Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Mysterious Skin ****

29.08.07, Rita

Realização: Gregg Araki. Elenco: Brady Corbet, Joseph Gordon-Levitt, Michelle Trachtenberg, Jeff Licon, Mary Lynn Rajskub, Bill Sage, Elisabeth Shue, Richard Riehle, Lisa Long, Chris Mulkey, David Lee Smith, Chase Ellison, George Webster, Rachael Kraft, Riley McGuire, Ryan Stenzel. Nacionalidade: EUA / Holanda, 2004.





“Mysterious Skin” é um filme comovente e perturbante sobre os efeitos dos abusos sexuais a crianças e dos caminhos mentais de protecção que se processam para lidar com essa traumática experiência. Baseado no livro de Scott Heim (co-argumentista), “Mysterious Skin” conta a história de dois adolescentes cuja infância foi marcada pelo mesmo trágico incidente, mas cujos futuros divergiram.


Neil McCormick (Joseph Gordon Levitt) é um bonito prostituto homossexual obcecado com a relação que teve com o seu treinador de basebol (Bill Sage) quando tinha oito anos. Brian Lackey (Brady Corbet) acredita ter sido abduzido por extraterrestres quando era criança, em virtude de ter ficado inconsciente por duas vezes, sem se conseguir lembrar do que lhe tinha sucedido nas horas precedentes.


Neil absorveu a experiência na sua própria identidade, mas desligou-se do mundo, não se aproximando de ninguém à excepção da sua amiga Wendy (Michelle Trachtenberg), que aceita sua incapacidade para retribuir o afecto. No filme, a homossexualidade de Neil é inata, e o seu encontro com o treinador (ídolo e figura paternal) foi uma influência poderosa nessa descoberta. Enquanto isso, Brian é incapaz de processar o que lhe aconteceu, interiorizando dúvidas e terrores de uma forma totalmente assexual, e exteriorizados em desmaios, sangramentos do nariz e pesadelos.


Em grande parte narrado pelas duas personagens principais, Gregg Araki não faz compromissos com o realismo nem cedências ao exibicionismo, o que é sugerido é violento, doloroso e sem sentimentalismos. Neil encara a sua experiência como a sua primeira relação. A cena da sedução é filmada de uma forma hipnótica que intensifica o seu poder. Ao mesmo tempo que nos sentimos incomodados perante os chocantes acontecimentos conseguimos também entender a conivência de Neil. Brian colocou a sua vida numa sala de espera, enquanto não consegue esclarecer as horas que perdeu na sua memória. Uma sensação de espera não termina com o filme, mas que, graças à interpretação de Brady Corbet, nos tranquiliza quanto ao seu futuro.


“Mysterious Skin” é um filme de personagens, contando com uma genial interpretação de Joseph Gordon-Levitt (“Brick”, 2005), e, num registo mais subtil, Brady Corbet (“Thirteen”, 2003) e Michelle Trachtenberg. Ainda duas impressionantes participações dos jovens Chase Ellison e George Webster, interpretando, respectivamente, Neil e Brian aos oito anos de idade.


Apesar de algum panfletismo no que concerne a protecção contra as doenças sexualmente transmissíveis (o choque da ligação emocional, surge para Neil num encontro tocante com um doente de SIDA), “Mysterious Skin” é uma experiência emocional complexa, que não se centra na culpa ou na acusação, mas na descoberta. O crescimento destas crianças dependeu daquele momento, que dada a distinta assimilação, condicionou a sua forma de lidar com a realidade.


Mas mais do que a verdade dos factos, Greeg Araki está interessado na verdade emocional destes dois jovens. Entre o cinismo e a fantasia, “Mysterious Skin” não vitimiza nem odeia, optando por falar da liberdade que se atinge com a aceitação de um passado, fugindo à escravidão que ele, tantas vezes, impõe, e da necessidade de ultrapassar os obstáculos que embotam os sentimentos. E se quase tudo é irreversível nesta vida, resta-nos sempre a opção de escolher olhar em frente.






CITAÇÕES:


“I hate it when they look like Tarzan but sound like Jane.”
JOSEPH GORDON-LEVITT (Neil)

“Okay's a relative term.”
JEFF LICON (Eric)

“This is going to be the safest encounter you've ever had. If you could just rub my back. I really need to be touched.”
BILLY DRAGO (Zeke)