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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Primeiras vezes

30.01.06, Rita



Ontem, pela primeira vez, vi na bilheteira de um cinema (Alvaláxia) perguntarem a idade a dois jovens que queriam assistir a um filme. Seguido de um "peço desculpa mas não lhes posso vender os bilhetes porque o filme é para maiores de 16". Acrescentado de "não é costume fazermos isto, mas com este filme estamos a ter muito cuidado". E de "mas podem escolher qualquer outro filme em cartaz".


Confesso que fiquei espantada. Quase tanto como com a neve que caiu em Lisboa.


Ah, o filme era o "Saw II".




Gabrielle **

28.01.06, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Patrice Chéreau. Elenco: Isabelle Huppert, Pascal Greggory, Claudia Coli, Thierry Hancisse, Chantal Neuwirth. Nacionalidade: Alemanha / França / Itália, 2005.


SRC=http://a69.g.akamai.net/n/69/10688/v1/img5.allocine.fr/acmedia/medias/nmedia/18/35/98/50/18441578.jpg WIDTH=500>


ALIGN=JUSTIFY>Eu gostei muito de “Intimité” (2001) e de “Son frère” (2003) e queria muito ter gostado de “Gabrielle”. Mas não consegui. Patrice Chéreau conseguiu fazer aqui um filme aborrecidíssimo, apesar de existirem algumas boas ideias.

ALIGN=JUSTIFY>1912. Jean Hervey (Pascal Greggory) e Gabrielle Hervey (Isabelle Huppert), casados há 10 anos, são os perfeitos anfitriões das noites da burguesia parisiense, organizando todas as quintas-feiras uma festa que reúne bem-pensantes e bem-falantes, numa competição acérrima com as melhores reuniões de sociedade.

ALIGN=JUSTIFY>Um dia, como todos, Jean regressa a casa depois de um dia de trabalho. A sua confortável rotina é perturbada pela carta deixada por Gabrielle anunciando-lhe que o abandona. Passadas umas horas, Gabrielle regressa a casa, e é este regresso (mais que o abandono) que provoca um verdadeiro cataclismo na vida do casal.

ALIGN=JUSTIFY>Com a adaptação do romance “O Regresso” de Joseph Conrad, Chéreau convida-nos a assistir à derrocada de um casal, a uma tentativa desesperada de voltar atrás e reconstruir. Uma relação que nunca foi de amor torna-se uma luta de recriminações onde se esmiúça a traição. Pela primeira vez, os sentimentos são despertados, e Jean e Gabrielle dão-se conta de que nunca se conheceram verdadeiramente. E mesmo agora, que falam um com outro, falam, sobretudo, de si mesmos.

ALIGN=JUSTIFY>Chéreau opta pelo teatral, por sombras verdes e luzes amarelas, por um ritmo que nos cansa. O uso estilístico do preto e branco, que parece de início remeter para momentos mais introspectivos de Jean, rapidamente se torna arbitrário. Os momentos dramáticos mais fluidos do filme são interrompidos por frases em letras garrafais, à moda do cinema mudo. “Gabrielle” é tão de época que dificilmente conseguimos uma leitura universal com a qual nos possamos identificar e envolver. Não se percebe a utilidade do papel da empregada Yvonne (Claudia Coli) e o excesso musical ao longo de todo o filme é verdadeiramente irritante.

ALIGN=JUSTIFY>Os próprios diálogos oscilam entre o cliché que é Jean (“Eu amava-a como um coleccionador ama uma bela escultura.”) e a forçada modernidade de Gabrielle (“A ideia do teu esperma dentro de mim é insuportável.”). Porque a sua vergonha não é a de ter fugido, mas a de ter regressado, de lhe ter faltado coragem para viver um amor que exigiria demasiado dela.

ALIGN=JUSTIFY>E todos estes problemas prejudicam a interpretação de dois bons actores. Isabelle Huppert é fria, impenetrável e frágil, mas Gabrielle tem problemas tão interiorizados que não conseguimos entendê-los. Do choque à negação, a quebra da identidade de Jean é claramente mostrada por Pascal Greggory.

ALIGN=JUSTIFY>Mas, pelo lado positivo, há três cenas que se destacam. O contraste entre a belíssima cena inicial, em que Jean regressa a casa, falando e olhando de frente para a câmara, e a final, em que ele se afasta em silêncio e apenas vemos as suas costas. E ainda a exímia filmagem da conversa entre os convidados na primeira festa, onde a câmara dança de um para outro, como se de um baile se tratasse.

ALIGN=JUSTIFY>É por esta capacidade de Chéreau de apanhar significados em pequenos detalhes, que custa tanto que o conjunto deste trabalho seja tão fraco. “Gabrielle” aflora um (des)equilíbrio, cruel e violento, entre verdades e mentiras, silêncio e palavras, onde se questiona se a coragem reside em permanecer ou fugir. Mas é só uma sombra do que poderia ter sido.


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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “Se tivesse sabido que me amava, não teria regressado...”
ISABELLE HUPPERT (Gabrielle)


ALIGN=JUSTIFY> “Não temos intimidade, mas também não precisamos.”
PASCAL GREGGORY (Jean)










Where the Truth Lies ***

25.01.06, Rita

ALIGN=JUSTIFY> Realização: Atom Egoyan. Elenco: Kevin Bacon, Colin Firth, Alison Lohman, David Hayman, Rachel Blanchard, Sonja Bennett. Nacionalidade: Canadá / Reino Unido / EUA, 2005.


SRC=http://us.movies1.yimg.com/movies.yahoo.com/images/hv/photo/movie_pix/thinkfilm/where_the_truth_lies/_group_photos/kevin_bacon1.jpg>


ALIGN=JUSTIFY>1972. Alison Lohman (“Big Fish”) é Karen O'Connor, uma jovem jornalista que está a escrever um livro sobre o misterioso caso de uma mulher, Maureen O'Flaherty (Rachel Blanchard), encontrada morta no quarto de hotel de um duo de famosos cómicos dos anos 50, Lanny Morris (Kevin Bacon) e Vince Collins (Colin Firth). Tentando discernir entre a versão oficial e os acontecimentos reais, Karen decide falar com os dois, acabando por ser seduzida por ambos, ainda que de forma distinta. Tanto Lanny como Vince têm as suas razões para manter a verdade escondida, o que apenas aumenta a determinação de Karen.

ALIGN=JUSTIFY>Surge uma comparação inevitável com a separação de Dean Martin e Jerry Lewis, sem o crime, claro. Adicione-se sexo, drogas, engano, traição, culpa, e uns quantos segredos e tem-se a receita de “Where the Truth Lies”. Um filme em que o crime funciona como metáfora à morte de uma amizade, uma relação complicada entre adoração e ciúme, alimentada por um fornecimento inesgotável de bebida, droga e mulheres.

ALIGN=JUSTIFY>Os anos 50 (mais do que os 70) são recriados com alguma mística, mas teria sido necessária uma maior atenção neste ponto, uma vez que o ambiente é de uma importância vital para transpor o espectador para dentro da acção.

ALIGN=JUSTIFY>A personagem de Lohman, ao contrário de Lanny e Vince, não é particularmente interessante, a sua suposta ambição contrasta grandemente com as suas atitudes crédulas e com a sua inocência. Mas Egoyan deu menos espaço a Lanny e a Vince do que deveria, duas personagens complexas, cheias de defeitos, mas que, apesar de tudo, mantêm um aspecto humano inegável. Além disso, preferiu centrar-se nos seus aspectos individuais, em detrimento da química como duo. Apesar de tudo, tanto Kevin Bacon como Colin Firth têm duas brilhantes interpretações.

ALIGN=JUSTIFY>Atom Egoyan optou por filmar esta história com constantes saltos temporais, que adicionam uma dose de caos a um film noir que já de si seria algo confuso mesmo se fosse contado linearmente. Ainda assim, os twists dramáticos e as dinâmicas de poder que se alteram ao longo da história conseguem levar-nos mesmo para além do momento em que o ritmo abranda.

ALIGN=JUSTIFY>Se esquecermos alguns atalhos que desafiam a credulidade do espectador, estamos perante um filme de grande sensualidade, com uma história interessante, com um bom título (“Onde reside a verdade” ou “Onde a verdade mente”?) e com dois grandes actores que, em última instância, são quem tira este filme da categoria trivial.






Orgulho e Preconceito ***

24.01.06, Rita

ALIGN=JUSTIFY>T.O.: Pride & Prejudice. Realização: Joe Wright. Elenco: Keira Knightley, Matthew Macfadyen, Donald Sutherland, Brenda Blethyn, Judi Dench, Simon Woods, Kelly Reilly, Rosamund Pike, Talulah Riley, Jena Malone, Carey Mulligan, Tom Hollander. Nacionalidade: França / EUA / Reino Unido, 2005.


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ALIGN=JUSTIFY> COLOR=#AAAAAA>COMÉDIA ROMÂNTICA - def. duas pessoas, obviamente atraídas uma pela outra são mantidas separadas por uma série de contratempos durante umas duas horas, para que no final as barreiras entre eles se desmanchem e terminem nos braços um do outro.


ALIGN=JUSTIFY>Indo à fonte de todas as comédias românticas, o livro “Orgulho e Preconceito” de Jane Austen, Joe Wright (na sua primeira longa-metragem) vem provar que quando ela é tratada, ainda que não com total fidelidade, mas pelo menos com respeito essa pode ser uma boa aposta. Com efeito, esta adaptação do livro de 1813, é uma boa peça de entretenimento, bem representada, bem realizada e bem produzida.

ALIGN=JUSTIFY>Na sua essência, este filme fala desse desporto milenar que é a “caça de marido”. Pelo meio faz um agudo comentário social ao sistema de classes prevalecente na Inglaterra do final do século XVIII. A família Bennet não detém uma posição relevante na hierarquia social e está quase sem dinheiro. A sua única esperança é casar as cinco filhas com maridos ricos. Elizabeth Bennet (Keira Knightley) é demasiado orgulhosa para aceitar o sistema sem o questionar, criticando a hipocrisia da sociedade com comentários sarcásticos e muita condescendência. E quando o rico Mr. Bingley (Simon Woods) parte o coração à sua irmã Jane (uma radiante Rosamund Pike), Elizabeth não duvida em culpar o rico e arrogante Mr. Darcy (Matthew Macfadyen), por quem ela sente igualmente uma (contrariada) atracção, que terá de se debater com uma série de mal-entendidos.

ALIGN=JUSTIFY>O argumento de Deborah Moggach (limado por uma não creditada Emma Thompson) mantém-se fiel ao espírito da época, e o design de produção de Sarah Greenwood, aliado a uma belíssima fotografia de Roman Osin, são essenciais para este êxito. Os actores principais são competentes, sobretudo no lado mais agressivo das suas personagens, Keira Knightley adopta na perfeição todos os trejeitos clássicos da mística de Jane Austen, entre a audácia e melancolia. Mas a memória foge facilmente para Kelly Reilly, como a super-protectora irmã de Mr. Bingley, e Tom Hollander, hilariante como Mr.Collins. Brenda Blethyn dá o seu contributo como a mãe stressada da família Bennet, atingido os píncaros da irritação, e Judi Dench como uma desprezível pedante, enche, como sempre, o ecrã. Mas quem se destaca com vantagem neste elenco é, sem dúvida, Donald Sutherland como pai de família, um prazer constante entre a sabedoria e o humor.

ALIGN=JUSTIFY>Deslizando com a câmara por campos intermináveis e dançando inebriantemente pelos interiores das casas, podem passar-se bem duas horas. Sem orgulho ou preconceitos.


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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “Not all of us can afford to be romantic.”
CLAUDIE BLAKLEY (Charlotte Lucas)









Game Set Match

23.01.06, Rita


rede.jpg


“Match Point” fala sobre o acaso, o poder que a sorte (e por isso mesmo, o azar) tem nas nossas vidas.
Fala sobre o segundo que as pode mudar, esse segundo que acaba por ser todos os segundos, porque tudo se pode alterar a qualquer momento.
A nossa felicidade, ou a ilusão dela, pode fazer-se numa escolha.
Fala de jogos que jogamos com as outras pessoas, nem sempre seguindo as mesmas regras.
Fala de jogos que jogamos connosco próprios quando julgamos que sabemos o que queremos.
Onde o nosso sofrimento reside sobretudo nas expectativas que criamos dentro da nossa cabeça.
E onde a culpa raramente advém do sofrimento que causamos aos outros, mas sim de nos defraudarmos a nós próprios.
“Match Point” fala de amor, desejo, ambição, medo, engano, mentira, impulsos, reflexões, emoções e pensamentos.
E entre aquilo que sentimos e o que pensamos sentir vai uma diferença abismal.
A diferença entre a bola cair de um lado ou outro da rede.



Jarhead - Máquina Zero **

22.01.06, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Sam Mendes. Elenco: Jake Gyllenhaal, Peter Sarsgaard, Jamie Foxx, Chris Cooper, Dennis Haysbert, Brian Geraghty, Evan Jones, Lucas Black, Ivan Fenyo, Jacob Vargas, Laz Alonso. Nacionalidade: EUA, 2005.


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ALIGN=JUSTIFY>A minha expectativa de uma abordagem estilo “Full Metal Jacket” (Stanley Kubrick, 1987) saiu completamente defraudada com “Jarhead”.

ALIGN=JUSTIFY>A adaptação de Sam Mendes da autobiografia de Anthony Swofford sobre a Guerra do Golfo surge mais como um exercício estilístico, de inegável beleza graças à fotografia de Roger Deakins, do que como uma história.

ALIGN=JUSTIFY>Somos levados a acompanhar a transformação do marine - “jarhead” - Swofford (Jake Gyllenhaal) numa máquina de matar, na companhia do colega Troy (Peter Sarsgaard) e sob a liderança do Sargento Sykes (Jamie Foxx). Desde a humilhação e despersonalização do seu treino como atirador, até à agonia, ansiedade, medo e angústia quando, chegados ao deserto, em vez de guerra tem uma espera entediante na retaguarda. E assim temos o quotidiano previsível da companhia nas dunas, enquanto tentam ocupar o seu tempo e procuram algo onde possam descarregar a arma. Afinal de contas é isso que justifica o terem-se alistado, é disso que precisam para serem heróis. As suas expectativas - alimentadas à conta de filmes - saem completamente frustradas, dando a impressão de que a preparação para a guerra pode ser tão traumática como a própria guerra.

ALIGN=JUSTIFY>Mas o grande risco de filmar o tédio é... enfim... o próprio tédio...

ALIGN=JUSTIFY>E eventualmente, o aborrecimento das personagens acaba por se transpor ao espectador, que, até ao fim, continuará à espera de uma história que prendesse e que valesse a pena ser contada. Talvez o filme se salvasse com uma espectacular cena de guerra à moda antiga. Mas nem isso.

ALIGN=JUSTIFY>Apesar de bem representado, a backstory das personagens é mínima, e ficamos sem perceber quais as suas motivações. Mendes contou com o carisma de Gyllenhaal, que, apesar de uma personagem quase linear, é convincente no riso, no choro, na raiva, na cobardia. Sarsgaard, como sempre, sem falhas, assim como Jamie Foxx. No entanto, já vimos toda esta gente antes, uns motivados pelo patriotismo, outros pela adrenalina, outros pela falta de alternativas, mas nada de novo.

ALIGN=JUSTIFY>Existe algum mérito no carácter apolítico e imparcial da obra. E não se põe em dúvida o realismo da mesma. Mas nem tudo o que é real merece a passagem ao cinema. Contudo, a forma ambígua com que tudo é apresentado, mais do que transparecer a vontade de não fazer julgamentos entre o bem e o mal, ou entre guerra e paz, parece ser apenas uma forma de não fazer inimigos - e pelos valores de venda do livro vê-se que a opção politicamente correcta traz os seus frutos. A ironia, que podia ser uma arma eficaz neste caso, é pouca e mal usada, e as verdades são tão evidentes que a sua afirmação não passa de cliché.

ALIGN=JUSTIFY>A tentativa de Mendes de fazer um filme diferente foi bem sucedida. Mas diferente não quer dizer bom. E a sua preocupação com a forma e o visual não chega para compensar a falta de sentido de “Jarhead”. No final, a memória cumprirá o seu papel, esquecendo-se deste filme no panteão dos filmes de guerra. E que pena me dá, porque confesso que o “American Beauty” ainda é uma das minhas grandes referências.

ALIGN=JUSTIFY>A melhor imagem do filme (e estou a tentar abstrair-me do torso nu de Gyllenhaal) é, sem dúvida, os soldados americanos cegados pelo petróleo. Um símbolo demasiado real para ser ignorado.


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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “Every war is different, every war is the same.”
JAKE GYLLENHAAL (Anthony 'Swoff' Swofford)


ALIGN=JUSTIFY> “Whatever else he may do with his life - build a house, love a woman, change his son's diaper - he will always be a jarhead. And all the jarheads killing and dying, they will always be me. We are still in the desert.”
JAKE GYLLENHAAL (Anthony 'Swoff' Swofford)










2005 À MEDIDA DE UM CARTÃO

20.01.06, Rita

Embora o objecto último deste texto seja a elaboração de uma lista com os melhores filmes de 2005 (ou mais concretamente estreados e vistos por mim em 2005), ainda assim haverá algo mais a dizer sobre este ano, no que ao cinema diz respeito.


Comecemos pelos, para mim, dois momentos altos do ano, que por razões várias não aparecerão na tal lista.


A ausência do primeiro momento da referida lista resulta do facto, bem, de não ser um filme. Refiro-me concretamente à presença, em carne e osso e na mesma sala do que eu (OK tratava-se do Forum Lisboa, mas eu estava nas filas da frente) do realizador Costa Gavras. Não que eu seja muito dado a idolatrações, mas não é todos os dias que se tem à frente alguém que realizou um dos filmes da sua vida (a minha neste caso). E a sua presença acabou por coincidir com a revisão de alguns dos seus melhores filmes, graças ao canal arte (abençoada seja), que programou um ciclo deste realizador por volta dessa altura. Ah, e o seu último filme, "Le Couperet", a razão da visita de Gavras ao nosso país, embora não esteja à altura dos seus clássicos, período 69/82, não o envergonha em nada.


O outro momento alto foi a exibição, no IndieLisboa, da versão "restaurada" de "O Sargento da Força 1" de Samuel Fuller. Apesar de gostar bastante da versão original, a verdade é que sempre achei que faltava ali alguma coisa que o transformasse em algo mais do que um bom filme. Esta nova versão (que apesar de ser resultado de um trabalho de montagem posterior à sua morte, é a versão que Fuller queria de facto ter apresentado mas, por problemas de produção, não foi a estreada em 1981) resolve esse problema, dando a consistência que faltava à primeira versão e transformando-o definitivamente num dos maiores filmes de guerra alguma vez feitos.


E já que um dos discos que mais ando a ouvir neste inicio de 2006 é uma demo em que o volume das diferentes músicas anda aos altos e baixos (e atenção que o disco oficial, com o volume das canções uniformizado espero, sai já no final deste mês, depois não digam que não foram avisados), sigamos a mesma estratégia e passemos dos momentos altos do ano para... os outros.


Comecemos, se não pelo pior filme, pelo menos pela coisa mais irritante que eu vi numa sala de cinema este ano: "Sin City", de Robert Rodriguez. Digam o que disserem, transpor literalmente pranchas de BD para filme não é cinema. É outra coisa qualquer, e não é muito bom.


Também digno de figurar entre os piores momentos de cinema em 2005, e decididamente entre os mais chatos, são os diálogos de "9 Canções" de Michael Winterbotton. De facto, poucas vezes umas legendas num écran terão sido tão mal utilizadas (mas pronto, para além disso havia as sequências dos concertos, excelentes e as de sexo, que sempre distraíam um bocado).


Chato é também uma boa definição para o filme de Wim Wenders estreado entre nós em 2005, "A Terra da Abundância". Mais um de uma longa lista de maus filmes que o realizador alemão tem vindo a fazer. E a verdade é que desde "Até ao Fim do Mundo", e esse filme é de 1991, Wenders não faz uma de jeito. Por tudo isto, Wenders mereceu para mim o estatuto de confirmação do ano.


Da confirmação para a revelação. E aí não há dúvidas. Soraia Chaves. E não é preciso dizer mais nada. (E se fosse, que se diga que a moça levou mais de 300 mil pessoas ao cinema só para a ver. Convenhamos que é obra.)


E da bela para o monstro. Tim Burton este ano merece o prémio de susto do ano. Por causa de "Charlie and the Chocolate Factory". De longe o pior filme da sua carreira. E por momentos pensei que estávamos perante mais um realizador em crise de inspiração (vide Wenders), porque verdade seja dita, o filme anterior também já não tinha sido grande coisa. Felizmente 2005 ainda foi suficientemente longo para Burton corrigir o tiro com "The Corpse Bride", capaz de fazer esquecer o falhanço anterior. Também por isso merece ainda o prémio de produtividade.


Por fim, em homenagem um amigo cá da casa, uma referência aos filmes perdidos do ano.


Por muito que se tente nunca se consegue ir ver os filmes todos que se quer (ainda assim Lisboa já tem uma oferta suficientemente rica para que isso seja inevitável). Mas há algumas perdidas mais gravosas do que outras. Este ano, dos filmes que não vi, destaco claramente o último filme de Hal Hartley, "The Girl From Monday", duas sessões no IndieLisboa esgotadas e nenhum rumor de futura estreia comercial no nosso país (e pouco me importa que o Hartley de hoje já não seja o mesmo do início de carreira. Um filme de Hartley é sempre um filme de Hartley). Mas lembro-me também da ida falhada à Cinemateca para ir ver "Monica e o Desejo" de Ingmar Bergman, sessão esgotada, claro está (mas para este há a esperança quase certeza de reposições futuras) e ainda de "Dig" de Ondi Timoner, que passou nos "Dias do Documentário" no King, e que portanto de certeza não esgotou, e que quanto mais leio e ouço falar dele mais tenho a certeza que se trata um grande documentário, e mais me arrependo de não o ter ido ver.


Bem, e terminado este pequeno desvio pelo ano de 2005, aqui fica a lista. Que em oposição ao espirito democrático que por cá reina nestes dias, não tem um vencedor declarado. À espera de uma segunda volta.


10 MAIS DE 2005

"Clean" de Olivier Assayas
"Hotel Ruanda" de Terry George
"Mondovino" de Johnathan Nossiter
"A Queda" de Oliver Hirschbiegel
"Saraband" de Ingmar Bergman
"De Tanto Bater o Meu Coração Parou" de Jacques Audiard
"La Niña Santa" de Lucrécia Martel
"Last Days" de Gus Van Sant
"Million Dollar Baby" de Clint Eastwood
"Private" de Severio Constanzo (via IndieLisboa)




por Sérgio


Match Point ****

19.01.06, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Woody Allen. Elenco: Jonathan Rhys-Meyers, Scarlett Johansson, Emily Mortimer. Nacionalidade: Inglaterra / Luxemburgo, 2005.


SRC=http://www.lagranconnectada.com/cinema/trailers/0127.jpg>


ALIGN=JUSTIFY>É assustador pensar que muitos acontecimentos da vida dependem da sorte, numa fracção de segundo. Ao contrário do que se pensa, não se controla tudo. Como num jogo de ténis, quando a bola toca na rede e todos ficam suspensos à espera que ela caia - nesse instante, pode cair para a frente, e nós ganhamos. Ou não: a bola cai no nosso campo e perdemos. Uma questão de sorte. O jogador desta história leva os espectadores na bancada a seguirem a trajectória. E ficam suspensos, ao longo do jogo de duas horas, do lado da rede em que a bola cai - do certo ou do errado.

ALIGN=JUSTIFY>Woody Allen serve com mestria, no seu novo filme que estreia hoje, "Match Point", o drama de um jovem professor de ténis, Chris (Jonathan Rhys-Meyers), um leitor de Dostoievski ("Crime e Castigo") e apreciador de ópera, que sobe na sociedade e acaba envolvido num triângulo amoroso de consequências trágicas. Dividido entre a posição social alcançada, pelo casamento com a filha de um empresário, Chloe (Emily Mortimer), e o desejo e obsessão por uma jovem actriz americana (Scarlett Johansson).

ALIGN=JUSTIFY>Neste "Match Point", Woody Allen é também ele tentado por Scarlett, carnal e carnívora, na interpretação de Nola, e filma-a como já há muito não filmava uma personagem feminina. "Ela é irresistível, tem uma personalidade maravilhosa e é uma tremenda actriz. É difícil de acreditar que é tão nova", admite o realizador nova-iorquino.

ALIGN=JUSTIFY>A filmar pela primeira vez em Londres, Woody Allen tem aqui um regresso em excelente forma, depois de uma sequência de comédias e filmes mais leves. Aliás, o registo cada vez mais negro (amargo e cínico são outros adjectivos possíveis para esta obra) acaba por surpreender. Mais ainda quando o "match point", o ponto decisivo no jogo de ténis, se decide ao som de "Otelo", de Verdi. "É preferível ter sorte do que ser bom", diz Chris. A nós, saiu-nos a sorte grande com este filme.


COLOR=#AAAAAA>por Miguel









Kiss Kiss Bang Bang ****

18.01.06, Rita

ALIGN=JUSTIFY>Realização: Shane Black. Elenco: Robert Downey Jr., Val Kilmer, Michelle Monaghan, Corbin Bernsen. Nacionalidade: EUA, 2005.


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ALIGN=JUSTIFY>Shane Black é o argumentista de “Lethal Weapon” (1987-1998) e “The Last Boy Scout” (1991), e isto não é para dissuadir ninguém de ver “Kiss Kiss, Bang Bang”. Antes pelo contrário. Apesar de um passado discutível, a primeira realização de Black é uma bela surpresa, um filme de extremo bom gosto, com óptimos diálogos, e que se delicia nos excessos de Hollywood.

ALIGN=JUSTIFY>Usando como base os policiais de Raymond Chandler (cada um dos capítulos do filme leva o nome de uma história do autor), Black conta a história de Harry Lockhart (Robert Downey Jr.), um ladrão de pequena monta que, ao fugir da polícia, entra numa sala de audições, fazendo uma interpretação emocionante. De um momento para o outro, está numa festa em Los Angeles, prestes a receber o papel que fará dele a próxima grande estrela de Hollywood. Para o seu trabalho de campo terá de acompanhar Gay Perry (Val Kilmer), um detective privado a sério, cuja alcunha “gay” não surgiu por acaso. Subitamente, eles encontram-se envolvidos numa série de misteriosos assassínios.

ALIGN=JUSTIFY>Em Los Angeles, Harry encontra a sua paixão de infância, Harmony Faith Lane (Michelle Monaghan), uma das muitas aspirantes que sonham com o êxito e que, ao fim de 15 anos de audições, tem apenas um anúncio de cervejas no curriculum. A paixão de Harmony pelas histórias de detectives de Jonny Gossamer, de que tanto gostava na sua infância, não desaparece quando também ela entra no meio de uma.

ALIGN=JUSTIFY>À semelhança de “Lethal Weapon” também este é um buddy-movie, com a vantagem de que existe muito mais química entre Downey Jr. e Kilmer do que alguma vez existiu entre Danny Glover e Mel Gibson. Cheio de coincidências e absurdos, com pessoas a morrerem abruptamente, os vivos mantendo-se vivos apenas por um fio, e as páginas virando-se indiferentes a tudo, este filme tem o mérito de nos envolver durante todo o passeio.

ALIGN=JUSTIFY>Harry Lockhart é, simultaneamente, protagonista e narrador desta história. E, se a sua personagem é cheia de defeitos, como narrador também deixa algo a desejar, interrompendo a história para voltar atrás e contar algo de que se esqueceu e dirigindo-se mais do que uma vez directamente ao espectador, nem sempre de forma mais elogiosa. Mas, em nenhum momento, estas interrupções são intrusivas, dada a inteligência com que são feitas.

ALIGN=JUSTIFY>Não fosse tudo o resto, este filme valeria a pena somente pela deliciosa e enérgica e interpretação de Robert Downey Jr., em grande forma e com uma naturalidade surpreendente, agarrado à única coisa que em Hollywood faz sentido: um bom argumento. Val Kilmer é totalmente convincente no seu charme gay e no seu sarcasmo, e é evidente o divertimento que foi fazer este filme. Michelle Monaghan não fica atrás destes dois pesos pesados, numa mistura de força, sentido de humor, desespero, perigo e sensualidade.

ALIGN=JUSTIFY>Black brinca com as regras dos filmes de acção, e é aqui que o passado está a seu favor, porque ele não só conhece todos os clichés, como os controla e manipula segundo os seus intentos, dando-nos uma visão cínica da cultura cinematográfica. Mais um olhar satírico ao seu próprio umbigo. Algo em que Hollywood se supera.


ALIGN=JUSTIFY>P.S. - Caso se façam a mesma pergunta que eu no final do filme, é Robert Downey Jr. que canta a canção “Broken”, do seu álbum de 2004, THE FUTURIST.


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ALIGN=JUSTIFY>CITAÇÕES:

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “HARMONY - Well, for starters, she's been fucked more times than she's had a hot meal.
HARRY - Yeah, I heard about that. It was neck-and-neck and then she skipped lunch.”
MICHELLE MONAGHAN (Harmony) e ROBERT DOWNEY JR. (Harry)


ALIGN=JUSTIFY> “Don't worry, I saw Lord of the Rings. I'm not going to end this 17 times.”
ROBERT DOWNEY JR. (Harry Lockhart)

ALIGN=JUSTIFY>COLOR=#AAAAAA> “Thanks for coming, please stay for the end credits, if you're wondering who the best boy is, it's somebody's nephew, um, don't forget to validate your parking, and to all you good people in the Midwest, sorry we said fuck so much.”
VAL KILMER (Perry Van Shrike)













Golden Globes

17.01.06, Rita

A 63ª edição dos Golden Globes, que teve lugar na passada segunda-feira, produziu os seguintes vencedores:



Quem entra na aposta para os Oscar, e uma vez que a aposta por ordem alfabética já está patenteada, pode tirar daqui algumas ideias.



MELHOR FILME – DRAMA
Vencedor: “BROKEBACK MOUNTAIN”, de Ang Lee
Outros nomeados:
“A HISTORY OF VIOLENCE”, de David Cronenberg
“THE CONSTANT GARDENER”, de Fernando Meirelles
“GOOD NIGHT,A DN GOOD LUCK”, de George Clooney
“MATCH POINT”, de Woody Allen

MELHOR FILME - MUSICAL OU COMÉDIA
Vencedor: “WALK THE LINE”, de James Mangold
Outros nomeados:
“MRS. HANDERSON PRESENTS”, de Stephen Frears
“PRIDE & PREJUDICE”, de Joe Wright
“THE PRODUCERS”, de Susan Stroman
“THE SQUID AND THE WHALE”, de Noah Baumbach

MELHOR ACTOR - DRAMA
Vencedor: PHILIP SEYMOUR HOFFMAN por “Capote”, de Bennett Miller
Outros nomeados:
RUSSEL CROWE por “Cinderella Man”, de Ron Howard
TERRENCE HOWARD por “Hustle & Flow”, de Craig Brewer
HEATH LEDGER por “Brokeback Mountain”, de Ang Lee
DAVID STRATHAIRN por “Good Night, And Good Luck”, de George Clooney

MELHOR ACTRIZ - DRAMA
Vencedora: FELICITY HUFFMAN por “Transamerica”, de Duncan Tucker
Outros nomeados:
MARIA BELLO por “A History Of Violence”, de David Cronenberg
GWINETH PALTROW por “Proof”, de Jonh Madden
CHARLIZE THERON por “North Country”, de Niki Caro
ZIYI ZHANG por “Memoirs Of A Geisha”, de Rob Marshall

MELHOR ACTOR - MUSICAL OU COMÉDIA
Vencedor: JOAQUIN PHOENIX por “Walk the Line”, de James Mangold Outros nomeados:
PIERCE BROSNAN por “The Matador”, de Richard Shepard
JEFF DANIELS por “The Squid And The Whale”, de Noah Baumbach
JOHNNY DEPP por “Charlie And The Chocolate Factory”, de Tim Burton
NATHAN LANE por “The Producers”, de Susan Stroman
CILLIAN MURPHY por “Breakfast On Pluto”, de Neil Jordan

MELHOR ACTRIZ - MUSICAL OU COMÉDIA
Vencedora: REESE WITHERSPOON por “Walk the Line”, de James Mangold
Outros nomeados:
JUDI DENCH por “Mrs. Henderson Presents”, de Stephen Frears
KEIRA KNIGHTLEY por “Pride & Prejudice”, de Joe Wright
LAURA LINNEY por “The Squid And The Whale”, de Noah Baumbach
SARAH JESSICA PARKER por “The Family Stone”, de Thomas Bezucha

MELHOR ACTOR SECUNDÁRIO
Vencedor: GEORGE CLOONEY por “Syriana”, de Stephen Gaghan
Outros nomeados:
MATT DILLON por “Crash”, de Paul Haggis
WILL FERRELL por “The Producers”, de Susan Stroman
PAUL GIAMATTI por “Cinderella Man”, de Ron Howard
BOB HOSKINS por “Mrs. Henderson Presents”, de Stephen Frears

MELHOR ACTRIZ SECUNDÁRIA
Vencedora: RACHEL WEISZ por “The Constant Gardener”, de Fernando Meirelles
Outros nomeados:
SCARLETT JOHANSSON por “Match Point”, de Woody Allen
SHIRLEY MacLAINE por “In Her Shoes”, de Curtis Hanson
FRANCES McDORMAND por “North Country”, de Niki Caro
MICHELLE WILLIAMNS por “Brokeback Mountain”, de Ang Lee

MELHOR REALIZADOR
Vencedor: ANG LEE por “Brokeback Mountain”
Outros nomeados:
WOODY ALLEN por “Match Point”
GEORGE CLOONEY por “Good Night, And Good Luck”
PETER JACKSON por “King Kong”
FERNANDO MEIRELLES por “The Constant Gardener”
STEVEN SPIELBERG por “Munich”

MELHOR ARGUMENTO
Vencedor: LARRY MCMURTRY & DIANA OSSANA por “Brokeback Mountain”
Outros nomeados:
WOODY ALLEN por “Match Point”
GEORGE CLOONEY e GRANT HESLOV por “Good Night, And Good Luck”
PAUL HAGGIS e BOBBY MORESCO por “Crash”
TONY KUSHNER e ERIC ROTH por “Munich”

MELHOR CANÇÃO ORIGINAL
Vencedor: A LOVE THAT WILL NEVER GROW OLD – “Brokeback Mountain (música de Gustavo Santaolalla e letra de Bernie Taupin)
Outros nomeados:
CHRISTMAS IN LOVE" – “Christmas In Love”
THERE’S NOTHING LIKE A SHOW ON BROADWAY" – “The Producers”
TRAVELIN’ THRU – “Transamerica”
WUNDERKIND – “The Chronicles Of Narnia: The Lion, The Witch And The Wardrobe”

MELHOR BANDA SONORA
Vencedor: JOHN WILLIAMS por “Memoirs of a Geisha”
Outros nomeados:
“Syriana” – Alexandre Desplat
“The Chronicles Of Narnia: The Lion, The Witch And The Wardrobe” – Harry Gregson-Williams
“King Kong” – James Newton Howard
“Brokeback Mountain” – Gustavo Santaolalla

MELHOR FILME DE LÍNGUA NÃO INGLESA
Vencedor: “PARADISE NOW”, de Hany Abu-Assad (Palestina)
Outros nomeados:
“JOYEUX NOËL”, de Christian Carion (França)
“KUNG FU HUSTLE”, de Stephen Chow (China)
“THE PROMISE (Master Of The Crimson Armor)”, de Kaige Chen (China)
“TSOSI”, de Gavin Hood (África do Sul)


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