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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

El Séptimo Día ****

26.10.05, Rita

Realização: Carlos Saura. Elenco: Juan Diego, José Luis Gómez, José Garcia, Victoria Abril, Yohana Cobo, Eulalia Ramón, Ramon Fontserè, Carlos Hipólito, Oriol Vila, Ana Wagener, Juan Sanz, Elia Galera, Carlos Caniowski, Antonio de la Torre, Joaquín Notario. Nacionalidade: Espanha, 2004.





Numa pequena aldeia do interior de Espanha, duas famílias, os Jiménez e os Fuentes, arrastam uma história violenta, de disputa por terras, ciúmes, inveja, e sangue, muito sangue. O que começou nos anos 60 como uma história de amor, entre Amadeo Jiménez y Luciana Fuentes (Victoria Abril), transformou-se, até aos anos 90, num escalar de rancores e vingança.


Amadeo largou Luciana, quando esta tinha já o enxoval preparado para o casamento. O coração partido e o orgulho conduziram à morte de Amadeo às mãos de Jerónimo Fuentes (Ramon Fontserè). Em resposta, a casa dos Fuentes foi incendiada, supostamente, mas sem provas, pelo irmão de Amadeo, José Jiménez (José Garcia, “Le Couperet”). Com Jerónimo preso, a família Fuentes foi obrigada a afastar-se da aldeia, indo viver para fora dos seus limites. Mas a promessa de regressar foi selada.


Esta história é narrada por Isabel Jiménez (Yohana Cobo), filha de José, que, aos 15 anos, decidida a descobrir a semente do ódio que quase a tornou órfã, começa a desenterrar a rivalidade e o rancor que ameaça o futuro da sua família.


Apesar de relacionado com um mundo consideravelmente diferente daquele em que a maioria de nós julga viver, esta lógica de honra familiar não é assim tão estranha. Veja-se o exemplo das máfias e da cultura de gangs que proliferam nas urbes desenvolvidas. Numa aldeia pequena, onde toda a gente sabe a vida de todos, e onde os segredos raramente conseguem ser guardados durante muito tempo, qualquer vergonha rapidamente se torna pública, afectando toda uma vida e toda uma família, geração após geração.


Ray Loriga constrói um argumento sóbrio, que evolui num crescendo de tensão, e onde cada momento feliz é já impregnado da tragédia iminente. As personagens são elaboradas com grande detalhe, sem que a história se fixe necessariamente nelas, mas sobretudo através da forma como se relacionam entre si e do que se lê, muitas vezes no meio de silêncios perturbadores, em representações de grande qualidade.


Como fotógrafo, Carlos Saura torna a paisagem uma parte integrante do filme, um elemento de grande relevância na definição do estado de espírito dos habitantes e do seu isolamento. Mas o grande trunfo de Saura é ter tido sob as suas (boas) ordens um elenco de uma força incrível. Começando na dupla Juan Diego (Antonio) e José Luis Gómez (Emílio); o primeiro, o cérebro vingativo, o segundo, duvidando, mas sem conseguir pensar claramente, do absurdo que lhe ditam os irmãos; e um especial destaque para Victoria Abril (Luciana), a verdadeira instigadora dos crimes, parada no tempo, agarrada ao seu eterno vestido de noiva, símbolo do amor como génese do ódio, do medo como origem da violência.


“El Séptimo Día”, o tal em que Deus descansa, já seria perturbante de per si. Mas o verdadeiro soco no estômago é sabermos que se baseia de perto num acontecimento real, ocorrido em Puerto Urraco, uma aldeia de 120 habitantes na Extremadura espanhola, a 26 de Agosto de 1990. Os verdadeiros protagonistas foram os Izquierdo (Fuentes) e os Cabanillas (Jiménez). A decisão judicial apontou como causa uma luta por terras que desde sempre tinham sido disputadas pelas duas famílias.


Não é assim que começam todas as guerras?





CITAÇÕES:


“Dicen que Dios creo el mundo en 6 días. Por eso muchas cosas terribles pasan el domingo. Mientras Dios duerme.”