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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Persépolis ****

25.10.07, Rita

Realização: Marjane Satrapi e Vincent Paronnaud. Vozes: Chiara Mastroianni, Catherine Deneuve, Danielle Darrieux, Simon Abkarian, Gabrielle Lopes Benites, Gabrielle Lopes, François Jerosme. Nacionalidade: França, 2007.





Persépolis ou Parsa era a capital do antigo império Persa. ‘Persépolis’ é o título da novela gráfica e autobiográfica de Marjane Satrapi, publicada em França em quatro volumes entre 2000 e 2003. “Persépolis” é a adaptação ao cinema, feita por Vincent Paronnaud e pela própria Marjane Satrapi (ilustradora e cartoonista nascida em Rasht, Irão, em 1969 e a viver actualmente em Paris), que recebeu o Prémio do Júri na edição deste ano do Festival de Cannes.


“Persépolis” percorre cerca de 15 anos da vida de Marjane Satrapi, desde a infância em Teerão no seio de uma família progressista, passando pela revolução e queda do Xá e a instalação de um regime fundamentalista e repressor, até à guerra contra o Iraque e ao seu exílio como estudante em Viena, e, finalmente um regresso a casa em idade adulta.


Sem presumir ser uma lição de história, “Persépolis” consegue ir do particular para o universal, cruzando ambas as narrativas e sendo simultaneamente íntimo como uma biografia e abrangente no testemunho. Com uma surpreendente simplicidade, “Persépolis” consegue ir ao mais profundo do desafio que é a procura de uma identidade no contexto de uma vida sob tirania, quando se é um estranho no seu próprio país e, ao mesmo tempo, um estrangeiro em qualquer outra parte do mundo e incapaz de uma total adaptação.


Sofrimentos, dúvidas e alegrias, a inocência e a confusão da infância, o cinismo e a confusão da idade adulta, são tratados com uma ironia aguçada e um humor desarmante. E longe de ser um lamento sentimental ou previsível, “Persépolis” recusa o trivial ou o moralismo. E se tem alguma ideologia, é a da integridade pessoal nas relações humanas.


Chiara Mastroianni dá a voz à personagem de Marjane enquanto a sua mãe, Catherine Deneuve, interpreta o papel de Sra. Satrapi. Esta relação emocional é tangível com cada personagem, o que não impede que a Marjane-criadora as satirize. Aliás, ela ri-se de si mesma, e é essa auto-consciência que permite que nos identifiquemos com o caos emocional e a rebelião de Marjane-personagem. Como seria possível não nos sentirmos próximos de alguém que tem Bruce Lee como herói e sonha ser profeta quando crescer? À semelhança de um e outro, Marjane luta com coragem e determinação, e procura questionando, num processo essencialmente solitário.


Num longo flashback a preto e branco (apenas os momentos inicial e final têm cor), “Persépolis” é absorvente com os seus cativantes negros e linhas afiadas (que me fizeram pensar na obra ‘Maus’ de Art Spiegelman). O tom da narrativa dita o estilo, sem pôr em risco a coerência, e a montagem ágil impregna o ritmo certo ao filme.


Como evitar que um povo seja confundido com os seus líderes? Como combater um poder que usa uma versão de deus como arma para subverter e submeter a sua população? Como se pode amar profundamente um país e admitir, ao mesmo tempo, a impossibilidade viver nele?