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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

La Soledad ***1/2

17.09.08, Rita

Realização: Jaime Rosales. Elenco: Sonia Almarcha, Petra Martínez, Miriam Correa, Nuria Mencía, María Bazán, Jesús Cracio, Lluís Villanueva, Luis Bermejo, Juan Margallo, José Luis Torrijo, Carmen Gutiérrez. Nacionalidade: Espanha, 2007.





Adela (Sonia Almarcha) está separada do pai do seu filho de um ano, e decide deixar a aldeia onde vive rumo a Madrid. Antonia (Petra Martínez) tenta mediar os conflitos entre as suas três filhas adultas: Helena (María Bazán), que lhe pede dinheiro para comprar um apartamento na praia; Nieves (Nuria Mencía), a quem foi detactado um cancro; e Inés (Miriam Correa), que acaba por alugar um quarto do apartamento onde vive a Adela.


A composição rígida de Jaime Rosales serve um claro propósito nesta meditação sobre a solidão e a ilha que é cada ser humano, numa eterna e vã tentativa de se ligar aos outros. Formalmente, Rosales optou por dividir o ecrã em duas metades, numa técnica denominada ‘polivisão’, na qual duas câmaras fixas acompanham uma mesma cena mas de um ângulo distinto. Mesmo quando isso não acontece, as cenas estão marcadas por elementos verticais que deliberadamente as cortam.


Ao moverem-se entre cada uma destas metades, as personagens abandonam um espaço para entrar noutro, e Rosales continua a mostrar-nos o espaço vazio, aquele exacto espaço que fica quando as pessoas se vão. Da mesma forma que um espaço anteriormente vazio retoma o seu sentido quando alguém entra nele. É inevitável fazer-se uma leitura emocional deste processo, que tem tanto de escolha deliberada como de arbitrário.


É também o elemento arbitrário que vem perturbar a rotina com a qual Rosales nos anestesiou durante a primeira metade do filme. E sim, pelo seu compasso lento, “La Soledad” exige empenho por parte do espectador. É curioso depois observar como a única forma de lidar com a tragédia é descobrir uma nova rotina, a tranquilidade dos gestos e das palavras do dia-a-dia.


Rosales joga com as regras da ficção e do documentário para nos dar algo que se confunde entre um e outro. O nosso olhar curioso é posto do lado de fora de janelas e portas, porque nós não pertencemos ao mundo que eles nos está a mostrar, porque ali, tal como na vida, os grandes acontecimentos são vividos na intimidade. E, por isso, consegue ser tão constrangedor assistir à agressividade que emana de conversas educadas que camuflam rancores e acusações.


O elenco não tem nomes sonantes, e “La Soledad” acaba por beneficiar exactamente desse facto. Não que as interpretações não sejam suficientemente fortes para as tomarmos por reais, porque são, mas porque onde poderíamos vislumbrar a entidade ‘actor’, apenas vemos pessoas.


Para adicionar ainda mais crueza, a banda sonora é inexistente. Os ruídos são apenas (apenas?) os da cidade. Mas o maior barulho, esse, é feito pelos silêncios.