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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Caramel ***

31.03.08, Rita

T.O.: Sukkar banat. Realização: Nadine Labaki. Elenco: Nadine Labaki, Yasmine Elmasri, Joanna Moukarzel, Gisèle Aouad, Adel Karam, Sihame Haddad, Aziza Semaan, Fatmeh Safa, Dimitri Staneofski, Fadia Stella, Ismaïl Antar. Nacionalidade: França / Líbano, 2007.





Para quem, como eu, tem uma visão distorcida (e não me refiro às dioptrias) do Médio Oriente, “Caramel” constitui uma abordagem refrescante e surpreendente de um Líbano bastante distante do meu (óbvio?) preconceito. Por isso a autora o dedica “ao meu Líbano”, porque a realidade de Beirute não é (só) a que vemos nas notícias, com a omnipresença de um Hezbollah e o conflito israelo-árabe a ensombrar cada minuto.


No seu dia-a-dia, homens e mulheres (é sobretudo sobre estas que o olhar estreante de Nadine Labaki, também protagonista, se foca) são obrigados a lidar com os seus dramas pessoais, pequenos mas não menos importantes que as questões globais que chegam até nós. Com humor, sensibilidade e genuinidade, o argumento de Labaki, Rodney El Haddad e Jihad Hojeily foca-se num círculo de mulheres que se junta em torno do salão de beleza ‘Si Belle’, em Beirute.


Layale (Nadine Labaki) é uma cabeleireira envolvida num romance com um homem casado, largando tudo ao toque da sua buzina e demasiado cega para ver a sua auto-humilhação e para se aperceber do polícia solitário que suspira por ela de longe (Adel Karam). Nisrine (Yasmine Al Masri) é uma manicura muçulmana, nas vésperas do seu casamento com Bassam (Ismail Antar) e aterrorizada pela perspectiva dele descobrir que ela não é virgem. Rima (Joanna Moukarzel), a assistente, tenta lidar com a sua atracção por uma das clientes (Fatmeh Safa). Jamale (Gisele Aouad), amiga e cliente do salão, está em fase da negação da sua meia-idade, sujeitando-se a humilhantes audições para anúncios onde tenta esconder a sua idade. A vizinha modista Rose (Sihame Haddad) sacrifica a sua atracção por um cliente estrangeiro (Dimitri Staneofski) pelos contínuos cuidados à sua irmã mais velha e cada vez mais demente, Lili (Aziza Semaan).


Sob a paleta de cores quentes e luz dourada da fotografia de Yves Sehnaoui estas mulheres “depilam” dos seus segredos e receios, da mesma forma que o caramelo é usado no procedimento estético. À excepção de Labaki, o elenco é totalmente amador, mas as suas interpretações conseguem ser simultaneamente sólidas e genuínas (ainda que o nosso olhar fuja, impreterivelmente, para a bela Layale/Labaki).


Neste universo feminino, misturam-se culturas, idiomas e religiões sem que isso ponha em causa a amizade e o apoio incondicional destas mulheres umas às outras. Num mundo de homens elas vêem-se obrigadas a lidar com os seus problemas de formas dissimuladas. A sexualidade é um pequeno exemplo disso, e Labaki trata esse tema com extremo cuidado. Sem que posam ser sinceras na expressão dos seus sentimentos, duas mulheres limitam a um procedimento de rotina social um relacionamento não sancionado pela sociedade em que vivem. A subtileza da realização terá a ver com a sensibilidade de Labaki mas não menos com a sua cultura, e menos ainda com a capacidade dos homens dessa cultura assimilarem a verdade. Mas, vendo bem, talvez grande parte dos homens ocidentais sofram de uma incapacidade semelhante.


“Caramel”: o Oriente como um inesperado espelho.
















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