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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

She Hate Me **

30.09.05, Rita

Realização: Spike Lee. Elenco: Anthony Mackie, Kerry Washington, Dania Ramirez, Ellen Barkin, Woody Harrelson, Monica Bellucci, John Turturro, Jim Brown, Ossie Davis, Jamel Debbouze, Brian Dennehy, Ling Bai, Lonette McKee, Paula Jai Parker, Q-Tip. Nacionalidade: EUA, 2004.





No final do genérico feito à base de dólares esvoaçantes de “She Hate Me”, surge uma nota de 3 dólares com a cara de George W. Bush e um selo da Enron. Lee lança assim o mote da fraude financeira, deixando-nos a pensar quem será “She”.


Jack (Anthony Mackie) é vice-presidente da empresa Progeia, uma empresa farmacêutica que está prestes a lançar no mercado uma vacina contra a SIDA. O suicídio de um colega leva-o a descobrir a fraude financeira que decorre na empresa. A sua ética leva-o a denunciá-la. As represálias levam ao seu despedimento, à sua utilização como bode expiatório, ao congelamento da sua conta bancária e da sua vida profissional na cidade de Nova Iorque.


A par desta tragédia surge a inacreditável situação da ex-namorada de Jack, Fatima (Kerry Washington), que aparece com a sua namorada Alex (Dania Ramirez), propondo em conjunto a Jack que ele as engravide para que elas possam partilhar, simultaneamente, o prazer da maternidade. Pela bonita soma de 10.000 dólares por cabeça, e abdicando de quaisquer obrigações paternais, Jack inicia uma carreira como fecundador de lésbicas.


Das duas histórias de “She Hate Me” só a primeira se aproveita. Lee critica (ou pelo menos sugere uma crítica) as hipocrisias da cultura empresarial, a ausência de moral na religião do dinheiro e a sede de sangue da indústria de entretenimento.


Mas Lee preferiu negligenciar isso a favor da livre iniciativa de Jack no campo pessoal, e da sua contabilidade no grande mercado das lésbicas. Melhor dizendo, da sua fantasia masculina de colocar um homem no meio de lésbicas, que estranhamente têm um imenso prazer em estar com um homem (Lee confunde – propositadamente??? – homossexualidade com bissexualidade), fazendo sexo sem protecção (só a ele são exigidos testes de saúde, a elas não!), e não tendo que assumir quaisquer responsabilidades por isso.


O eventual propósito de Lee em abordar diferentes formas de amor e estrutura familiar é completamente frustrado por todos os estereótipos relativamente à homossexualidade feminina. Saberá ele que o método de reprodução preferido das lésbicas é a inseminação artificial? Mas quem quer ver isso em cinema?


Lee tenta redimir Jack, transformando-o de um garanhão reprodutor numa pessoa sensível e preocupada com os que o rodeiam, mas chega-nos tudo com a mesma falsidade com que os patrões de Jack negam quaisquer crimes.


Como pontos positivos estão as interpretações e o trabalho de fotografia de Matthew Libatique, utilizando diferentes cores para ilustrar os dois mundos onde Jack se move, o profissional, em tons frios e claros, e o pessoal, com tonalidades quentes e escuras.


Esperava-se muito mais de alguém que deveria compreender melhor os efeitos nocivos da propagação de estereótipos, e que se entregou de forma tão dedicada a erradicar os estereótipos dos afro-americanos. É triste que Lee não consiga estender essa dedicação à eliminação dos estereótipos de lésbicas também elas afro-americanas.


Felizmente, é tudo tão pouco credível que o mal causado não é grande. E já sabem, uma relação lésbica é bastante saudável desde que tenha um homem lá no meio!


Fiquei a pensar que talvez o “She” do “She Hate Me” pudesse ser a audiência... Spike Lee no seu pior.






CITAÇÕES:


“We are a family, and family protects its own.” ELLEN BARKIN (Margo Chadwick)