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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Crimen Ferpecto ***

31.05.05, Rita

Realização: Álex de la Iglesia. Elenco: Guillermo Toledo, Mónica Cervera, Luis Varela, Fernando Tejero, Kira Miró, Enrique Villén, Javier Gutiérrez. Nacionalidade: Espanha / Itália, 2004.





Antes de mais convém referir que “Crimen Ferpecto” não se trata de um erro ortográfico. Numa alusão deturpada ao filme de Hitchcock “Dial M for Murder” (1954) (intitulado “Crimen Perfecto” em Espanha e “Chamada Para A Morte” em Portugal), Álex de la Iglesia faz aqui uma homenagem ao thriller psicológico, desconstruindo-o com mais uma viagem alucinada de personagens levados, por outros, ao extremo da loucura. Pisca também o olho a Goscinny, na expressão ‘Ferpeito!’ usada abundantemente pelo ébrio Obelix em “Asterix - Os Louros de César”.

Rafael (Toledo) é sedutor e ambicioso. Gosta de mulheres bonitas (definitivamente La Palice!), de roupa elegante e de todos os sinais de status social elevado. Trabalha na secção de Senhora de uns grandes armazéns, onde disputa com um colega da secção de Homem, Don Antonio (Varela) a promoção ao posto de director de piso. Após uma acesa e física discussão, Don Antonio morre acidentalmente.


Mas existe uma testemunha: Lourdes (Cervera), uma feia empregada, obcecada por Rafael e que não hesita em chantageá-lo para que seja seu amante, e, mais tarde, seu marido. Rafael, capaz de tudo para conseguir o que quer, é confrontado com uma versão ainda pior de si próprio. Desesperado ao ver o seu mundo sofisticado cair vertiginosamente na vulgaridade que sempre abominou, Rafael traça um plano para se livrar de Lourdes.


Um humor negro impregna esta crítica social à obsessão pela imagem e pelo consumo desenfreado como forma de suprir as necessidades emocionais cada vez mais profundas. De la Iglesia volta a contar com a colaboração de Jorge Guerricaechevarría no argumento, fazendo uso do tom cómico e bizarro que costuma caracterizar as suas obras (“Perdita Durango” – 1997, “La Comunidad” – 2000), para mostrar a podridão que muitas vezes se esconde atrás das belas aparências.


O cenário de “Crimen Ferpecto” foram uns armazéns de Sevilha, que tinham fechado dois anos antes. As lojas são, por excelência, onde se vende e se compra essa aparência, e onde a perfeição tem muito pouco a ver com a realidade. E é inevitável reportamo-nos ao maravilhoso mundo do El Corte Inglés, com as suas semanas fantásticas que duram 15 dias. A televisão, na sua gula pela privacidade, também não é esquecida.


A opção de De la Iglesia pelo pormenor do fantasma de Don Antonio surge sem grande sentido, ainda para mais se acrescentarmos o facto de os seus conselhos serem dirigidos a um suposto inimigo. Existem também incongruências na fase final do filme, além da poética moralidade, que são consideravelmente difíceis de engolir e nos deixam desconsolados face à premissa original.


Apesar de tudo, vale a pena pelas soberbas interpretações de Toledo e Cervera. E pela visão mordaz sobre o elemento de “consumismo” que existe nos relacionamentos.






CITAÇÕES:


“Me considero un tipo atractivo, con clase. Mi máxima ambición es disfrutar de una vida acorde con mis gustos. Prefiero MORIR a conformarme con una existencia mediocre. Sé la casa que quiero, sé el coche que quiero, incluso podría decirles dónde está y lo que cuesta. No tener nada es mejor que estar rodeado de objetos vulgares. Soy una persona elegante que sólo pretende vivir en un mundo elegante. ¿Es eso pedir demasiado?”
GUILLERMO TOLEDO (Rafael)

“Me gustan los personajes envidiosos, codiciosos. La gente que parece buena, pero no lo es. Los que hacen una putada y les sale mal. El miserable encantador, el perdedor divertido. Como Pierre Nodoyuna, el piloto que siempre llegaba el último en los dibujos animados de 'Los Autos Locos'. Les tengo cariño. No puedo evitarlo. Entiendo sus frustraciones. Comparto su empeño por cambiar las cosas. Quisiera que, aunque sólo fuera por una vez, se saliesen con la suya... Pero me divierten más sus repetidos fracasos. Nada sale bien porque es imposible que la realidad se acomode a nuestros deseos. Nada es perfecto y el que así lo cree, miente.”
ÁLEX DE LA IGLESIA