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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

De Tanto Bater o Meu Coração Parou ****

06.09.05, Rita

T.O.: De battre mon coeur s'est arrêté. Realização: Jacques Audiard. Elenco: Romain Duris, Niels Arestrup, Jonathan Zaccaï, Gilles Cohen, Linh Dan Pham, Aure Atika, Emmanuelle Devos, Anton Yakovlev, Mélanie Laurent. Nacionalidade: França, 2005.





O realizador de “Sur Mes Lèvres” (2001), numa “vingança” pelos remakes americanos de filmes franceses, regressa com este remake do filme “Fingers” (1978), de James Toback com Harvey Keitel no papel agora desempenhado por Romain Duris (“L’Auberge Espagnol”, Cédric Klapisch, 2002).


Thomas Seyr (Duris) segue as pisadas do pai (Niels Arestrup) no negócio imobiliário, onde a sua tarefa é forçar os indesejáveis para fora das suas casas, por todos os meios possíveis (colocando ratos, cortando a electricidade e a água, e ocasionalmente partindo tudo), para depois as comprarem por um preço baixo para os seus clientes. Adicionalmente, Tom faz também algumas cobranças difíceis para o seu pai, geralmente recorrendo a argumentos violentos.


Um encontro com o antigo agente da sua mãe, Mr. Fox (Sandy Whitelaw), que o convida para uma audição, desperta em Tom a vontade de recuperar o tempo perdido e regressar ao piano. Mas, para isso, ele vai necessitar de treino e acaba por contratar Miao Lin (Linh Dan Pham), uma pianista chinesa recém-chegada a Paris que não fala uma palavra de francês.


Audiard coloca-nos a meio da narrativa, onde temos que decifrar quem é quem, o que fazem e porquê. Com o esclarecimento, somos obrigados a reavaliar a primeira impressão que temos de Tom e acompanhamos com vontade a sua evolução.


Tom vive num dilema, bastante próximo do colocado às crianças sobre gostarem mais do pai ou da mãe: divide-se entre a responsabilidade de corresponder às expectativas do pai, que aproveita qualquer ocasião para uma chantagem emocional, e a paixão pela música herdada da mãe, uma talentosa pianista já falecida que, como um fantasma ausente, impele Tom para a concretização de um sonho.


Duris tem uma interpretação poderosa, que consegue ser sedutora e repelente em diferentes momentos, mas com igual intensidade: de raiva, arrogância, ressentimento, vingança, intimidade, vulnerabilidade, sensibilidade, e até a generosidade com que cobre as mentiras adúlteras de um colega.


Tom é um anti-herói, uma bomba prestes a explodir, uma questionável moral, que não hesita recorrer à violência, mas também capaz de ternura. Audiard e Duris fazem um retrato complexo de uma personagem num contexto dinâmico e absorvente, sem nunca perder a consistência e credibilidade, dividido entre a expressão da arte e contenção da violência. E gostamos dele, com falhas e tudo.


A beleza deste filme não se resume ao título (do original “De battre mon coeur s'est arrêté”, passando pelo “De tanto bater o meu coração parou” português, até ao “The beat that my heart skipped” inglês). Os batimentos desta narrativa são compassados, a tensão ritmada e a música, entre sístoles e diástoles, enleante.