Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Elizabeth: The Golden Age **1/2

06.11.07, Rita

Realização: Shekhar Kapur. Elenco: Cate Blanchett, Geoffrey Rush, Clive Owen, Abbie Cornish, Samantha Morton, Jordi Mollà, Rhys Ifans, Tom Hollander, Vidal Sancho. Nacionalidade: Reino Unido / França, 2007.





O realizador Shekhar Kapur volta a reunir-se com Cate Blanchett e Geoffrey Rush na sequela do filme de 1998 “Elizabeth” (repete-se igualmente Michael Hirst no argumento, Jill Bilcock na montagem e Alexandra Byrne no guarda-roupa), que focava a juventude da rainha inglesa e a sua ascensão ao trono após a morte da sua meia-irmã Mary Tudor. Em “Elizabeth: The Golden Age”, a filha de Henrique VIII e de Ana Bolena (decapitada quando Elizabeth tinha apenas 3 anos) detém já o firme controlo da coroa britânica. Criada no seio da igreja protestante anglicana, Elizabeth (Cate Blanchett) enfrenta a conspiração urdida pela sua prima católica Mary Stuart, rainha da Escócia (Samantha Morton), a segunda na linha de ascensão ao trono, e pelo seu ex-cunhado, o príncipe espanhol Filipe II (Jordi Mollà), anteriormente casado com Mary Tudor.


Em 1585, a Espanha ameaça a Inglaterra com a Inquisição, revoltada numa medida igualmente violenta com a pirataria de que são alvo os barcos espanhóis. Um desses piratas é Walter Raleigh (Clive Owen), um explorador e aventureiro que, com tabaco, batatas e o recém-descoberto território da Virgínia (assim nomeado em honra da Rainha Virgem), cai nas graças de Elizabeth. Impedida (ou incapaz) de materializar a atracção que sente por Raleigh, Elizabeth resolve mantê-lo perto de si tornando-o Sir e chefe da sua guarda pessoal e empurrando-o, inadvertidamente, para os braços da sua aia, Elizabeth Throckmorton (Abbie Cornish, “Candy”).


Desengane-se quem pensa que isto é um pedaço de história. Não é. E Shekhar Kapur faz questão de negligenciar os factos históricos para uma dramatização mais eficaz. Desviando-se da muito mais interessante narrativa sobre o ataque espanhol a Inglaterra com a Invencível Armada, concentra-se na não provada atracção amorosa de uma Elizabeth I (1533-1603) que, à data dos acontecimentos (1585-88), teria mais de 50 anos por Sir Walter Raleigh (1552-1618), que teria pouco mais de 30 e que passou o período da batalha em terra (nomeadamente na Irlanda).


Se nos conseguirmos abstrair da veracidade, podemos facilmente deixar-nos enlevar pela belíssima fotografia de Remi Adefarasin (“Match Point”) com cores saturadas e um sumptuoso guarda-roupa que transforma Elizabeth numa deusa mítica. De tirar a respiração é também a impressionante cena de batalha naval que é a da derrota, em 1588, dos barcos espanhóis, contra os quais Inglaterra lançou navios em chamas.


Elizabeth I, no meio dos seus ornamentados penteados e da sua pálida face de boneca, era uma monarca inteligente e carismática, controlada e controladora. Sentindo-se casada com o seu país, recusou-se a aceitar um marido apesar das exigências de conselheiros como Francis Walsingham (Geoffrey Rush) e do parlamento inglês para que casasse e tivesse um herdeiro.


Cate Blanchett volta a dar-nos o prazer de uma interpretação poderosamente versátil, de força e vulnerabilidade, um coração solitário num espírito indomável, travando lutas íntimas com a sua própria consciência. À idade e ao saber, vem acrescentar-se um maior cuidado sob o peso irremediável do poder. Perante a execução de Mary Stuart (na qual Samantha Morton consegue uma equilibrada mistura de altivez e dignidade), Elizabeth é confrontada com o precedente de igualar o estatuto de um monarca ao de um homem comum, e, se uma rainha pode ser executada, isso quer dizer que todas as rainhas – incluindo ela mesma – são mortais.


É neste retrato englobante que funde as diversas facetas de um ser humano com a poderosa lenda que a história criou em torno dele que o filme de Shekhar Kapur consegue o seu limitado trinfo. Mas, dadas todas as manobras dramáticas, aquilo que em “Elizabeth” tinha sido o vislumbrar da possibilidade de realidade dentro do mito, em “Elizabeth: The Golden Age” transforma-se numa manipulada vassalagem à lenda. Uma personagem desta dimensão merecia mais respeito histórico.






CITAÇÕES:


“Elizabeth I – Tell your king I fear neither him nor, nor his priest, nor his armies.
Embaixador espanhol – There is a wind coming that will sweep away your pride.
Elizabeth I – I, too, can command the wind, sir! I have a hurricane in me that will strip Spain bare if you dare to try me!”
CATE BLANCHET (Elizabeth I) e VIDAL SANCHO (Embaixador espanhol)