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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

12:08 A Este de Bucareste ***

17.12.07, Rita

T.O.: A fost sau n-a fost? Realização: Corneliu Porumboiu. Elenco: Mircea Andreescu, Teodor Corban, Ion Sapdaru, Mirela Cioaba, Luminita Gheorghiu, Constantin Dita, Cristina Ciofu. Nacionalidade: Roménia, 2006.





A 22 de Dezembro de 1989, às 12h08 o ditador romeno Nicolae Ceausescu abdicou do poder e fugiu num helicóptero ao mesmo tempo que o palácio presidencial era invadido por protestantes. 16 anos passados do fim do reinado do comunismo na Roménia, numa pequena cidade da província a leste de Bucareste, o director de uma televisão local, Virgil Jderescu (Teodor Corban), decide fazer um debate analisando se houve ou não revolução naquela cidade (a tradução do título original é “Houve ou não houve?”), sendo determinante saber se as pessoas foram para a rua manifestar-se antes ou depois das 12h08.


Depois do cancelamento da comparência dos convidados originais, ele resolve manter o debate improvisando dois novos convidados: Tiberiu Manescu (Ion Sapdaru), um professor de história alcoólico e cheio de dívidas que afirma ter estado na praça central da cidade bem antes da hora referida; e Emanoil Piscoci (Mircea Andreescu) um idoso reformado mas não conformado, que costuma fazer de Pai Natal para as crianças do bairro.


Metade do filme serve para contextualizar as personagens, através de cenas simples mas reveladoras, acompanhado uma normalidade que transpira a amargura. Entre predadores capitalistas e perdedores conformados, aquele marco histórico parece ter gerado pouco mais que esperanças. A segunda parte do filme, o debate propriamente dito - filmado numa longa e angustiante sequência -, e no qual se incluem chamadas dos espectadores, acaba por se tornar num sério e agressivo interrogatório, ao contrário do esperado (um desespero e desilusão que é impossível descolar da própria realidade romena).


“12:08 A Este de Bucareste” fala da forma como a memória e os mitos que se constroem podem moldar a verdade histórica. Na recusa de se verem condenados a meros espectadores dos eventos que alteram as suas vidas, estes homens confortam-se numa relevância fictícia: Manescu orgulha-se de ter participado num momento determinante, da mesma forma que Jderescu sente estar a fazer algo importante ao evocar a data histórica no seu programa.


Em “12:08 A Este de Bucareste” até a dramatização que é a televisão é apresentada com honestidade. O elemento cómico e agridoce desta sátira deriva, não de saber quão revolucionária foi aquela cidade, mas do desejo, profundamente humano, de combater a letargia e a solidão. Corneliu Porumboiu usa o papel de forma simbólica, quando, nas mãos de Manescu o desfaz em pequenos pedaços e, nas mãos de Piscoci constrói barcos. Mas se esta calma não significar passividade, pode também ser que o cepticismo dos romenos não tenha ainda dado lugar ao cinismo. E como as luzes da rua se vão acendendo no início da noite, talvez o futuro traga consigo as ansiadas respostas (conquanto façamos as perguntas certas).


Independentemente do veredicto, que é deixado aos espectadores (do debate televisivo dentro do filme e a nós, os do filme propriamente dito), houve um país - e muitas pequenas cidades - que, para o melhor ou para o pior, mudaram. E se, no final, resta a dúvida sobre a dimensão dessa mudança, uma coisa é certa: o cinema romeno está, de uma forma gradual e consistente, a ganhar força no panorama mundial. A par desta primeira longa-metragem de Corneliu Porumboiu, vencedor da Caméra d’Or em Cannes em 2006, são também bons exemplos o recente “The Death of Mr. Lazarescu” de Cristi Puiu, e a Palma de Ouro deste ano, “4 Luni, 3 Saptamani si 2 Zile”</b> de Cristian Mungiu (que conta também com as participações de Teodor Corban e Ion Sapdaru).