Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

CINERAMA

CRÍTICA E OPINIÃO SOBRE CINEMA

Marie Antoinette ***

06.11.06, Rita

Realização: Sofia Coppola. Elenco: Kirsten Dunst, Marianne Faithfull, Steve Coogan, Judy Davis, Jason Schwartzman, Rose Byrne, Al Weaver, Shirley Henderson, Molly Shannon, Rip Torn, Asia Argento, Jamie Dornan. Nacionalidade: Japão / França / EUA, 2006.





“Marie Antoinette” é um filme que já há muito tem vindo a fazer barulho. Sobretudo pela banda sonora moderna sobre um filme de época. Por estranho que possa parecer, a música dos Bow Wow Wow, The Radio Dept. ou The Cure não soa desajustada a um filme sobre uma adolescente que é obrigada a desempenhar um papel que não é o seu num mundo estranho e cuja ignorância e superficialidade são, sobretudo, produto do seu ambiente.


Baseado na biografia ‘Marie Antoinette: The Journey’ de Antonia Fraser, “Marie Antoinette” é Maria Antonia (Kirsten Dunst), filha do imperador austríaco Francisco I, nascida em 1755 e dada em casamento aos 14 anos a Luís XVI (Jason Schwartzman, “I Heart Huckabees”), o herdeiro do trono francês, para preservar a frágil aliança entre os dois países. Tendo de enfrentar um marido com pouca vontade/capacidade de a engravidar (uma questão que nunca é completamente explicada) e com o qual não consegue comunicar, e sujeita a fortes expectativas e pressões, Marie Antoinette refugia-se em roupas e doces.


Sofia Coppola não quis fazer uma reconstituição histórica. Aliás, ao optar por se centrar nos anos precedentes à Revolução Francesa, Sofia Coppola fez a escolha menos óbvia e menos fácil, pois, como heroína, Marie Antoinette teria sido mais eficaz na fase final da sua vida, na coragem que demonstrou perante a prisão da família real e na defesa dos ideais da monarquia. Mas o difícil nem sempre é garantia de êxito (lembro-me automaticamente do bom resultado de “Romeu + Juliet” de Baz Luhrmann).


A história dá de Marie Antoinette uma imagem de uma rainha extravagante numa época em que o seu povo passava fome, e com uma completa ignorância pelas questões políticas da sua época. Assumindo o ponto de vista de Marie Antoinette, também Sofia Coppola ignora as questões políticas e sociais, que se mantêm apenas como um leve rumor, e que no final, quase inesperadamente, surgem para cobrar a sua dívida. Ainda que esta perspectiva possa ter algo de válido, e possivelmente bastante verdadeiro, isso não é o suficiente para fazer de “Marie Antoinette” uma boa história. Principalmente, porque, em nenhum momento, esta personagem se torna objecto da nossa empatia, apesar da forte dose de sensibilidade de Kirsten Dunst. Jason Schwartzman é um Luís XVI caricatural, cobarde e aborrecidíssimo, a quem apetece dar um forte abanão. Apenas Rip Torn e Asia Argento, como Luís XV e a sua amante Madame du Barry, parecem conferir alguma veracidade a esta história.


Vivendo isolada com a sua corte numa Versalhes cheia de hábitos ridículos (numa subtil crítica às monarquias), Sofia Coppola procura explicar a ingenuidade de Marie Antoinette num certo paralelismo com as celebridades dos dias de hoje, mas acaba por reduzi-la a um mostruário de espartilhos e perucas empoadas (e até de pormenores artísticos como os tão falados All-Star azuis claros). Cada cena parece ser a justificação para um sem-número de figurantes envoltos no luxo resplandecente do guarda-roupa de Milena Canonero, ou para sobremesas maravilhosamente filmadas. Enquanto isso, o enredo e os diálogos são simplesmente relegados para segundo plano. Sem acrescentar em nada o nosso conhecimento acerca desta personagem histórica, o título “Marie Antoinette” acaba por se limitar a um golpe de marketing.


Em “Lost In Translation”, Sofia Coppola traçava um forte contraste entre uma Tóquio imensa, esmagadora e impessoal com um hotel de quartos e corredores fechados. Entre o público e o privado. Em “Marie Antoinette” Sofia Coppola filma os exteriores de Versalhes com uma austeridade que lembra “Barry Lyndon” de Kubrick, mas, quando se volta para interior, este é exactamente tão vazio.


Sofia Coppola parece ter-se esforçado por usar este grande orçamento até ao último tostão. Como a própria Marie Antoinette o teria feito. Mas os recursos limitados costumam ser bastante estimulantes para a imaginação, e quero acreditar que um regresso ao minimal e intimista possa trazer frutos muito mais interessantes que este (admito que esta dura apreciação está directamente relacionada com as minhas elevadas expectativas).


“Marie Antoinette” é um olhar pouco preciso e indiferente a um pedaço da história de França. Na comparação, a história de França sai a ganhar. Esqueçamos essa carga, e temos um filme com uma fotografia invejável, um guarda-roupa de tirar a respiração e uma banda sonora fabulosa. Tiremos toda a roupagem estilística, e de “Marie Antoinette” resta apenas um simples filme, bonito mas sem consequências, sobre uma adolescente bastante tonta.


Muito barulho por nada.






CITAÇÕES:


“Letting everyone down would be my greatest unhappiness.”
KIRSTEN DUNST (Marie Antoinette)


E porque esta capa é uma delícia:






























4 comentários

Comentar post