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CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

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CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Control ****

22.10.07, Nuno

Realização: Anton Corbijn. Elenco: Sam Riley, Samantha Morton, Craig Parkinson, Alexandra Maria Lara. Nacionalidade: Reino Unido / EUA, 2007.




“The confusion in her eyes it says it all. She's lost control.”







Como é que se filma a biografia de um dos mais conturbados e inspiradores compositores ingleses do século XX? Com muita dificuldade.


“Control”, biopic da vida de Ian Curtis, é a primeira longa metragem do fotógrafo holandês Anton Corbijn. E porque é que filmar os últimos anos da vida de Ian Curtis se tornou tão complicado desafio? Porque remexer em memórias e histórias de pessoas tão singulares como Ian Curtis, Bernard Summer, Peter Hook e Stephen Morris – membros de bandas como Stiff Kittens, Warsaw, Joy Divison e finalmente, após a morte de Curtis, New Order – e conjugar com o ponto de vista da viúva de Curtis, Deborah Curtis, e da amante de Curtis, Annik Honore, seria de facto uma tarefa difícil. E mais difícil se torna quando se está sob a atenção impiedosa de milhões de fãs de Ian Curtis.


Mas Corbijn revela-se a escolha certa para a difícil tarefa. Sendo um fã de Joy Divison e que acompanhou o percurso da banda, Corbijn filma de uma forma austera, num glorioso preto e branco, com o tão característico grão de película que sempre caracterizou as filmagens de vídeoclips deste. Ian Curtis e Joy Division não poderiam ser filmados de outra maneira. O tom cinzento tão característico da zona norte de Inglaterra, especialmente de Manchester e subúrbios ganha aqui um papel vital. E não esquecer que em finais de 70, princípios da década de 80, as principais revistas de música eram impressas a preto e branco, logo qualquer artigo sobre o Curtis e os Joy Divison seria retratado em monocromia.


Realizado a partir da biografia de Deborah Curtis, “Touching from a distance”, com o argumento adaptado por Matt Greenhalgh, “Control” é a desvirginização cinematográfica de Corbijn, mas também de Sam Riley, que se estreia no papel de Ian Curtis. Depois de um cast exaustivo, em que se falou de nomes como Jude Law e Cillian Murphy, a escolha recaiu sobre este estreante, que apenas tinha protagonizado pequenos papéis televisivos e uma aparição como Mark E. Smith (líder dos The Fall), no filme de Michael Winterbottom, “24 Hour Party People”, mas que nunca passou da mesa de montagem, ficando posta de parte a cena em que este aparece.


Com o elenco de jovens actores e outros já reconhecidos, como o caso de Samantha Morton (Deborah Curtis), “Control” dá-nos uma perspectiva muito pessoal de um jovem conturbado, com um grande talento para a escrita, que, de inseguranças e insatisfações, rege o seu dia-a-dia, até ao desfecho previsível, com o seu suicídio. Entre amores, estagnações, sucessos e músicas fantásticas, Ian Curtis é retratado no fio da navalha, onde nos apercebemos como a falta de perspectiva de futuro, desespero e solidão ajudaram a criar todo o ambiente sonoro que definiu a obra de Curtis.


Apesar de todo o negrume, “Control” é música. É a história de um dos mais importantes períodos da música moderna. É um retrato fiel e humano da banda Joy Divison e dos seus membros. E é música. Muito boa música. Bowie, Kraftwerk, Velvet Underground e Joy Division.


E com uma performance fantástica por parte dos actores que encarnam os membros da banda. Corbijn não recorre a playbacks, põe os actores a darem vida às músicas dos Joy Divison, de uma forma única, orgânica, rude, crua e muito profissional. E sabe tão bem ouvir estas músicas a serem historicamente criadas e tocadas pela primeira vez.


Para além da óbvia caminhada para o desfecho trágico, “Control” é regido por um paciente e determinado ponto de vista estético e narrativo de Corbijn, que sabia que tinha uma história para contar, mas que não a queria contar sob a forma do típico biopic. “Control” é um filme sobre a vida curta e trágica de Ian Curtis. Mas é muito mais do que isso. É um retrato frio, tão cinzento como os meios tons que predominam no filme, mas tão forte como os negros contrastantes que pulsam de minuto a minuto.


E “Control” é música. E muito boa por sinal!



P.S.: Anton Corbijn, tal como todos os criadores estéticos, tem as suas manias. E as árvores são uma delas. E “Control” tem uma bela sequência com árvores, para além de um interessante cameo da própria Deborah Curtis, que está presente numa cena em que Ian (Sam Riley) e Deborah (Samantha Morton) têm uma discussão amorosa na rua.