudo géneros que nos passam pelas ideias nestes momentos.


"Swamp" traz-nos um momento mais obscuro. É quase impossível agora negar a semelhança entre David Byrne e Anthony Perkins, apesar do olhar do primeiro ser, quanto a mim, bastante mais psicopático.


Mas, como quem não quer dar descanso a quem assiste, os Talking Heads entram de novo na máxima força com "What a Day That Was". Uma batida maníaca, que não nos deixa parar, e uma iluminação subtil, trazem ao filme-concerto mais um momento que lhe permite merecer o posto de "melhor filme-concerto de sempre".


"Naive Melody (This Must be the Place)" traz-nos mais elementos cénicos simples e conceptualmente brilhantes. A dança de David Byrne com o candeeiro merece estar ao lado de momentos cinematográficos como Gene Kelly em “Singing in the Rain” ou Kim Basinger e Mickey Rourke em “Nove Semanas e Meia”.


Com "Once in a Lifetime", chega mais um genial momento da banda. As pressões e expectativas sociais do dia-a-dia, que conduzem à alienação, e o consequente alheamento dos nossos desejos individuais: ]"And you may find yourself living in a shotgun shack / And you may find yourself in another part of the world / And you may find yourself behind the wheel of a large automobile / And you may find yourself in a beautiful house, with a beautiful wife / And you may ask yourself-well... how did I get here?".


"Genius of Love" é o momento em que Tina Weymouth e Chris Frantz apresentam o seu projecto Tom Tom Club. Permite ver que David Byrne não é o único freak da banda.


É com "Girlfriend is Better" que Byrne nos traz o seu famoso "big suit" (ver a capa do DVD), um elemento evidentemente criado por si próprio, perfeitamente adequado ao seu estilo de humor, oblíquo, subtil, bizarro, maníaco. É genial o momento em que David Byrne aponta o microfone a um técnico de iluminação e ele canta, com aparente indiferença, "Stop making sense", e logo em seguida aponta-o para a câmara, olhando para nós com um ar convidativo.


"Take me to the River" é uma cover de Al Green, muito bem adaptada ao ritmo dos Talking Heads. Aproveitada também para apresentação da banda e o fecho do concerto.


"Crosseyed and Painless", em tom de encore, traz mais um momento frenético duma banda que ao vivo, e num só tema, consegue colocar elementos de pop, funk, soul, ritmos africanos, disco, rock, e tudo fazer sentido, quase que nos fazendo perguntar o porquê de semelhantes compartimentações, quando no fundo música é apenas isso: música.


O filme-concerto é dirigido por Jonathan Demme (realizador de “Philadelphia” e “O Silêncio dos Inocentes”), mas arrisco em dizer que o mérito visual está praticamente todo do lado da concepção cénica e cenográfica, a cargo de David Byrne.


Resta-me dizer que é um filme-concerto obrigatório para os amantes de música de todos os géneros. Porquê? Bem, porque... Bah! Stop making sense! ;)



por Luís