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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Brokeback Mountain ****

15.02.06, Rita

Realização: Ang Lee. Elenco: Heath Ledger, Jake Gyllenhaal, Michelle Williams, Anne Hathaway, Randy Quaid. Nacionalidade: EUA, 2005.





Este filme é uma experiência emocional e, como todas elas, dolorosa. A polémica em redor da temática homossexual é, a meu ver, completamente secundária e só serve para distrair do verdadeiro tema de “Brokeback Mountain”: de como o amor pode ser simultaneamente belo e destruidor.


Wyoming, EUA. Verão de 1963. Ennis Del Mar (Heath Ledger) e Jack Twist (Jake Gyllenhaal) são contratados pelo rancheiro Joe Aguirre (Randy Quaid) para guardarem a suas ovelhas na Brokeback Mountain. O extrovertido Jack fica designado para dormir com os animas no alto da montanha, enquanto o pacato e taciturno Ennis (ajudado por um forte sotaque) fica encarregue do acampamento no vale. Durante estas semanas de isolamento a camaradagem cresce entre ambos. Até uma noite fria, regada com whisky, onde a partilha da tenda acorda uma atracção que já se insinuava.


Este encontro é marcado pela agressividade, que deriva sobretudo da negação do desejo e do sentimento. E Ang Lee filma tudo isto de uma forma tão honesta e real que somos levados de imediato para a espiral de inquietude de ambas as personagens.

No final desse Verão, a separação conduz Ennis para os braços da sua noiva Alma (Michelle Williams) e Jack de volta aos rodeios, para mais tarde também ele casar com Lureen Newsome (Anne Hathaway). A experiência dos sentimentos daquele Verão abala por completo a sua identidade, da negação à confrontação, e, anos mais tarde, o reencontro irá conduzi-los a uma vida dupla. Apenas Jack conseguirá de alguma forma aceitar este amor. Para Ennis esta será uma penosa luta. O segredo que partilham tem capacidade para destruir as suas vidas, as suas famílias e finalmente eles próprios.


Uma bem escrita adaptação do conto de Annie Proulx por Larry McMurtry e Diana Ossana, numa abordagem profunda, realizada com grande sensibilidade, e muito bem interpretada por dois grandes jovens actores, que capturam na perfeição as hesitações e estranhezas da sua situação, ainda que Heath Ledger seja quem de facto se destaca. As secundárias Michelle Williams e Anne Hathaway também não ficam atrás e, especialmente a primeira, tem momentos verdadeiramente intensos.


Tanto Ennis como Jack parecem deslocados dentro da sua própria pele, sofridos, e cheios de incertezas, em que o fatalismo de um contrasta grandemente com o optimismo e persistência do outro. Mas essas barreiras pessoais, tal como as externas, em vez de enfraquecerem o sentimento fortalecem-no. Mas, inevitavelmente, a insatisfação acaba por se acumular de uma forma dolorosa. Porque apesar dos breves momentos que passam juntos nenhum dos dois é verdadeiramente feliz. Simplesmente porque o amor em pequenas doses acaba por se tornar isso mesmo: pequeno.


Ang Lee filma com a calma necessária para que a história e as personagens se desenvolvam de uma forma credível. Sem chocar, não abdica nunca da veracidade e mostra o que tem de mostrar. Ang Lee não faz concessões, e não sufoca as suas personagens em camadas de insinuações. A vestir o filme está a música de Gustavo Santaoalla, e a dar-lhe forma a elegante fotografia de Rodrigo Prieto, especialmente nos exteriores.


A grande falha de “Brokeback Mountain” é a gestão de tempo. As elipses temporais pouco claras tornam complicado seguir o passar do tempo, sem ter de ser preciso olhar para as filhas de Ennis e ver que idade têm ou para os pêlos grisalhos nas patilhas de Jack. E “Brokeback Mountain” deveria ter terminado com o fechar do ciclo na própria Brokeback Mountain, uma cena antes do final.


Apesar disso, Ang Lee consegue aqui um filme comovente e trágico sobre a angústia de um amor que fica por viver. Um filme onde todos fogem ao confronto, com a verdade, com os sentimentos, com a infidelidade, com a sexualidade. Lee entende a importância do silêncio entre os dois homens, e filma-os com contenção e intimidade. Um filme também corajoso, sobretudo por ser feito no e sobre os Estados Unidos, um país preso num fervor religioso, onde está na moda odiar e descriminar.


Um aviso para os que insistem em resistir a este filme, devido a qualquer rótulo que lhe tenham colocado: o prejuízo é vosso.






CITAÇÕES:


“It could be like this, just like this, always.”
JAKE GYLLENHAAL (Jack Twist)

“There ain't never enough time, never enough...”
JAKE GYLLENHAAL (Jack Twist)

“Swear I didn't know we were gonna get into this again. Hell, yes I did, redlined it all the way, couldn't get here fast enough.”
JAKE GYLLENHAAL (Jack Twist)

“Tell you what. The truth is... sometimes I miss you so much I can hardly stand it.”
JAKE GYLLENHAAL (Jack Twist)

“I wish I knew how to quit you.”
JAKE GYLLENHAAL (Jack Twist)

“He was a friend of mine
He was a friend of mine
Every time I think about him now
Lord I just can't keep from cryin'
'Cause he was a friend of mine”
BOB DYLAN